O Rei do Bailundo, Tchongolola Tchongonga, Ekuikui VI, disse, quinta-feira, no Palácio de Ferro, na Baixa de Luanda, que não existe no mundo nação forte que não tenha apostado na cultura do seu povo.
Ekuikui VI destacou a importância da cultura de um povo durante a III edição do Festival Balumuka - Baluarte da Música Angolana, uma iniciativa do Palácio de Ferro, que convidou o soberano para falar sobre a "Herança da Arte Musical e a Fábrica de Instrumentos de Músicas Ancestrais no Reino do Bailundo”.
Para o Rei Ekuikui VI, a arte é todo o conjunto de obras de vários artistas das diversas disciplinas artísticas, assim como considerou importante o convite feito pelo Palácio de Ferro para estar em Luanda, durante cinco dias, para prestar todo o seu saber sobre a importância da "Herança da Arte Musical e Fábrica de Instrumentos das Músicas Ancestrais no Reino do Bailundo”, que caminham muito rapidamente para a extinção.
Por Maio ser um mês especial, em que se celebra o dia do continente Berço da Humanidade, no dia 25, o Rei Tchongolola Tchongonga revelou que o Reino do Bailundo está a trabalhar arduamente para o resgate, preservação, valorização e divulgação "da nossa identidade cultural”.
Na óptica do Rei Ekuikui VI, toda a cultura que se fecha a si mesma desaparece. Disse, ainda, que as músicas que se ouvem em todo o território nacional é, com as devidas adaptações no tempo e no espaço, fruto da cultura ancestral, que traz consigo um sinal de pertença, de união e de paz interior, capaz de juntar indivíduos desavindos há anos através das suas músicas e danças.
Durante muitos anos, explica, a música e os seus instrumentos ancestrais estavam inanimados, desde 1482, serviam apenas como algo exótico para apresentar aos dominadores, para em 1975, o ano da Independência Nacional, começar a ser recuperada, mas o rei afirma que a guerra civil, que durou quase quatro décadas, impediu a sua progressão, que a sua divulgação se tornasse uma expressão cultural a que todos almejavam.
Avançou que essa força cultural da música e dos seus instrumentos ganhou alguma visibilidade fora dos museus com a conquista da Paz, no dia 4 de Abril de 2002, o Dia da Paz e da Reconciliação Nacional, pondo fim a uma longa e dolorosa guerra civil, que se tinha prolongado de 1975 a 2002.
A maior parte dos instrumentos musicais do Reino do Bailundo, confessou, desapareceu, restando apenas algumas poucas ferramentas de canto a destacar os principais utensílios da musicalidade dos povos do Bailundo, como o batuque, instrumento que é usado em todas as etnias de Angola.
Para o orador, muitos desses instrumentos desapareceram pura e simplesmente e outros foram retirados forçosamente e colocados na prateleira do misticismo, do feiticismo, por calúnia do colono, sublinhando que quem tocasse o batuque atraía demónios.
Defendia o colonialista que o que não atraía demónios eram os instrumentos vindos da civilização ocidental, que tinham notas musicais cuja sonoridade trazia elevação espiritual e alegria para as pessoas, ao contrário do batuque e de outros instrumentos musicais autóctones, que eram instrumentos do diabo.
O que se pretendia era dominar os povos despojando-os dos seus valores culturais ancestrais e inculcar-lhes à força a dita civilização ocidental.
De acordo com o Rei Ekuikui VI, não se usa a instrumentalização sem usar a música e as nossas danças tradicionais.
Apesar do grande esforço feito pelos europeus para despojar os angolanos, em particular, e os africanos, em geral, dos seus instrumentos musicais e das suas danças identitárias, o Rei Tchongolola Tchongonga disse que vários desses instrumentos musicais, assim como algumas dessas ferramentas e danças, foram transportadas pelos escravos ao Brasil e um pouco por todo o continente americano, onde os afro-descendentes fizeram questão de preservar e divulgar estas manifestações culturais.
A capoeira no Brasil e o Jazz nos Estados Unidos, primeiro, e hoje um pouco por todo o mundo, são alguns dos exemplos disso apontados pelo Rei do Bailundo.
Hoje, disse, somos a V geração, mas ainda com problemas sérios para divulgar a nossa cultura, tendo em conta a globalização. "Ainda há quem pense que tudo o que é nosso é mau aos olhos dos outros, como dizia o colono”, lamentou Ekuikui VI, defendendo o fim de todos esses complexos de inferioridade, que foram criados por quem tinha como missão primeira subjugar por intermédio da aniquilação dos valores culturais dos povos.
Valorizar os nossos nomes
Outra preocupação do Rei Ekuikui VI é a de trazer de volta a importância dos "nossos nomes, das nossas línguas maternas, da nossa medicina natural e da nossa gastronomia”.
Disse com satisfação que Luanda já se começa a tornar um palco importante de defesa dos valores culturais, "onde já se exalta a nossa ancestralidade”. É um caso que já vinha de algum tempo, quando os guerrilheiros saíram das matas, dando a si mesmos e aos filhos nomes de reis que lutaram contra a ocupação estrangeira, fenómeno que foi afrouxando com a globalização.
Ekuikui VI observou que esta era a primeira vez que um rei se levantava "para falar sobre a importância da nossa ancestralidade”, defendendo que actividades do género não podem acontecer só em Maio, por ser o mês em que se celebra o Dia de África. Este deve ser um exercício permanente, para reavivar nos mais jovens que este país, que se quer nação, tem um presente, um passado e quer construir o futuro com todos esses ricos ingredientes legados pelos ancestrais.
O Rei Ekuikui VI reafirmou que o que é nosso precisa de ser divulgado e preservado primeiro por nós, porque ninguém vai fazer o melhor para nós, sobretudo o que tem a ver com a nossa cultura.
O Rei do Bailundo, Ekuikui VI, revelou que nos povos ovimbundu existem quatro elementos musicais, que são o ritmo, a melodia, a harmonia e o timbre, que hoje podem ser encontrados em perfeita harmonia nos cantares dos cantores e compositores Bessa Teixeira e Justino Handanga, este último falecido em Março, em Luanda, aos 56 anos.
Para o Rei Ekuikui VI, a música é um dos principais elementos da cultura angolana, porque traz consigo o ser e o sentir dos povos e estudos revelam que na pré-história já se produzia música, mesmo com instrumentos muito rústicos como o chifre de animais e o tilintar de pedras. Naquela época, a música já era uma grande maravilha para o ser humano, disse.
Na sua aula magna, o Rei Ekuikui VI disse que "nunca devemos aceitar que a nossa música só atrai demónios. Nem a religião pode tirar aquilo que é muito importante na nossa cultura”.
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