Economia

Terras inóspitas transformadas em grandes extensões agrícolas

Joaquim Neto

Jornalista

Terrenos baldios e inóspitos há vários anos na província de Malanje, estão a ser transformados em grandes extensões agrícolas para a produção de enormes quantidades de alimentos.

21/05/2021  Última atualização 09H16
© Fotografia por: DR
Nos 14 municípios de Malanje estão a ser implementados, há cinco anos, o Programa Integrado de Agricultura Familiar orientado para o mercado, denominado Mosap I e II, que está a ensinar famílias, até então muito pobres e sem alternativas de sobrevivência,  filiadas em cooperativas agro-pecuárias e associações de camponeses, a produzirem alimentos para o consumo e o excedente para a comercialização em todo o país.

Financiado pelo Banco Mundial, em 80 milhões de dólares, o Mosap II está a treinar 32.681 famílias a produzir grandes quantidades de mandioca, batata-doce, batata-rena, milho, feijão, legumes e fruta diversa orientada para o mercado, criar caixas comunitárias, onde cada um dos agregados familiares deposita os recursos decorrentes da venda dos produtos, enquanto que escolas de campo, numa dinâmica inédita em Angola, ensinam as famílias a ler, escrever, contar e a produzir melhor e em pequenos lotes de terrenos, retirando deles, a maior rentabilidade produtiva possível.

Se no último quinquénio cada família produzia duas toneladas de mandioca em um hectar de terreno agricultável, em muitos casos, lavrados de forma rudimentar e manual, por falta de meios mecanizados, hoje colhe 10 toneladas, situação que transformou Malanje numa província auto-suficiente na produção do tubérculo.
Além disso, esta nova realidade, mudou a situação económico-financeira das famílias, que deixaram de depender dos fundos financeiros do Ministério da Agricultura, por via do Instituto de Desenvolvimento Agrário (IDA), entidade responsável pela organização dos ciclos de produção de três milhões de famílias que em Angola exercem a agricultura.

Produção em grande escala


Com o apoio do IDA, foi possível produzir 25 milhões de toneladas de mandioca, 20 milhões de toneladas de batata-rena, 33 milhões de toneladas de feijão e 23 milhões de toneladas de milho, dois últimos até então comercializados em pequena escala, por não fazerem parte dos hábitos alimentares do Planalto de Camabatela, tido como propício para a criação de gado para corte e produção de leite e seus derivados, esta ainda imberbe e pouco explorada.

Se Angola produz anualmente um milhão de toneladas de milho e necessita de 40 milhões de toneladas para atingir a auto-suficiência, a agricultura familiar em Malanje pode produzir 23 milhões de toneladas deste cereal todos os anos, cifra que pode aumentar para 100 milhões, caso sejam colocados à disposição dos camponeses pequenos equipamentos de regadio, entre valas e lagoas artificiais para a retenção da água das chuvas, bombas manejadas à pedal, máquinas para a lavoura dos terrenos e produtos fitossanitários, fertilizantes e correctivos de solos.

Perseguindo melhorar, no terreno, a assistência e aconselhamento técnico às famílias camponesas no meio rural em Malanje, o IDA, por via do Mosap II, está a desenvolver um conjunto de acções dirigidas à construção e a reabilitação de centros e serviços de apoio aos produtores para a transformação e armazenamento de produtos alimentares secos, como o milho e o feijão.

As aldeias Kinji, Kipacassa, Nhgia Kabanze, Kitwa Kifiquile Mutúmbwa, entre outras, anteriormente despovoadas, devido à insegurança e presença de minas, estão a registar um retorno massivo sem precedentes de famílias inteiras, apostadas em tornar Malanje auto-suficiente em alimentos e criar cinco mil postos de trabalho, principalmente para os jovens.
Assistência técnica

Do Cacuso ao Quela, em Xandele, última comuna de Malanje, em plena região da Baixa de Cassanje e desde as Quedas de Calandula à Marimba, região Songo, passando pela Serra de Tala Mungongo, entre planícies, depressões, vales e elevações, jovens agrónomos ao serviço do IDA calcorreiam estas localidades de carrinhas e motorizadas em mais de 450 quilómetros, todos os dias, para a prestação da indispensável assistência às famílias que, em grandes extensões de terrenos, completamente verdejantes, devido às grandes quantidades de chuvas, assumem-se como verdadeiros combatentes da linha da frente contra o subdesenvolvimento.
Elevadas quantidades de laranjeiras e mangueiras, com um período de dois a três anos de maturação, estão a ser distribuídas no seio das famílias dessas localidades, enquanto se perspectivam, a curto prazo, a distribuição de pequenos ruminantes, entre caprinos, suínos e aves, perseguindo um melhoramento da proteína animal e da dieta alimentar,  num esforço financeiro avaliado em 473 milhões de kwanzas, apenas no presente ano agrícola.

Com a criação de acções complementares direccionadas à construção de uma cadeia produtiva capaz de produzir, transformar e comercializar, Malanje pode, a curto prazo, transformar-se num potencial celeiro económico e produtivo do país, capacitando as famílias a produzirem com qualidade e quantidades suficientes para concorrer com outros mercados em África e no Mundo inteiro.

O coordenador do projecto Mosap II em Malanje, Paulo Sozinho, disse que a sua equipa dorme apenas duas horas por dia, com vista a apoiar as famílias cujas associações e co­operativas, distantes uma das outras, estão a transformar-se em pequenas empresas agrárias com fundos comunitários de capital circulante, nas respectivas caixas comunitárias, onde já conseguem obter entre cinco a 15 milhões de kwanzas.


O Governo de Malanje presta particular atenção à implementação do Mosap II e pretende que este seja um modelo para o desenvolvimento da agricultura familiar em Angola, enquanto equipas técnicas vão envolver-se na melhoria das vias secundárias e terciárias de ligação entre os grandes centros de produção e a sede da província.
As cerca de duas mil escolas de campo jogam um importante papel na transformação dos camponeses, na forma de produzir a terra, gestão dos respectivos processos de preparação de terras, lavouras e colheitas e delas retirarem auto-sustento e poderem caminhar independentes, sem necessidade de apoios externos, que quase nunca chegam, ou têm sido, na maior parte das vezes, bastante exíguos.
Do ponto de vista estratégico, diz Paulo Sozinho, os 109 técnicos agrários do Mosap II,  estão a treinar famílias de 30 comunas de Malanje, para as engajar num processo produtivo contínuo em três épocas de cultivo, onde se colhem duas vezes por cada safra,  feijão, batatas doce e rena, milho e feijão em sequeiro, mais dependentes das quedas pluviométricas e uma época de regadio.

O supervisor provincial do IDA em Malanje, Abreu Adão, há muito que trocou a Vila de Catete, de onde nasceu e se formou, para esta localidade onde, como disse, "desistir é a saída dos fracos e persistir, a alternativa dos fortes”, diante de todas as adversidades.

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