Opinião

A normatização como mecanismo de prevenção e detecção da corrupção

Kumuenho da Rosa

Jornalista

Foi anunciada há poucos dias a Estratégia Nacional de Prevenção e Repreensão da Corrupção, pela voz do ministro de Estado e chefe da Casa Civil, Adão de Almeida, que no seu jeito peculiar, de saber descomplicar, tratou de explicar ao que efectivamente vem essa boa nova.

11/06/2024  Última atualização 07H39

As explicações serviram, ficando apenas por se saber desde quando é que a sociedade poderá começar a perceber os sinais da introdução desse importante instrumento de gestão do processo de combate à corrupção.

Entretanto, não tendo sido uma mera operação de charme político, o que se pretendeu com esse anúncio, sendo pouco comum que sejam anunciadas e publicitadas estratégias, quando muito partilham-se as linhas gerais e metas para que as pessoas possam acompanhar o percurso e perceber, aí sim, que algo está a ser feito para o bem da comunidade e em seu benefício, em particular.

Ora, neste caso, o Executivo terá procurado fazer, simultaneamente, duas coisas: a primeira foi sinalizar que o combate à corrupção em Angola continuará entre as prioridades do Executivo. A segunda, tão importante quanto a primeira, foi fazer evoluir a abordagem inicial, mais sancionatória e punitiva (dir-se-ia truculenta e musculada), para outra mais pedagógica, integrada e sustentável.

Em suma, fica a ideia de que ao definir momentos ou etapas para o conjunto de acções a desenvolver na implementação da estratégia, o Executivo assume que combater o fenómeno corrupção não é, nem tinha como ser, um fim em si mesmo. Os dois únicos lugares no mundo em que a corrupção terá eventualmente desaparecido num piscar de olhos, terá sido em Hiroshima e Nagazaki, naquela que terá sido um dos piores momentos da história da humanidade.

O combate à corrupção é um processo complexo, normalmente, demorado e abrangente, que não se esgota com a aprovação de um punhado de leis, reforço dos poderes e atribuições do Ministério Público, a construção e apetrechamento de tribunais e a expansão da rede de estabelecimentos prisionais.

Na verdade, e isso ficou subjacente nas declarações do ministro de Estado e chefe da Casa Civil sobre o documento aprovado em sede do Conselho de Ministros, é que, como Nação, temos mais hipóteses de chegar a algum lado se apostarmos na prevenção, como primeiro passo, o que pressupõe cuidar das pessoas para termos famílias estruturadas, comunidades resilientes, investir mais na educação e no ensino, e nas instituições republicanas, tornando-as fortes e estáveis.

Referi-me de propósito às instituições republicanas, pois pretendo que olhemos para a questão que coloquei inicialmente. A diferenciação entre norma e lei. Apesar de muito boa gente entender como equivalentes, a verdade é que norma e lei são realidades diferentes.

Enquanto a norma abrange também o costume e os princípios gerais do Direito, ou seja, a conduta que se exige a um cidadão, e que pode ou não estar escrita, a lei já é uma forma de manifestação da norma, mas que implica necessariamente que tenha emanado do poder legislativo do Estado.

Daí entender que para combatermos como deve ser o fenómeno da corrupção, não são necessárias mais leis. Inclusive, há quem considere que temos demasiadas. Tantas que algumas chegam mesmo a atrapalhar. O que nos falta são soluções de concretização dessas leis. Instrumentos que ajudem a melhorar a eficácia das mesmas. É aí que julgamos que as normas podem jogar um papel determinante.

Sendo a corrupção um fenómeno que opera, essencialmente, no ambiente corporativo, nada mais assertivo que, no âmbito da estratégia de prevenção e repressão da corrupção, lancemos mão à chamada normatização. Entenda-se a normatização, como o processo de formalização e aplicação de regras para a solução ou prevenção de problemas, com a cooperação de todos os interessados.

Na escola preparamos, desde a base, futuros homens e íntegros e impolutos, mas no ambiente de trabalho há que introduzir esses instrumentos de gestão que ajudam a moldar comportamentos, instituem modelos de conduta, inibem as más práticas e salvaguardam valores corporativos.

 Se se entender como absolutamente necessário continuar a legislar, que se crie uma apenas, que obriga a que as organizações, seja do sector público como do privado, tenham normas internas que ajudem a moldar condutas, estabelecer rotinas que com o tempo acabarão por transformar-se em valores corporativos.

Uma prática bastante comum em sectores altamente regulados, como na aviação civil e no oil and gas, onde o que não faltam são (bons) exemplos de rigor, profissionalismo e cultura de trabalho, bem como de transparência e integridade, de valorização do capital humano e de reconhecimento de boas-práticas de gestão. Não é efectivamente uma varinha mágica, mas que ajuda, ajuda.

 

*Jornalista

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