Reportagem

Cooperativa promete produzir 25 toneladas de tilápia por mês

António Pimenta

Jornalista

O presidente da Cooperativa, Salomon Sharabi (também conhecido por King Salomon- Rei Salomão em português-), anunciou para Julho do ano em curso, o início da produção de tilápia- cacusso.

15/04/2021  Última atualização 08H40
© Fotografia por: Edmundo Eucílio|Edições Novembro
De acordo com as palavras do homem, cujo nome dá visibilidade ao projecto em parceria com a empresa Mankudilu, a cooperativa King Salomão & Mankudilu vai produzir 25 toneladas de  peixe, por mês.
A cooperativa constituída por 10 empresas,compreende um projecto multifacético, apesar de ter na produção da tilápias o seu negócio principal. Tem também áreas reservadas à  agricultura, particularmente, o cultivo de tomate, cebola, cenoura e limão melhorado.

Concebido a baixo custo, o projecto da King Salomão & Mankudilu é definido pelos seus promotores como sendo de "uma simplicidade incomum, mas muito prático”, em termos de execução e funcionalidade. Estes atributos representam as principais marcas do grupo.

No total, a cooperativa tem a seu dispor uma área de 15 hectares para a agricultura e cinco para a produção de tilápia. As suas acções, como confirmamos, estão divididas em partes iguais para cada um dos associados, com espaços subdivididos em áreas de 30/50 metros quadrados para cada integrante do grupo com  quatro tanques,  dois grandes e dois pequenos, que vão produzir 2,5 toneladas de cacusso, por mês, em cada parcela de terreno. 

Emprego para antigos militares
O presidente da cooperativa King Salomão & Mankudilu explicou ao Jornal de Angola que as condições desumanas em que encontraram algumas famílias de ex-militares, em Caxito, terá ditado a escolha desta franja de cidadãos para ocupar as vagas de emprego que tinham disponíveis." Encontramo-los com um sem número de dificuldades, que nos obrigou a optar um plano de emergência para acudir às difíceis condições de vida  que os mesmos enfrentavam. Depois  do estudo aturado que realizámos, concluímos que a melhor saída seria priorizar a admissão de ex-militares”, salientou. No passo seguinte, prosseguiu, os ex-combatentes foram distribuídos em grupos, ficando os pais na agricultura e os filhos na aquicultura. Segundo nos foi dado a observar, todos estão a passar por um processo de formação  para aumentar os seus conhecimentos nas suas áreas de intervenção, permitindo que, numa perspectiva futura, cada um que quiser, venha a montar o seu próprio negócio.

A escolha dos empregados

Deficientes de guerra, ex- militares e deslocados foram os indivíduos escolhidos para abrir a frente na cooperativa King Salomão & Mankudilu. Apesar de terem ofícios diferentes,  carregam com eles uma história e um passado comum, que os une num mesmo quadrante: são todos antigos combatentes, que, depois da tropa, foram deixados à própria sorte.

King Salomon  garante que trabalham na cooperativa 50 famílias de ex-combatentes, deslocados e desmobilizados de guerra. De acordo com os depoimentos que recolhemos no local,   grande parte destes ex-militares levava uma vida errante e praticamente sem norte. Conforme disseram ao Jornal de Angola, os biscates que nem sempre apareciam, constituía a única fonte para  se sustentarem. Qualquer um deles encontrou na cooperativa King Salomão & Mankudilu, o seu primeiro emprego fixo.

 Lopes de Almeida Congo, 61 anos de idade, natural de Nambuangongo, é uma dessas pessoas. Casado, pai de oito filhos, ficou mais de 20 anos desempregado e sem qualquer fonte fixa de rendimentos."Desde que saí da tropa,    não tenho onde cair  morto. Os meus filhos não vão a escola por falta de recursos e nem sempre  tenho o suficiente para manter o fogão aceso”, afirmou.

 Segundo defende, é preciso maior atenção aos desmobilizados de guerra. "É importante que se preste uma maior atenção a esta franja de cidadãos pelos serviços prestados à causa da Nação”, frisou. Questionado se estava satisfeito com o novo emprego, referiu que depois de muitos anos desempregado, não está em condições de fazer escolhas ". É sempre um emprego e, graças a Deus, apesar de insuficiente, já dá para alegrar a minha família".

 De 63 anos de idade e 8 filhos, Augusto Pande João é mais um, entre muitos ex-combatentes, que trabalham na cooperativa King Salomão & Mankudilu. Encontramo-lo a trabalhar na estufa onde estão a ser preparadas as plantas e ervas que vão dar outro visual às zonas à volta da instituição.  Ele nunca teve trabalho fixo e a cooperativa foi o primeiro emprego que conseguiu desde que foi desmobilizado, já lá vão mais de duas décadas.

A partir da altura em que consegui este emprego, deixei de dormir com sobressaltos, a pensar no que vou comer no dia seguinte, desabafou para acrescentar que apesar de não ter o suficiente para satisfazer as suas necessidades, já consegue sustentar minimamente as necessidades da "minha família durante o mês todo”.

 Com um historial ligeiramente diferente, Correia Bernardo Ngangula, 52 anos, "passou a vida toda na tropa, de onde saiu como oficial subalterno. Sem emprego e nem como se sustentar, utilizou, a partir desta altura, a catana como a sua companheira inseparável.Religiosamente todos os dias, como explica, saía de casa com a catana à mão à procura de qualquer coisa para fazer e que lhe permitisse levar alguma coisa para casa.

Para além dos  ex-militares encontramos também na cooperativa pelo menos dois deficientes de guerra.  João António Loanda, que perdeu o membro inferior esquerdo, consequência do accionamento de uma mina e Abel Alexandre, naturais de Chicala-Choloanda, que perdeu o membro superior direito durante o conflito, integram o vasto universo de deficientes de guerra, todos residentes na província do Bengo, que beneficiaram das oportunidades de emprego.
Produção agrícola

"De uma maneira geral, estamos a trabalhar com os antigos combatentes e suas famílias para dar forma aos projectos de aquicultura e agricultura que temos. Vamos ensiná-los a produzir tomate, cebola e outros vegetais, tornando-os autosustentáveis", revelou King Solomon.O presidente da cooperativa fez questão de aclarar que após a formação, o pessoal vai trabalhar em regime autónomo, cabendo à Cooperativa, apenas, a responsabilidade pelo fornecimento de sementes dos produtos que eles vão produzir. "Como moeda de troca, eles vão vender estes produtos à  Cooperativa que terá a missão de comercializá-los nos principais mercados em Luanda principalmente”, disse.

King Salomon esclareceu que o processo de irrigação das plantações vai ser feito através do aproveitamento das águas residuais, provenientes da aquicultura. "Muitas pessoas pensam que as águas provenientes da criação de tilápias devem ir para o lixo. Mas, na verdade, ela funciona como uma espécie de fertilizante para agricultura”, adiantou. De acordo com o presidente, espera-se que a cooperativa venha a produzir, anualmente, 17 toneladas de limão melhorado, 15 de tomate, oito de cebola e dois de cenoura.
Produtos melhorados

Sentados à volta de uma árvore, um grupo de homens trabalhavam afincadamente para o melhoramento da planta de limão.  O melhoramento genético das plantas é a ciência que tem como objectivo permitir que as espécies cultivadas sejam mais produtivas e resistentes ou tolerantes às pragas, doenças e as adversidades climáticas. Pode ser considerada uma forma ecologicamente responsável pelo aumento da produção, com qualidade, dos produtos melhorados.

Angola precisa  de 50 mil toneladas de peixe por ano

Com uma população estimada em cerca de 28 milhões de pessoas, Angola precisa, de acordo com King Salomon, de 50 mil toneladas de peixe por ano, o que, em sua opinião, torna o sector da aquicultura, uma das áreas mais importantes para o desenvolvimento do país, depois da agricultura.

Os membros da cooperativa

No contacto com três membros da Cooperativa, notámos que o optimismo é geral. Todos acreditam no êxito do projecto. Cada membro, na sua maioria jovens com menos de 40 anos, tem um espaço de 30/50 metros, quatro tanques, dois pequenos e dois grandes, para a produção de tilápias, sem contar com outros serviços que acima relatamos.

Para Adão Domingos Neto, 39 anos de idade e proprietário da ITIDU Investimentos, a  Cooperativa é o que se pode considerar "um projecto muito ambicioso" que vai ajudar a desenvolver a província do Bengo, desempenhando um importante papel no combate ao desemprego e o consequente enquadramento social de muitas famílias vulneráveis.

 "Sinto-me feliz por ser parte deste projecto. É o tipo de iniciativas que o país precisa para  relançar a nossa economia”, frisou, e apelou aos bancos comerciais a assumirem uma postura que facilite o acesso ao crédito para os grandes investidores em todo o país.

A partilhar os mesmos pontos de vista, encontramos Alfredo Dungue de 39 anos de idade, proprietário da A.A Dungue, Prestação de Serviços Limitada. Segundo sustenta, a forma como a Cooperativa está a evoluir "confirma a seriedade do projecto que traz com ele uma mão cheia de benefícios para esta província”. Iniciamos as nossas obras em Novembro passado e três meses depois já sentimos o peso da nossa Cooperativa no Bengo. Conseguimos tirar do desemprego 50 famílias, em Julho iniciamos a produção do peixe que vai ser, um dos principais mercados, a seguir o de Luanda. Considero esta, o tipo de iniciativa que o país precisa, a bem de toda Nação”, sentenciou.

Inquestionavelmente animado com a evolução da Cooperativa, João Kiala Pembele, 36 anos e dono da Ledato Limitado, não conseguiu disfarçar a satisfação  por ser parte do projecto e garantiu que vai dar o melhor de si para assegurar o seu sucesso, como uma forma de ajudar a reduzir um dos maiores flagelos sociais que assolam o nosso país, a pobreza.
Cooperativa King Salomão

Num projecto avaliado em cerca de um milhão de dólares, norte- americanos, a cooperativa conta com vários escritórios para acomodar os seus membros e um laboratório que vai acompanhar a evolução do peixe, a partir da desova aos alevinos e, posteriormente, a fase de consumo. Está igualmente previsto, um gabinete para prover informações gerais sobre a produção de peixe a todos os interessados, antes da compra.

A produção de um milhão de alevinos por mês (um terço das necessidades do país) para consumo interno e  venda para os principais mercados no Bengo, Luanda  e outras províncias, constam das principais apostas da cooperativa. Na opinião de King Salomon, Angola precisa no mínimo de 10 milhões de alevinos por mês para cobrir a procura."Existem pequenos produtores no Uíge, Cuanza-Sul e outras zonas do país que também produzem alevinos, na sua maioria, em pequena escala, mas, mesmo assim, ainda estamos muito aquém das necessidades”, adiantou.

 Uma das grandes inovações que vai nos trazer o laboratório tem que ver com a mutação genética do peixe. Logo após a desova os ovos vão ser transferidos para o laboratório, onde vão receber uma alimentação especial com álcool e hormonas. "Esse tratamento vai determinar a alteração genética dos alevinos, transformando-os de masculino para femininos que, do ponto de vista fisiológico, desenvolvem mais  rápido que os do sexo oposto.

King Salomon afirmou que tudo vai ser feito com base no respeito às regras internacionalmente estabelecidas e o envolvimento de quadros angolanos altamente qualificados, formados no Brasil,   utilizando para o efeito tecnologias de ponta, provenientes de  Israel e Brasil.

Fontes do Jornal de Angola que se manifestaram, de alguma forma, encantadas com esta iniciativa consideram que este é o  tipo de projectos que  devia ser implementado em todas as províncias do país, como via para reduzir as assimetrias regionais. Tais  fontes consideram que o baixo custo do projecto da construção da cooperativa prova que "muitas vezes não precisamos de avultadas somas em dinheiro para pôr a funcionar grandes projectos”.

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