O relativo fracasso da iniciativa de paz do Presidente ucraniano Volodymyr Zelinski suscita interesse no contexto da conversa que temos vindo a desenvolver sobre a filosofia russa contemporânea. Neste caso, pode dizer-se que, contrariamente ao que vem nos livros do Ocidente, o raciocínio dialéctico não parece ser a matriz do pensamento político dos líderes ocidentais. O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, desafiou os líderes europeus e norte-americanos, ao formular uma proposta para o fim da guerra na Ucrânia. Percebe-se que, neste momento, a polarização entre o Ocidente e a Rússia inspira-se, em maior ou menor medida, nas filosofias políticas e filosofias das relações internacionais subjacentes aos discursos políticos. Por isso, nós preferimos ir para lá das convicções que constituem o capital intelectual dos líderes. Preferimos relacionar o estado de coisas com a história do pensamento contemporâneo russo. Vamos seguir os traços de Vladimir Veniaminovich Bibikhin (1938–2004), um filósofo russo que levou a sério a necessidade de dialogar com o Ocidente
Concretamente nestes tempos de globalização, torna-se mais claro que não haverá paz entre as nações sem diálogo inter-religioso. Como não se cansou de repetir o teólogo Hans Kung: “Não haverá paz entre as nações sem paz entre as religiões. Não haverá paz entre as religiões sem diálogo entre as religiões.
Completar-se-ia 30 dias de estada em Sea Point (África do Sul) com o passaporte de Serviço, o que demandava sair e reentrar antes de transcrever o mês de permanência. Entre Windhoek (diversas vezes visitada) e Maputo, que estava no desejo, a escolha foi para a terra incógnita, embora desaconselhado por causa de alguns tumultos no Norte daquele país.
Desabituado a comprar passagens aéreas e sem experiência em encontrar rotas e voos económicos, recorri ao Ladislau Santos, um jovem amigo angolano que estuda em Cape Town, e este socorreu-se do seu amigo e vizinho que é experimentado em compras na internet e em busca de soluções lowcost.
- Kota, tens que dar o número do Visa e estar atento ao email para aprovar. - Recomendou previamente o jovem.
Já havia confiança bastante. Mandou-me os dias em que a companhia aérea moçambicana voaria para Cape Town e para Joanesburgo, sendo a segunda opção a única que se encaixava no bolso e na permissão de permanência estampada no passaporte.
Há povos que estão já em um patamar de organização e digitalização que evitam deslocações e filas. Fizemo-lo e, inclusive, procurámos, à distância de um clique, por um hotel urbano em Maputo que ficasse próximo da cidade baixa e da Rádio Nacional. Parecia correr bem sem levar-me a correr.
Não tinha verificado que, entre o voo que me pousava em Joanesburgo e o que me levaria a Maputo, havia um delay de apenas 60 minutos, tempo que teria de ser gasto a abandonar o avião (sorte é que só tinha uma bagagem de mão), percorrer o aeroporto das entradas domésticas até às saídas internacionais, fazer check in (presencial), passar pelas revistas e mais umas chatices de polícias que pediam declaração de posse de uns míseros "George Washington’s”. Foi um correr, antes inimaginado, chegando ao terminal da LAM a escassos cinco minutos da partida.
- Uff!
Ofegante mas vitorioso lá estava eu no machimbombo aeroportuário, a caminho do Embraer 145. O trajecto Joanesburgo-Maputo faz-se em poucos minutos. Aliás, sendo que o voo não se faz a very hight altitude, a transição da fronteira entre a África do Sul e Moçambique nota-se pela organização espacial da terra e presença ou não de casotas de chapas metálicas que brilham nas alturas em grande quantidade.
Depois de três dezenas de minutos a ver capim verde, campos demarcados e aldeias com arruamentos, os meus olhos foram surpreendidos com vegetação amarelada, casotas de chapas e vilarejos que reclamavam por ordem na disposição dos cubículos. Não precisei que o vizinho nigeriano do assento ao lado me perguntasse, no seu inglês, se eu conhecia Maputo e se estávamos próximos ou ainda distantes.
- Can you see de difference? We are aproching to Maputo. - Disse ao jovem que se identificou como estando a ir ao encontro do irmão que lá trabalhava, saído da África do Sul. Não tardou fomos presenteados com o regalo, nas alturas, que é a ponte Maputo-Katembe, seguindo-se a chegada ao Aeroporto Internacional que é uma miniatura que me lembrou o de Bamako (1998) ou o de São Tomé.
- Epá, o internacional deles também é assim, o indivíduo de um lado e vê o outro lado?! - Soliloquiei, antes que alguém me associasse a um "estagiário de tantanice”.
Cumpridos os procedimentos no Aeroporto Mavalane, cuidei de me munir de uns meticais, suficientes para chegar ao hotel onde pousaria a malinha e chamaria pelo amigo Ouri Pota. Era um sábado que o homem tinha reservado para mim.
Sem demora, juntou-se a mim e ao Pota o Faruco Sadique, outro jornalista sénior e com elevada estrada em direcção e administração de media, que, mesmo convalescente, me ofereceu seu abraço de boas-vindas. Bastante respeitado nos media em que passou como profissional e gestor, o Faruco é um dos cinco jornalistas moçambicanos que estiveram comigo no III Curso de Jornalismo para PALOP, organizado, em 2005, pela Fundação Calouste Gulbenkian e Universidade Católica de Lisboa.
Antes que a fome cobrasse a sua renda, Pota e eu rumámos para explorar o que tinha mapeado para visitar: Museu das Forças Armadas (uma espécie da nossa Fortaleza de São Miguel, em Luanda, mas sendo a de Maputo de menor dimensão), Museu da Moeda, Baixa da Cidade (com seus motivos de arte pictórica), o Mercado Municipal de Maputo (uma espécie do Mercado de São Paulo ou Congolenses do meu tempo de meninice) e o Jardim (Municipal) de Tunduru, uma réplica ainda conservada da antiga "Floresta do Alvalade” e "aonde se dirigem os noivos para as fotos” que marcam a imparidade do momento, segundo palavras do Ouri Pota, enquanto combatíamos o excessivo calor e o suor transbordante com umas "douradas” que por lá têm o pomposo nome de Tchilar.
- É uma "birra” para jovens. Eu também penso que é a melhor. Pelo menos é a que mais consumo. - Declarou-se o meu cicerone, antes de me levar à tasca encravada no Jardim e que, por lá, é uma espécie de "sindicato dos jornalistas” ou uma réplica da Bicker do "antigamente” dos jornalistas que antecederam a geração de noventa.
No museu que mostra a história militar da colonização portuguesa na Africa Austral Índica, pude agregar conhecimentos sobre os grandes conquistadores e resistentes à presença europeia, como o grande Ngungunhane, um líder militar e político moçambicano do século XIX, que resistiu à colonização portuguesa em Gaza, Moçambique, até ser capturado pelas forças portuguesas, em 1895, marcando o fim da resistência armada efectiva contra o colonialismo português naquele território. A resistência foi retomada depois da criação da FRELIMO, em 1962, e no início da luta armada em 1964. Levado a Portugal, onde viria a falecer, as ossadas de Ngungunhane foram devolvidas a Moçambique no pós-independência, em 1985. Uma urna simbólica está patente no museu militar.
Já no outro que narra o percurso dos instrumentos de troca em território moçambicano pude conhecer os distintos meios usados para a aquisição de bens e serviços e como se chegou ao Metical, a moeda nacional de Moçambique, cujo nome deriva de "mithqal”, uma unidade de peso usada historicamente no comércio de ouro muçulmano. A moeda fiduciária foi introduzida em 1980, substituindo o antigo Escudo moçambicano. Os museus têm esse lado de dar a conhecer a história, sem ter de se procurar por livros e, quando em presença de guias devidamente treinados, dá prazer frequentá-los.
O almoço foi na FEIMA. Dir-se-ia uma espécie de Feira Popular na década de noventa do século XX. Experimentei, a lamber os beiços, a kizaka com camarão e pirão, matapa e xima no linguajar deles. São outros os nomes, mas a alegria do estômago é a mesma. Não é que pedi bis? Só depois, de estômago atendido, foquei-me nos detalhes. Os males de cá, parecem ser também os de lá. Repuxos sem água, fornecedores que pensam que fazem favor ao cliente, descaso com a degradação e passo apressado à destruição por acção humana e do tempo, levando a vida à precariedade.
Já a caminho da taberna do kota Américo Macutamo, no Bairro Indígena de Maputo, cruzámos, de novo, a cidade baixa. Ruas que deviam estar limpas, passeios que deviam estar desesburacados e outras maleitas relativas à nossa fragilidade institucional levaram-me de volta a algumas ruas de Luanda, perfumadas com urina de gente que desconhece o saneamento e urbanidade.
Melhor não faria comigo o Pota. Fomos ao "muro das lamentações”, lugar onde ocorrem reflexões filosóficas, críticas acintosas e soluções difíceis de chegar. E tal como o judeu nazareno pedia que se levasse a ele todos os fardos pecaminosos, na taberna do kota Américo fluem as conversas de criadores de arte e comunicadores que nela depositam, com os goles que correm garganta abaixo, todas as frustrações e maleitas da vida terrena.
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