Opinião

O homem tornou-se o maior inimigo de si mesmo

Adebayo Vunge

Jornalista

No passado dia 22 de Abril celebramos o Dia Internacional da Terra, instituído pelas Nações Unidas, alguns anos antes da Cimeira de Paris, altura em que todos recebemos um soco no estômago ante o que se estava a passar no Planeta – o aquecimento global está em níveis altamente perigosos, fruto, em grande medida, da acção do homem, o que alguns filósofos chamam de “antropocentrismo devorador”.

10/05/2021  Última atualização 01H15
A nossa era é marcada por alguns fenómenos que colocam em causa não apenas a humanidade, no sentido em que o ser humano tornou-se o maior inimigo de si mesmo, como o próprio planeta, não obstante tudo o que possa ocorrer em matéria de autorregeneração, está também em perigo.

A sociedade do consumo, a globalização, o avanço incontrolável da ciência e da tecnologia, o terrorismo, para além de outros fenómenos circunstanciais, mas de impacto sobre a humanidade, devem levar-nos a um campo de profunda reflexão sobre o destino que estamos a dar ao planeta, mais do que isso, o futuro que estamos a reservar para as próximas gerações. Alguém questionava recentemente, num artigo, sobre o que será da humanidade caso algum grupo terrorista tenha acesso à bomba atómica…

Para além de toda a produção científica com as evidências da gravidade da situação, um sinal claro foi dado pelo Papa Francisco que publicou, em 2015, uma encíclica (Laudato Si) sobre a preservação do meio-ambiente, com base numa premissa única, válida e relevante para os cristãos-católicos e não só: "é preciso cuidar da natureza, porque é criação, dom e presente de Deus”.

Para além da nuvem catastrófica dos últimos tempos, a verdade é que em algumas latitudes começam a surgir sinais muito claros de descarbonização, nem sempre incompatíveis com o crescimento económico, apesar do seu custo largamente superior às fontes fósseis tradicionais que ainda alimentam as necessidades energéticas mundiais. Não podemos perder de vista o quanto os países desenvolvidos estão a dar largos passos para a era pós-petróleo.

Com base em estudos, o proeminente intelectual canadense, Steven Pinker, autor do livro best-seller "O Iluminismo Agora”, lembra-nos o seguinte: "Quando os países ricos, como os EUA e o Reino Unido, começaram a industrializar-se, emitiam cada vez mais CO2 para produzir um dólar do PIB, porém inverteram esta marcha em 1950 e desde então têm estado a registar  emissões cada vez menores. A China e a Índia estão a seguir o mesmo caminho, atingindo o valor máximo de emissões no final das décadas de 1970 e 1990, respectivamente”.

É claro que Pinker é um negacionista, embora, de forma lacónica, partilhe as teses do Papa Francisco, quanto ao facto dos maiores prejudicados das alterações climáticas, ou se quisermos mais claros, do aquecimento global, são os segmentos populacionais mais vulneráveis e as regiões do mundo onde estes habitam.
É claro para nós que este dilema vai indubitavelmente perseguir a agenda de crescimento económico dos países em vias de desenvolvimento pois "a evasão da pobreza requer energia abundante”.

É claro para nós que a industrialização de  África, ou se quisermos de Angola, fica, a priori, comprometida. A nossa industrialização está fortemente dependente da electrificação, seja por fontes térmicas, eólicas, solar ou hídrica, e as necessidades tendem a aumentar por razões económicas, mas igualmente fruto do boom demográfico que se assiste. Pelo contrário, episódios como a desflorestação começam a ganhar corpo e é urgente uma acção coordenada no sentido de revertermos esse quadro.

É claro que os nossos fenómenos recorrentes de seca em contraste com as enchentes noutras regiões são um sinal das aludidas alterações climáticas, sobre as quais é urgente agir. Agir como tem feito o Vice-Presidente da República, o professor Bornito de Sousa que apadrinhou a causa do repovoamento dos mangais no litoral angolano.

Agir no sentido de combatermos ferozmente a desflorestação que se assiste algures no Uíge, Kwanza-Norte, Cuando Cubango sem o respectivo e legal repovoamento. Agir também no sentido de sensibilizar a nossa população sobre os pequenos gestos que devemos assumir no nosso quotidiano, desde logo na forma como lidamos com o lixo doméstico e o plástico, com todas as consequências sanitárias (como vemos ocorrer em Luanda) e com impacto nos oceanos. O estado em que ficam as praias de Luanda após as chuvas é um alerta.

Cuidar do ambiente é o imperativo ético-moral dos nossos tempos pois é urgente invertermos o quadro. Ao ritmo em que as coisas iam (ou vão?) - a pandemia veio mostrar-nos o quanto é possível e a responsabilidade dos homens que tudo querem, tudo fazem, tudo devoram. Sim, nós mesmos. – com a fúria consumista, a elevada mobilidade das pessoas com meios de transporte altamente poluentes, a indústria extractiva e de construção com materiais pouco ecológicos – o homem e o planeta estavam em risco fruto do lastro de destruição e emissão de gases poluentes que se assiste diariamente.

É importante, mesmo no cenário tão adverso como o que vivemos, pensarmos em compatibilizar a nossa vida e a nossa existência. Não adianta pensarmos que é um problema dos outros. Estamos a sofrer e por isso urge agir no sentido individual e colectivo. Isto não é idealismo, é realismo, é pragmatismo.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Opinião