Opinião

Um trabalho de equipa que permitiu salvar vidas

Filomeno Manaças

De tudo quanto foi vertido sobre o desabamento do edifício nº 76-78 na Avenida Comandante Valódia, ocorrido na madrugada de sábado, uma nota de especial importância há a realçar: damo-nos por felizes por não ter havido sequer uma única vítima humana.

31/03/2023  Última atualização 08H40
© Fotografia por: Edições Novembro

As autoridades e os moradores tudo fizeram para que as famílias fossem retiradas do prédio atempadamente e em segurança. Vimos, nas imagens que circularam nas redes sociais, o risco que uma das moradoras ainda correu ao retirar-se do edifício há apenas alguns momentos antes dele ruir por completo.

Nestes tempos, em que se procura, nas redes sociais, realizar o julgamento mediático dos acontecimentos, em que as plataformas digitais são com frequência calculada utilizadas para inverter ou subverter a verdade dos factos, em que há uma predisposição para se relevar o negativo em detrimento de tudo quanto de positivo possa eventualmente ter sido realizado, é de extrema satisfação e um grande conforto saber que todas as vidas humanas foram salvas.

Não se pode dizer que a tragédia passou completamente ao lado, porque, além do edifício, houve outras perdas de bens materiais.

O prédio desabou e o facto, em si, deixou uma série de alertas às autoridades sobre a necessidade de proceder, ou acelerar eventual trabalho que esteja já em curso, a todo um levantamento de profundidade em relação a edifícios antigos, construídos no tempo colonial, para se determinar o seu estado técnico e as medidas que se impuserem.

Sabemos que, devido ao êxodo populacional provocado pela guerra, milhares de pessoas se fixaram em Luanda e, com a falta de habitação, vários prédios viram ser-lhes acrescentada carga adicional. É possível, um pouco por toda Luanda, ver edifícios em que no terraço foram construídas moradias. Em toda a extensão da Comandante Valódia, e não só, temos exemplos a olho nu. Por outro lado, a degradação da rede de saneamento básico e de distribuição de água, em particular, acabou por afectar a estrutura de sustentação de muitos desses edifícios. A área do Kinaxixe é uma das que reclama particular atenção. Prenda, Marçal e Samba, e por aí adiante, são outras sobre as quais o olho clínico das autoridades deve incidir para estabelecer diagnósticos que permitam evitar possíveis tragédias.

Mas não nos enganemos a pensar que só edifícios antigos podem estar sujeitos a derrocadas. Mesmo os novos, se não houver manutenção e conservação, podem não durar o tempo que o construtor projectou como seu tempo de vida útil. Se as situações que colocam em risco as suas fundações não forem atacadas e resolvidas como deve ser, podem, também esses, sofrer, com o andar do tempo, danos susceptíveis de os fragilizar.

Se olharmos para edifícios que, na época das chuvas, uma boa parte da sua estrutura fica praticamente submersa nas águas ou inundada durante dias seguidos, fácil é de chegar à conclusão de que acautelar o seu futuro passa por realizar, com urgência, trabalho de correcção dessa anomalia.

De momento, as atenções estão viradas para Luanda porque foi aqui que o mal se deu. Mas, a realidade no resto do país não é muito diferente.

Há, em todos os casos, responsabilidades repartidas. O Estado tem as suas, mas os moradores também têm obrigações inerentes ao uso dos imóveis, que não devem ser olvidadas. E, neste aspecto, há um grande trabalho a ser feito. Há toda uma cultura, todo um conjunto de valores comportamentais que deve, tem de ser ajustado a padrões que nos levem a alcançar uma óptima gestão de qualidade dos edifícios, que já existe em muitos de Luanda, sobretudo nos de construção recente, mas que numa grande maioria está em falta.

As administrações locais e as comissões de moradores têm, como é óbvio, trabalho árduo a desenvolver. Há toda uma revisão de procedimentos e comportamentos que a queda do edifício da Avenida Comandante Valódia nos aconselha a realizar. Porque é da nossa vida, da vida dos nossos filhos e netos, da vida dos nossos parentes que estamos a tratar, e todas as veleidades devem ser postas de parte.

É preciso preservar o património hoje para que ele possa, condignamente, também servir a quem vai herdar. E preservar não é apenas cuidar da manutenção e da conservação. É, também, evitar realizar obras que ponham em causa a integridade física do edifício. Às vezes, somos levados a satisfazer mais os nossos egos e descuramos a possibilidade de, agindo assim, estarmos a alterar de modo profundo o eixo de sustentação de todo um edifício, convencidos de que estamos a mexer somente na "nossa fracção” e, por conseguinte, não temos de dar satisfações aos demais.

Pelos vistos, o país tem muitas situações por resolver. Só com trabalho e participação vamos conseguir mudar o actual quadro e alcançar as melhores soluções para a variedade de problemas que nos afligem.

Muitos dos desafios do dia-a-dia exigem de nós foco, dedicação e criatividade. Ir à luta é um dos traços mais marcantes dos angolanos. Por isso, hoje, não fique em casa. Vá trabalhar!

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