A secretária-geral da Organização da Mulher Angolana (OMA), Joana Tomás, esteve recentemente em visita às províncias do Bié e Cuando Cubango, no âmbito de um projecto denominado “Roteiro Kudima”, e o que saltou à vista, de modo particular, foram as dificuldades que as cooperativas agrícolas enfrentam, umas mais que outras, para levar a bom porto os seus negócios.
Ainda que passe despercebida, por muitas pessoas e organizações, a confiança é a base das suas próprias existências e relações com terceiros. Quem não confia em ninguém, paralisa, isso é, tentará, em vão, fazer sozinho tudo que a vida humana exige ou estará eternamente inseguro e votado ao fracasso.
Nós os portugueses damos muitos nomes à mesma coisa, ouvi confessar esta semana uma senhora cozinheira das redes sociais. A mim só restou concordar com o verbo da camarada, sem estar de acordo com tal extravagância semântica, passível mesmo de contornos diplomáticos (aqui, note-se, não necessariamente institucional. Não diziam que o ser humano é um bicho político? Ora pois, se da minha vida cuido eu, logo diplomata sou, passe o à parte).
Vejamos uma coisa. O cidadão que acosta um restaurante, corpo vestido de fome, estômago engomado, faz o quê senão declamar a arquitectura do menu, linha a linha, preço a preço?
Definitivamente, nestas horas o ser humano é rendido às evidências. Aquilo de despender tempo a folhear a ementa e caprichar na escolha do comer e do beber...é vaidade existencial. Na hora da verdade, é correr os olhos para a nomenclatura da comida mais chegada às nossas memórias caseiras. Haverá algo mais materno do que um bom arroz com feijão (como dizemos na banda), qualquer que seja a proteína líder? Nem tente o célebre bitoque fazer-lhe sombra!
Preâmbulos à parte, disparei o pedido. Peixinhos da horta fritos com arroz de feijão, se faz favor! Enquanto esperava, aquele debate dentro da cabeça de um indivíduo na esfera dos bons hábitos alimentares. É verdade que, lá na banda, a pessoa nunca ia pedir frituras. Mas sabe como é que é. Epá, se calhar não vale a pena exigir muito em terra alheia. Fritura de um dia só também não é o que nos vai arruinar a tal saúde. Até porque um bom peixinho cai sempre bem, de preferência apanhado no mar, em todo o caso o de criação também dá.
Só que não tarda outra auto-censura de praxe. Quem te viu e quem te vê, irmão mwangolê! Logo tu que nunca queres saber de tilápia (cacusso). Aqui estás a pedir peixinhos da horta, gula é gula? Assim no regresso à banda fica como? Afinal comes ou não? Perguntas de retórica, pá! O outro lado manda abafar o inconveniente raciocínio, o que não falta é smartphone para inventar distracção. Tema desviado com sucesso. Venha a comida e nos salve!
A eficiência do garçom, brasileiro, jovem de orelhas com furos que davam para alojar sem esforço um parafuso catorze, é supersónica. Já? Sim, senhor. Não foi muito rápido? Não senhor, é dentro do seu tempo, senhor. Muito bem, sendo assim fico contente! A boca, qual cachorro de Pavlov, é albufeira, tal é a água do desejo enquanto as mãos fazem festinhas aos talheres.
E o prometido arroz de feijão vem de facto ao que se propunha. O peixe é que não. Mas espera aí, ó jovem! Diga, senhor. Quer dizer que a vagem de feijão verde (quando passa por óleo quente feito panado em rastos de ovo) vira peixinho? Da horta, é o nome do prato, senhor. E há comprovação científica? Bem, só a minha gerente poderia dizer, senhor. Vocês então ponham-se a pau, murmuro eu, desavenças diplomáticas já espoletaram por bem menos.
Aí é só já comer, vamos fazer mais como?!Quem manda não desconfiar, desde logo pela ausência de conterrâneos nossos ali no sítio àquela hora sagrada? E tem de ser rápido, que há documento a levantar agora no período da tarde, o atendimento fecha antes das quatro.
Finalmente o cidadão que vos fala é acolhido na sala de espera do primeiro andar, a terceira e penúltima etapa das camadas de uma triagem que começa na portaria, passa pelo ponto de rastreio com Raio X, segue pelo guichet de senhas alfa-numéricas, faz escala na sala maior do rés-do-chão e vai culminar (Deus queira, é a impressão ansiosa que paira) na tesouraria.
A instituição, em Alcântara plantada, desdobra-se a responder muitas frentes, não evitando a sensação de marcha lenta para uma série de senhas. E quando assim é, solidariamente os desfavorecidos da vez rabujam porque, convenhamos, a vocação de aguardar sem controlar a situação é contra natura(se nem na cama o ser humano se alegra com esperas incertas).
Mas essa moça que estão a atender não chegou agora?!, condena uma mulher. Acho que não, responde um senhor na casa dos cinquenta, entretido na tela do seu telefone com jogatanas. Essa moça chegou agora, já me encontrou, juro! Acho que não, só que está no entra e sai. Esses são mesmo assim, ficam a passar conhecidos à frente. Assim já é parente de alguém, já lhes conheço; por isso é que a nossa terra não melhora; até aqui trazemos os nossos hábitos de filhos desse e filhos daquele. Já não chega a pessoa suportar o frio e aquele segurança chato da Guiné-Bissau no Consulado do meu próprio país?! Monólogo crescente, adesão abaixo de zero.
O inverno lá fora toma forma de água corrente em jactos celestiais. Tudo o que cada pessoa quer é ser atendida e ir à sua vida. Há quem não tenha escolha a não ser enfrentar as ásperas temperaturas do posto de trabalho, o praguejado guarda, sotaque guineense. É? Longe de mim arriscar duas vezes. Já me basta a argolada naquela inesquecível abertura do ano académico quando o bom do Domingos Alberto, doutorando na Católica, notando-me acanhado, tomou a iniciativa de socializar. És da Guiné, mano? Xé!, mano, porquê?! Sou angolano!
Agora entra um casal com bebé ao colo. A prioridade nem é sequer motivo de debate, visível que é a condição invisual da esposa. É uma das irmãs Honrado, exemplo de superação na província de Benguela onde se destacaram na transição entre finais dos anos 90 e 2010, não só pelas dedicatórias e brindes musicais nas rádios, porém pela licenciatura em psicologia.
As senhas vão a caminho de incendiar as mãos secas. A chamada mesmo, que é boa, essa, nem quase. Outro casal entra com bebé ao peito. O pai, estatura média, músculos emprestados de ginásio, aparenta menos de vinte anos. A mãe, franzina, frágil, baixinha, remete ao cenário de INAC (Instituto Nacional da Criança). A bebé indispõe-se naquele ambiente.
Moça, hoje é aquele dia que as nossas bebés decidem embirrar, né? Volta a monopolizar a palavra a cidadã-vigia. Sim, hoje acordou chatinha. Será do dente? Eu até não sei, e não quer xuxar. Faz o seguinte, vai lá mesmo no balcão, exige prioridade. Será? Acho que vou só esperar. Esperar o quê?! Vai lá, mi’rmã. O casalito hesita, mas a outra não cede no paternalismo.
O monólogo volta a estender-se em maternidade. A generosa conselheira a rondar os quarenta anos enfatiza quão diferentes os bebés chegam a ser, mesmo filhos do mesmo casal. A dado momento, a menina-mãe, agradecida, confirma a experiência. A sua primeira filha, diz ela, agora com três anos, era mais quietinha que a irmã. Disfarçar o impacto da surpresa não podia ser mais impossível. No final tudo acaba em bem. Da minha parte, o cartão consular já canta.
Experiências de imigrante são infindáveis, a começar pela estafante caça ao alojamento em cidades capitais como a lusa. Odivelas acabou por me amparar durante dois meses, em quarto arrendado no apartamento de um conterrâneo nosso. Era a saída possível, insustentáveis que iam as diárias de hospedaria e o amontoado de chumbos na candidatura aos anúncios nas plataformas digitais, a pardas fintas dos intermediários. É como se o ecossistema imobiliário não estivesse virado para arrendar a estrangeiros, quanto mais africano do tipo suspeito-padrão.
Assim sendo, a rotina casa-escola passou a depender do comboio sofisticado chamado metro, numa corrida de quase meia hora e umas seis paragens pelo meio, se tanto. Tão compacto Portugal é que tudo parece distante, a ponto de caminhar quatro quilómetros a pé ser um tabu. Foi nesta circunstância que conheci o benguelense Rafael Nangayafina, também ele estudante.
Depois de nos avistarmos na estação da Cidade Universitária, devidamente mudos um para com outro ao abrigo da construção social ocidental de não saudar desconhecidos, voltamos a pôr em marcha o mesmo avanço civilizacional chamado indiferença. Isso deu-se já num café dias mais tarde em Odivelas. Até que numa terceira vez, enquanto eu aguardava na fila do churrasco, o bom do jurista tomou a liberdade de estender a ponte. Qual não foi a agradável surpresa em saber que até havíamos crescido em bairros vizinhos no Lobito.
Já nem falo do prestativo Bernardo Bumba, irmão mais velho do antigo compositor do MB Genius, o Hendrick. O mano Nado marca-me pelo seu papel desinteressado de cônsul angolano em matérias de ajudar conterrâneos a se pautarem pelo caminho da legalidade. A ele devo toda a lucidez necessária para a obtenção do NIS e, já agora, da vacina contra a gripe, naquilo que se anunciava vir a ser o terceiro inverno mais frio da história de Lisboa.
Lisboa,
28 Junho de 2023
Gociante
Patissa
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