Sociedade

Recolha de lixo “porta a porta” deixa mais limpa a cidade do Lubango

Arão Martins | Lubango

Jornalista

Com recurso a motorizadas basculantes de três rodas, vulgo “Kaleluia”, o novo modelo de recolha de resíduos sólidos “porta a porta” deixa a cidade do Lubango, capital da província da Huíla, cada vez mais limpa.

21/01/2021  Última atualização 10H16
© Fotografia por: Arão Martins | Edições Novembro – Huíla
O projecto abrange os 17 bairros do município sede, incluindo o único bloco habitado da centralidade da Quilemba.
A nível do Lubango, foram distribuídas 98 motorizadas aos antigos combatentes e veteranos da pátria, jovens empre-endedores, associados e outros escolhidos pelas comunidades dos respectivos bairros, com o objectivo de criar novas oportunidades de emprego. A iniciativa permitiu criar mais de 250 empregos directos.

Obadias Belchas, 17 anos, morador do bairro Comercial, na zona urbana, acorda, às 4h00, para os habituais exercícios físicos. Mas antes de sair de casa recolhe o lixo produzido no dia anterior, e coloca tudo num saco plástico, que deixa junto à porta, para depois ser recolhido pelos transportadores de lixo.

O jovem, que antes depositava os resíduos sólidos num contentor, a dois quilómetros da sua residência, está satisfeito com o novo modelo de recolha implementado pelo Governo Provincial da Huíla, e sobretudo com a dinâmica empreendida pelos agora conhecidos como "caçadores” de lixo.

Com o domicílio localizado no bairro A Luta Continua, o professor António João sai de casa muito cedo, para dar aulas numa escola do município da Humpata, a 22 quilómetros da cidade do Lubango. Durante o percurso, fazia uma paragem obrigatória para descarregar o lixo recolhido da sua residência nos contentores, localizados ao longo da via.

O contentor mais próximo da residência de Martins Malaquias, de 50 anos, no bairro A Luta Continua, estava fixado a cerca de três quilómetros, e por isso não era fácil transportar o lixo produzido pelos 15 membros, dos quais oito filhos, que compõem a sua família. Mas agora o lixo é recolhido à porta de casa. Acabou o sofrimento.

Nalamele Malaquias, a esposa de Martins, que também é professora, destacou que o novo modelo de recolha acabou com as discussões sobre quem deve levar o lixo ao contentor, que ficava muito distante de casa.
"Os senhores que recolhem o lixo estão a fazer um grande trabalho. Se por algum motivo não tivermos o portão aberto, eles buzinam, batem no portão ou anunciam a sua chegada em voz alta”, disse, acrescentando que no acto da entrega dos resíduos sólidos, os trabalhadores exigem o uso da máscara e pedem que a varredura esteja organizada em sacos plásticos.
"Caçadores actuam  de madrugada

Na companhia do seu ajudante, António Fina, 65 anos, que tem a perna esquerda amputada, accionou uma mina anti-pessoal durante o conflito armado, depois de ver os sacos de lixo colocados no chão, estacionou a motorizada bem defronte ao portão da residência da dona Domingas Pio, no bairro Dr. António Agostinho Neto.

António faz parte do grupo de quatro indivíduos que beneficiou, em nome dos Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria, de uma motorizada para a recolha de lixo nos bairros do Lubango. Devido à sua condição física, fez uma adaptação ao motociclo. Colocou uma alavanca de ferro na embraiagem.

O ancião, que tem uma carta de condução que o habilita a conduzir veículos pesados, ligeiros e motociclos, defende a intensificação de acções de sensibilização às famílias, no sentido de aderirem ao programa de recolha de lixo "porta a porta”, por ser mais seguro e eficiente.

Antigo técnico de operações das ex-Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (ex-FAPLA), integrou os trabalhos de recolha de lixo  em Julho do ano passado, no âmbito de um projecto que abrangeu os Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria, percorre, diariamente, mais de 200 quilómetros para recolher o lixo produzido por um total de 108 moradores, nos bairros A Luta Continua e Dr. António Agostinho Neto.

"Quando pensava que era inútil, fui integrado neste projecto, para a minha satisfação e de toda a família”, disse, para de seguida reclamar da falta de luvas. De acordo com António Fina, nos sacos colocam cacos de garrafa, ferros e outros objectos cortantes que podem causar ferimentos nas mãos, e por isso torna-se perigoso manusear o lixo sem luvas.

 "Por uma questão de higiene e segurança, os resíduos sólidos devem ser acondicionados em sacos, de preferência de 50 quilogramas”, disse o transportador Caveto Paiva. Quem também actua ao volante de uma "Kaleluia” é Guilherme Tyissukila. O jovem de 28 anos, que trabalha das 5h30 às 12h00, atende um total de 270 moradias, nos bairros Santo António e Comercial.

Outro "caçador” de lixo responde pelo nome de João Madeira, que actua a partir das 4h00, nas ruas 4 de Fevereiro e Laureanos, no bairro Lucrécia. Ele pisa fundo no acelerador. Está sempre apressado. "Tenho muitas casas para atender. Por isso devo mesmo me despachar”, disse, ao Jornal de Angola, para lamentar o comportamento das pessoas que, sem estarem abrangidas no processo, colocam o lixo defronte ao portão de quem tem um contrato válido.

Os moradores (clientes) pagam 200 kwanzas por semana ou 800 kwanzas por mês. Cada um dos "transportadores de lixo” actua em nome da organização em que está filiado, para a realização do trabalho, e ganham por percentagem do valor total arrecadado durante o mês.


 Qualidade do trabalho

O director municipal do Ambiente e Saneamento Básico do Lubango, Venâncio Ukuahamba, explicou que a recolha de resíduos sólidos "porta a porta”, que ocorre em todos os bairros da sede provincial da Huíla, é feita em cadeia, e inclui, também, camiões compactadores e tractores.

"Temos encontrado algumas barreiras, por parte de alguns moradores, que não querem pagar a taxa do lixo, porque alegam que a mesma já está indexada na factura da água. Isso é algo completamente diferente, na medida em que o aludido valor resulta do facto de que o cidadão, por norma, produz lixo”, aclarou.

Venâncio Ukuahamba disse que o serviço de recolha "porta a porta” não é de carácter obrigatório. Avançou que a administração municipal funciona, actualmente, com cinco ca-miões compactadores, e cada um dos veículos tem uma rota com 10 a 12 pontos de recolha de lixo.

Assegurou que a Administração Municipal do Lubango faz apenas a monitorização do processo de recolha, estando isenta das cobranças resultantes desse trabalho. "A maior parte dos contentores foi removido no âmbito dessa nova estratégia. A recolha é interrompida aos fins-de-semana, período em que as famílias produzem mais lixo”, disse.


Aterro sanitário


No âmbito do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), a Administração Municipal do Lubango aplica mais de 370 milhões de kwanzas na reabilitação e ampliação do aterro sanitário do Luyovo, numa acção que inclui a criação de uma nova célula de concentrado de lixo.

A acção, segundo Venâncio Ukuahamba, permite renovar a capacidade de acondicionamento dos resíduos sólidos. "Este ano, o saneamento básico e a gestão dos resíduos sólidos vão continuar a merecer a devida atenção da Administração Municipal do Lubango, garantiu o administrador Armando Vieira, que apesar de reconhecer que em vários momentos as condições materiais e salariais não estiveram à altura, "mesmo assim, houve dedicação e empenho de todos”.

"Não obstante aos constrangimentos, pretendemos aprimorar os métodos de limpeza e recolha do lixo,  de formas a continuarmos a manter a cidade mais limpa que nos anos anteriores”, afirmou.  
Lubango conta com uma população estimada em mais de 900 mil habitantes e uma área territorial de 3.147 quilómetros quadrados.

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