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O boato na (des)informação e manipulação da opinião pública

Nos dias que correm, dois conceitos fazem parte do nosso acervo cultural: o de opinião pública e o de comunicação social. O primeiro refere-se, como é sabido, às relações interpessoais comunicativas entre pessoas que vivem numa mesma comunidade.

30/04/2023  Última atualização 07H10

Trata-se do produto das diversas interacções sobre um mesmo objecto ou acontecimento social e que legitimam, de acordo com o imaginário dos cidadãos, o poder político formal. Por seu lado, o conceito de comunicação social, comunicação dirigida a grandes audiências em simultâneo, seja ela constituída por produtos informativos ou de entretenimento, tem como finalidade suscitar interesse e entreter as referidas audiências.

Esta designação, de comunicação social, foi proposta pelo Concílio Vaticano II e aprovada através do decreto Inter Mirífica em 1963. Assim, por meios de comunicação social entende-se, entre outros, o jornalismo, a publicidade e a propaganda, a rádio, a televisão e as modernas TICs. Entretanto, para que estes meios de comunicação vinguem junto dos cidadãos, eles têm, de acordo com a moderna psicologia das massas, de ser o reflexo das pulsões e necessidade das pessoas, do chamado público-alvo.

Esta comunicação, permite, através da divulgação de informações e conhecimentos, constituir-se como um modelo social, permitindo por vezes aumentar o prestígio social ou mesmo o estatuto social dos que a compõem e a divulgam, questão já referida no século IV a.C., pelo grande filósofo Aristóteles.

Assim, a opinião pública é, de facto, a expressão de um juízo geral, polarizado, sobre qualquer questão de ordem social. Esta opinião pode, não só influenciar os meios que estão ao seu dispor, através da recolha das informações, como ela própria ser influenciada (ou persuadida) pelas mesmas. A falta de rigor ou a escassez e objectividade das mesmas pode ser devida aos rumores e boatos que circulam na comunidade.

O que está em causa é a credibilidade das mensagens e a credulidade dos leitores. A disseminação dos boatos, bastante estudada durante a 2ª GG, passou a ter uma especial relevância devido ao actual uso generalizado das chamadas «redes sociais».

É um problema que se estendeu à verdade científica das informações que se pesquisam nas redes, pois que antes do aparecimento das mesmas, os artigos e livros científicos eram publicados após um escrutínio rigoroso de outros cientistas considerados peritos no campo em causa. Deste modo, quando qualquer pessoa escrever um livro ou artigo dizendo o que quer e lhe apetece (inclusive na rede), quem lê fica na mesma situação de quem se dá conta de um boato, dado que será pouco provável que o leitor (receptor) vá confirmar o conteúdo (e respectivo rigor e autenticidade) através de outros meios. A regra de aceitação é a de que «se todos dizem, é porque é mesmo verdade».

Os boatos, assim disseminados, podem constituir um travão à democracia e ao desenvolvimento sustentado do bem-estar e conhecimento social, constituindo-se como «armas» de manipulação da opinião pública. Por tal motivo, os cidadãos empenhados, os poderes constituídos, a comunicação social e os líderes de opinião devem dar uma particular atenção e prevenir a emergência dos boatos.

Para que tal aconteça a informação deve ser dada com rigor, clareza e a tempo. Por exemplo, reter a informação para surpreender, pode ter consequências penosas. Os boatos surgem, muitas vezes, através das conversas entre as pessoas, conversas sobre novidades e crenças e, como conhecemos – por vezes – as pessoas ou o meio que transmite a informação, esquecemo-nos de provar o que se diz,o que se lê e ouve, ou seja, de autenticara informação. Por vezes os boatos não são necessariamente falsos, e pode mesmo acontecer que surjam para corrigir notícias falsas, havendo situações que encorajem a propagação dos mesmos.

Eles surgem quando um determinando acontecimento ou situação tem um grande interesse público (e social), em que a ambiguidade é notória, existe uma ansiedade colectiva e a informação é reduzida. Deste modo passam a circular entre quem partilha a mesma motivação ou os mesmos interesses e, por vezes, a mesma necessidade de agir (por exemplo,o que acontece diariamente nas redes).

Como o seu conteúdo tende a ser negativo, ele pode reflectir uma manifestação da memória colectiva, retransmitindo informações de gerações anteriores (muitas vezes erróneas), através de argumentos ultrapassados e usados nessas épocas passadas. E, assim, de geração em geração o boato manipula o social, construindo uma representação falsa que se torna numa realidade aceite.

Este resultado dá corpo à máxima de Goebels (ministro da informação e responsável pela propaganda nazi) de que "uma mentira mil vezes repetida, passa a ser verdade”.

 

*Carlos Barracho & Fernando Ribeiro

Professores das Universidades Lusíada de Lisboa e Luanda

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