Reportagem

Casa Azul de “braços abertos” recebe milhares de visitantes

Augusto Cuteta

Jornalista

Em Seul, entre tantos edifícios com linhas arquitectónicas tradicionais e modernas, na avenida Chenongwadae-ro, Jongno-gu, está um imponente palácio que chama a atenção de quem visita o centro da capital sul-coreana.

05/07/2023  Última atualização 06H55
© Fotografia por: DR

O magestoso lugar, que ocupa uma extensão de 253.505 metros quadrados, considerado um dos mais sagrados da Península Coreana, é constituído por seis edifícios ou áreas de extrema importância para a governação do país. O vasto espaço dispõe de um Escritório Principal, Yeongbingwan (Salão de Convidados de Estado), Chunchugwan (que se abre na Primavera e Outono), Jardim Nokiiwin, Colina Mugunghwa (Rosa de Sharon) e o Palácio Chilgung. É este conjunto de edifícios que compõe o Cheong Wa Dae, o Palácio da Presidência coreana, que, até ao ano passado, era a residência oficial do Presidente sul-coreano.

Reconstruído e ampliado, durante mais de 30 anos, o Palácio Cheong Wa Dae acolhe os escritórios administrativos do Presidente, Secretaria e outros sectores funcionais, assim como era até bem pouco tempo a residência oficial do Presidente e da Primeira-Dama da República.

Foi oficialmente nomeado Cheong Wa Dae, em 1960, após a posse de Yun Bo-sun, que serviu como segundo Presidente da Coreia do Sul. Mas, em 1991, o edifício principal foi reestruturado no mandato de Roh Tae-woo, o sexto Presidente do país.

A actualmente a conhecida "Casa Azul” não é mais, desde o ano passado, a residência oficial do Presidente da Coreia do Sul, uma vez que Yoon Suk-yeol, que iniciou o mandato a 10 de Maio de 2022, preferiu viver num outro edifício, apesar de continuar a utilizar os espaços da Cheong Wa Dae para diversas actividades. O edifício principal do Cheong Wa Dae, com dois andares, é constituído por vários compartimentos, sendo a Yeongbingwan a vasta sala que o Presidente usa para as grandes recepções.

Com um estilo arquitectónico inspirado nos antigos edifícios coreanos, o Cheong Wa Dae tem no edifício principal de escritórios um telhado sui generis, com uma cobertura de 150 mil azulejos azuis. Aliás, é este detalhe que originou o nome "Casa Azul”.

A Cheong Wa Dae representa poder e imponência. E, para provar isso, no seu exterior, depois do vasto jardim totalmente esverdeado. Nas laterais do edifício principal há duas estátuas de animais enigmáticos. Estes bichos são, igualmente, símbolos de forças que repelem o mal.

Na parte interna, os encantos são ainda mais visíveis. O chão é revestido de madeira de pinheiro vermelho, um produto típico da Coreia, como explica King, responsável pela exposição sobre os 12 Presidentes, que decorre na Sala Principal.

Sobre a Sala Principal, o homem que guiava a visita ao Palácio Presidencial esclareceu que o espaço acolheu os 12 Chefes de Estado coreanos, daí o lugar representar parte da história moderna do país e ser um lugar essencial do poder da Coreia. Aliás, durante a visita da equipa de oito jornalistas de Angola, Gabão, Tanzânia, Etiópia, República Checa e Polónia, o nosso cicerone referiu que a Cheong Wa Dae acolhe os poderes sul coreanos, desde 1948, e depois a partir de 1960, ciclo que tinha paralisado por anos e recuperado, em 1991.

O King, apesar de explicar em coreano refinado, fazia, nalguns momentos, pausas longas para os intérpretes e jornalistas fazerem perguntas. E, foi assim durante cerca de hora e meia, no edifício principal. Depois, os repórteres foram entregues a outro funcionário que guiaram-nos a outros pontos do Palácio Presidencial. No total, foram três horas de visita.

  Entre o céu e a terra

Antes de os Jornalistas partirem para o segundo andar, onde fica o gabinete oficial de trabalho do Presidente e a sala de reuniões, King referiu que as obras de reabilitação e ampliação da Casa Azul respeitaram alguns pontos da tradição coreana, tendo conservado esses cenários do antigo templo. Quando indicava para cada detalhe das estruturas das paredes, desde a pintura, gravuras, escritos a cores, King procurou mostrar o que o Palácio Presidencial representa, além do poder, a beleza da Coreia do Sul. "É a verdadeira harmonização entre a tradição e a modernidade”, destacou.

Mais adiante, referiu que a Casa Azul dá uma perspectiva real da Coreia, o que faz crer que o palácio está entre "o céu, a terra e os humanos”. É este o conceito que disse estar implicado na arquitectura da Cheong Wa Dae.

Todo o trabalho administrativo é feito no primeiro andar. Aqui, de um lado, vê-se uma sala onde o Presidente trata de assuntos do país e, do outro, onde o Chefe de Estado realiza cerimónias de premiação e homenagens às grandes personalidades. É, igualmente, neste piso onde a esposa do Presidente da Coreia mantém encontros com seus convidados.

  Mais de dez milhões de visitas

A segurança da Casa Azul , que acolhe, igualmente, a casa estatal de hóspedes para eventos oficiais ou grandes reuniões e uma residência oficial para a primeira família, a Sangchungjae, para receber convidados estrangeiros e reuniões não oficiais, é um assunto importante.

Durante a sua explanação, o senhor King deixou claro que antes de 10 de Maio do ano passado, os 12 Presidentes coreanos sempre olharam para a questão da segurança da Casa Azul, erguida sobre o jardim real da Dinastia Joseon (que reinou de 1392 a 1897), como uma das maiores prioridades. Mesmo assim, tentaram abrir a Residência Presidencial ao público.

Apesar desse esforço dos líderes, a Segurança nunca permitiu que o público tivesse acesso fácil ao Palácio Presidencial, cenário que ficou ultrapassado com a tomada do poder por Yoon Suk-yeol, ex-procurador geral da República.

Hoje, todos os dias, a Casa Azul recebe visitantes, quer nacionais quer estrangeiros. Estimativas apresentadas por King apontam para mais de dez milhões de pessoas em visitas ao lugar, desde Maio do ano passado.

King referiu ainda que, antigamente, pela sua localização estratégica e favorável, a Casa Azul era considerada como "O Lugar Mais Abençoado da Terra”, como está escrito numa pedra que se encontra atrás da residência, marcada durante a construção de um novo edifício, no ano de 1991.

Por causa dessa localização, em finais dos anos 60, um grupo de militares norte-coreanos tentou se infiltrar no edifício para assassinar o Presidente Park Chung-hee, um acontecimento que ficou conhecido como "Assalto à Casa Azul”. Actualmente, o país está a dar passos mais abertos para a democracia, referiu o responsável pela exposição.

E foi o que deu a ver quando atingimos a zona do Nokjiwon, um jardim de 3.300 metros quadrados, onde estão cerca de 120 espécies diferentes de plantas, incluindo aquelas plantadas pelos ex-Presidentes. Entre essas plantas está o pinheiro-manso, de 17 metros de altura, que é o símbolo mais conhecido do jardim do Palácio Presidencial coreano. Essa árvore tem mais de 250 anos.

Aqui, numa das suas extremidades tem um letreiro em coreano. O repórter deste diário perguntou à Érica, a tradutora do jornalista angolano, o que significava aquela representação.

A coreana, que viveu parte da infância no Brasil e fez a pós-graduação em Portugal, traduziu a frase linearmente assim: Casa Azul, de "braços abertos” para o público.

  Um piso cheio de simbolismos


Yoon Suk-yeol  é o actual   Presidente sul-coreano. Ex-promotor público e advogado, Yoon exerceu até antes das últimas eleições o cargo de procurador-geral da Coreia do Sul entre 2019 e 2021, quando o Presidente era Moon Jae-in.

Nascido na capiutal coreana, a 18 de Dezembro de 1960, frequentou a Universidade Nacional de Seul. O actual Presidente da Coreia é membro do Partido do Poder Popular.

Yoon Suk-yeol é o líder dessa península entre os mares da China Oriental e do Japão, a Coreia do Sul, que tem uma área total de 100.339 km² e uma linha costeira total de 2.413 km, é a décima economia mais desenvolvida do mundo.

A Coreia do Sul situa-se a uma altitude média relativamente baixa de 282 metros acima do nível do mar. O pico mais alto da montanha (Halla-san) está a 1.950 metros acima do nível do mar. O país também inclui cerca de 4.400 outras ilhas menores e parcialmente desabitadas.

Coberto quase na totalidade por montanhas, a Coreia do Sul tem apenas a Coreia do Norte como o único país limítrofe directo, sendo que já teve 12 Presidentes.

São estes históricos Presidentes que estão na exposição que decorre na Casa Azul. O grupo de jornalistas teve contacto com outros importantes compartimentos do Palácio Cheong Wa Dae.

Uma dessas salas serve so-mente para a exposição de fotografias de personalidades, que marcaram a vida da Coreia do Sul em vários sectores, desde políticos, militares, desportistas, cientistas, músicos, pintores, entre outros.

Mas, é no segundo andar onde há uma representatividade de encantar os visitantes. Cada detalhe neste andar tem uma explicação. Por exemplo, à entrada está a pintura da Península Coreana, feita durante a recriação do palácio.

Esta pintura, explica King, tem um relevo em ouro e tinta prateada. "Isto torna o ambiente mais artístico”, considerou.

Neste piso, onde funciona o gabinete oficial do Presidente, várias pinturas estão estampadas na parte interior do tecto, com grande realce para os principais pontos das estrelas.

No escritório oficial do Presidente, fixadas numa parede, atrás da cadeira do líder coreano tem a figura dourada de duas imagens lendárias: a ave Fénix e a flor rosa- de-Saron. Ambas representam o poder.

Quando recebe visitas, o Presidente, por norma, o faz num ponto específico. Neste lugar, há uma representação de uma gigantesca montanha, símbolo da Coreia, uma vez que o país é coberto por relevos rochosos.

  Uma mulher na Presidência

Roh Moo-hyun foi Presidente da Coreia entre 2003 e 2006. Não era um universitário, mas fez os exames e foi admitido para adquirir cédula profissional e praticar a advocacia. Defendia a dignidade dos homens.

Depois de acusado de crimes de corrupção, Roh Moo-hyun tinha sido suspenso do cargo pelo Parlamento sul coreano, em 2004, mas reconduzido depois. Porém, o ex-Presidente foi encontrado morto, após a sua queda de uma montanha, com sinais comprovativos de suicídio. Em 2008, o cargo de Presidente sul coreano foi assumido por Lee Myung-bak, que governou até 2013. Este líder gostava de andar de bicicleta (patente na exposição) pela cidade. Apesar de ser um grande empresário, sempre optou por uma vida simples. Em 2013, a história da Presidência sul coreana registou um facto inédito, com a eleição de Park Geun-hye ao mais alto cadeirão do país. Filha do ex-ditador Park Chung-hee, a mulher liderou o país entre 2013 e 2017.

Escritora, gostava de desportos, Park Geun-hye foi removida do cargo de Presidente por um processo de impeachment.

O penúltimo Presidente da Coreia do Sul foi Moom Jae-in, que esteve no cargo entre 2017 e 2022. Este líder do paísprocurou realizar acordos de maior abertura com a Coreia do Norte.

Filho de ex-refugiados norte-coreanos, Moom Jae-in, depois de terminar o mandato, dedica-se a promover a leitura. Por isso, em sua casa, criou uma livraria, que atende centenas de pessoas.

Exposição sobre a vida de Presidentes coreanos


Antes de Yoon Suk-yeol, que não aceitou residir na Casa Azul, a Coreia do Sul foi governada por outros 12 Presidentes. Alguns desses líderes sul coreanos, disse King, tiveram mais do que dois mandatos.

Para perceber este trajecto, a Presidência está a realizar uma exposição na Casa Azul, onde os visitantes vão perceber a vida social dos antigos líderes coreanos, além das suas facetas políticas. O responsável da exposição esclareceu que o conceito do evento é uma homenagem à vida quotidiana dos Presidentes. "Não estão muito reflectidos as incidências políticas, mas aspectos sociais ou humanos dessas personalidades que serviram o país como os mais altos mandatários da Coreia do Sul”, disse King.

Durante a exposição, é possível encontrar nos stands uma série de artigos pessoais dos antigos Presidentes coreanos, desde roupas, óculos, instrumentos musicais/diversão e de trabalho em fotografias.

É o caso de Rhee Syngman, que governou o país por três mandatos consecutivos, de 1948 a 1952, de 1952 a 1956 e deste ano até 1960. Este primeiro Presidente coreano mudou o nome do palácio para Cheong Wa Dae, uma vez a antiga designação representar o Império Japonês. Na exposição, está a máquina de dactilografia que Rhee Syngman usou para escrever, ele próprio, documentos oficiais e trajes pessoais (roupa tradicional coreana).

Os visitantes encontram, igualmente, pertences de Yun Po-sun, considerado o quarto Presidente, embora fosse o segundo a ocupar o cargo. Este era famoso pela sua boa forma de vestir. Por isso, tem patente na exposição trajes deste líder sul coreano.

Noutro stand estão expostos pertences pessoais de Park Chung-hee. Apesar de o quinto líder ter sido considerado o grande símbolo da ditadura, é na época deste Presidente, de 1963 a 1979, representando cinco mandatos, que a Coreia atingiu passos consideráveis de desenvolvimento. Park gostava de desenhos e fotografias.

O mandato mais curto da história da Presidência sul coreana é de Choi Kyu-hah, que ficou no cargo por apenas um ano, entre 1979 e 1980, após um golpe de Estado, perpetrado pelo seu sucessor. Este Presidente era carismático por causa da simplicidade como levava a sua vida social.

Choi kyu-hah foi substituído por Chun Doo-Hwan, um Presidente que gostava de praticar futebol. Este homem também governou a Coreia com ditadura, de 1980 até 1988.

Mas, o símbolo dos Jogos Olímpicos foi Roh Tae-woo, que liderou a Presidência da Coreia, entre 1988 e 1993. Este líder sul coreano foi substituído por Kim Young-sam.

Kim Young-sam, que foi um activista que liderou o movimento democrático, foi Presidente da Coreia do Sul, de 1993 a 1998. Foi, por isso, um grande rival dos regimes autoritários de Park Chung-hee e Chun Doo-hwan. Durante a exposição, a   equipa de jornalistas ficou a saber que Kim, quando tomasse uma decisão de grande relevância, corria. É na época deste Presidente que se demoliu o antigo prédio, onde está, hoje, erguida a Casa Azul.

Kim Dae-jung foi outro grande Presidente democrático. Com o seu antecessor, marcou o desenvolvimento da democracia na Coreia. O democrata, que governou o país entre 1998 a 2003, gostava de meditar e regar as plantas.

Os seus opositores não ficaram felizes com a forma como Kim Dae-jung governava o país. Por isso, este Presidente foi condenado à sentença de morte pelo seu grupo de pressão.

  Um espaço turístico

A abertura do Plácio   Cheong Wa Dae está a ser visto como uma grande oportunidade para a Coreia do Sul promover cada vez mais o turismo no país.

Com uma série de templos antigos, rochas/montanhas, torres e outros pontos turísticos, a Casa Azul associou-se, desde o ano passado, ao conjunto de locais de atracção do turismo na Coreia.

Com isso, o país pode ganhar mais na sua economia e fazer com que o mundo conheça a verdadeira história de desenvolvimento do país. É o que pensa King, quando explicava as vantagens de ter o Palácio Presidencial aberto ao público.

Embora o Jornal de Angola não tenha conseguido apurar o valor monetário que os turistas desembolsam para visitar a Casa Azul e outros pontos turísticos, sabe-se que os números são consideráveis. Por exemplo, há quase três anos, altura em que o mundo era praticamente assolado pela pandemia da Covid-19, um total de três milhões de turistas idos de diversas partes do mundo visitou a Coreia do Sul.

Com isso, dados oficiais estimam que o sector do Turismo daquele país asiático gerou 11,78 biliões de dólares, o que correspondia a 0,65 por cento do Produto Interno Bruto e quase 36% de todas as receitas do turismo internacional no Extremo Oriente do continente.

Fora esta questão do turismo, o jornalista deste diário despertou uma curiosidade por um número considerável de coreanos se chamar Kim, Lee ou Park.  Érica riu-se, mas explicou que o sobrenome Kim, o mais comum no país, é de famílias bastante representativas, assim como o são os Lee e Park.

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