Cultura

Visitantes e expositores pedem maior apoio às tradicionais “Festas do Mar”

Maria Cavela | Moçamedes

Jornalista

Tradições, ritos, mística e legado cultural, recreativo e desportivo marcaram as comemorações das Festas do Mar, que encerraram ontem na cidade de Moçâmedes, capital da província do Namibe.

08/04/2024  Última atualização 09H25
A tenda do expositor Roots, participante no evento que, no passado, movimentava gente de vários pontos do país e do exterior © Fotografia por: DR

Porém, expositores e visitantes lamentaram a falta de apoio e declínio das qualidades culturais da festa, que hoje olham como um evento cada vez mais descaracterizado em relação às edições passadas. 

Em busca de histórias sobre as tradicionais Festas do Mar, a reportagem do Jornal de Angola ouviu o testemunho de Mário Faria, 73 anos, natural de Moçâmedes, que se notabilizou pelo contributo dado para a organização da primeira edição das "Festas do Mar”, sob o comando dos Nativos, em 1985.

Mário Faria revela que sente saudades das antigas Festas do Mar e nega-se a comparar as actuais comemorações pelo facto de se sentir desagradado com a perda de valores e falta de conservação do que era indispensável nas também conhecidas Festas de Verão. Mas reconhece o empenho do actual Governo da Província do Namibe e da comissão organizadora para melhorar as coisas no lado cultural e económico.

Mário Faria começou por descrever que a sua participação, em 1985, foi na vigência do então comissário provincial Faustino Muteca, que redinamizou as festas com a criação da primeira comissão organizadora, na qual foi enquadrado para garantir a reposição do entretenimento social realizado regularmente na Baía de Moçâmedes.

O interlocutor lembra que as antigas comemorações eram realizadas de forma simbólica, com vestígios da organização colonial ligada à parte cultural e desportiva, onde se destacavam várias actividades ligadas ao mar, como corridas de barcos à vela, concurso de pesca infantil por meio de pequenas embarcações, desenhos na areia da praia e a existência do "comboio bebé”, que circulava no recinto das festas.

"A ideia era fazer actividades simbólicas que movimentavam milhares e milhares de pessoas. Procuramos enquadrar aquilo que o colono deixou como legado em termos de comemoração e incorporar a nossa ideia para torná-la melhor. Foi uma época de muito trabalho e dedicação de quase todos, a destacar os estudantes do Instituto Maritimo de Moçâmedes, do qual eu era director na altura”, disse.

Mário Faria sublinha que as edições das Festas do Mar antes d 2000 mantinham um legado cultural bastante forte, colocava-se em realce a exposição da Arte Humbali, através de uma representação artesanal feita com a antiga e famosa "pedra santa”, que permitiu maior alargamento do conhecimento da cultura dos nativos de Moçâmedes por parte dos visitantes de quase todas as paragens do mundo.

Enquanto promotor e organizador, Mário Faria tem memórias positivas e lembra com satisfação a participação activa de vários grupos de jovens vindos de Luanda, graças ao envolvimento das empresas patrocinadoras que conseguiam movimentar centenas de crianças, adolescentes e jovens de toda a parte do país para demonstração de ginástica rítmica e outras atracçães no evento.

"As actuais Festas do Mar estão um pouco aquém da sua concepção inicial. Precisamos de resgatar os antigos hábitos para agregar maior valor aos que frequentam o evento. Perdemos muita coisa que caracterizavam as tradicionais Festas do Mar. Já não há concursos, actividades ligadas ao mar, portanto, está virada para grandes festanças que não agradam a todos”, manifestou Mário Faria.

Festas estão desvirtuadas

O jovem que se identificou apenas por Roots, membro da comunidade Rastafaray,  é expositor de artes culturais das "Festas do Mar” há mais de 15 anos. Na companhia dos seus amigos, assume a responsabilidade de expor utensílios que estimulam bons hábitos culturais de todas as regiões do país, desde roupas, calçado, esculturas e bijuterias para homens e mulheres. Roots avançouque apesar de ser natural da Huíla, desde muito cedo interessou-se pelas "Festas do Mar”, pelo facto de agregar valores de relevância social e apresentar relatos místicos que despertam a curiosidade de qualquer pessoa.

O expositor Roots reconheceu que os 15 anos de convivência nas tradicionais Festas do Mar permitiram conhecer alguns mitos, como a história da existência da sereia e o significado de mortes consecutivas de pessoas no mar, que até hoje procura entender os motivos.

"Pelo tempo que venho a expor, já ouvi muita coisa e cada dia que passa desperta mais a minha curiosidade sobre os mistérios do mar. São vários contos e mitos que me custa a acreditar, mas como ouço por parte dos nativos, fico mais curioso a cada dia que passa”, disse.

Segundo constata, urge a necessidade de ampliar esforços, espaço e oportunidades no que toca à identidade cultural do evento. Lamentou que em cada ano se nota menos adesão e apela a uma maior divulgação e promoção da exposição cultural deste evento que agrega milhares de pessoas. Celebradas desde 1962, esta edição teve início no dia 9 de Março, com a tradicional Missa de Acção de Graças e oferendas ao mar. A edição 2024 foi preenchida por mais de 200 expositores, sob o lema "Fortalecendo a Cultura e Dinamizando o Turismo Sustentável”.

Comentários

Seja o primeiro a comentar esta notícia!

Comente

Faça login para introduzir o seu comentário.

Login

Cultura