Opinião

Dezoito versículos em minha defesa

Pedro Kamorroto

1.Nem mesmo quando passei da emoção à razão e decidi cabalmente amar o piano, a vida me soou ritmada demais.

19/05/2024  Última atualização 10H31

2.A dor num sintetizador, a vida, seu importante órgão.

3.Tanto erro à esquerda ou tanta (ob)sessão pela música que nos intima para um pé macabro de dança?

4.Talvez o meu maior (de)feito foi amar demais o meu estado de sono, adulá-lo vezes sem conta, portanto, dói saber que todo esse esforço, essa dedicação que só poderia ser amor, não ajudou a desviar sequeras calemas de um caos revolto.

5.Agora vivo, revivo este mar cheio de nervos e vibrações malignas.

6.Bendito sois vós entre o sol, entre a música da ave cristã que não anuncia novos desmoronamentos.

7.O sol na soleira da porta foi tudo menos radioso, havia cinismo nos seus dentes amarelecidos, vi quando abriu a boca pela primeira vez, no primeiro beijo madrugador.

8.O sol é peixe, morre também pela boca. A mesma boca que não anunciou aura às horas, anunciou desmoronamento.

9.Pergunta que não me quer ver calado: por que o sol veio logo desmoronar na soleira da minha porta? Evento aleatório ou (pre)meditado? Que farei com os seus restos, com o peso deste sol morto? É assim que nascem as pestes? Que se exumam infortúnios?

10.Acciono as autoridades ou deixo ele estar à mingua, voltar à terra como insumo primo?

11.Alimentar os experimentos de Lavoisier: na natureza nada se perde, tudo se transforma.Além do mais, a terra é um albergue espanhol, (a) colhe os segredos mais tenebrosos.

12.Misturei pacientemente caldo com cautela quanto baste para não deslizar, desmoronar, desabar de vez.

13.Hora má: um veneno nunca pede permissão para se instalar.

14.Consenti a oferta, não havia outro jeito. Acusei toda a sua transferência em mim, num clarão, vi que era a face (o)culta da lei que despontava em meio ao turbilhão tórrido.

15.Em função disso,percebi que os reflexos da minha sinistralidade, calamidade careciam de uma protecção mais armada, de uma outra abordagem, medida de (re)açcão, quiçá.

16.Mas alto aí, consegues me ouvir? Se for possível vou rebentar o meu diafragma para chamar atenção a mais gente: eu nunca fui a favor de soluções desnutridas de ortodoxia, mas inchadas de extremismos.

17.Talvez seja inútil invocar isso agora. Se calhar, essa é a desordem natural das coisas: viver entre os extremos...

18.Seja como for, ainda tenho a (minha) virtude de um anjo (bom) bem intacta. E a Providência é por mim, mesmo quando o sol não se me revela abraçador. Mas também, não há relógio para deitar lágrimas à terra pelo astro derramado...  

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