O presidente da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), Dom José Manuel Imbamba, reconheceu, sábado, no município de Caungula, província da Lunda-Norte, que ao longo dos 22 anos de paz e reconciliação nacional, o país conseguiu alavancar muita coisa, mediante à criação de boas infra-estruturas, tendo apontado a ausência da construção da mentalidade humana como o “elo mais fraco“ nesta importante caminhada para a construção integral da vida dos angolanos.
O arcebispo católico sublinhou que o desenvolvimento deve ser fruto de uma justiça social equitativa, que promova, essencialmente, o bem-estar e o progresso, visando o cresimento com incentivo ao mérito
O secretário de Estado da Comunicação Social apelou à juventude angolana, de Cabinda ao Cunene, para associar a determinação e comprometimento exemplar dos grandes nacionalistas à vocação solidária, voluntária e cidadã que constitui a maior riqueza do capital humano angolano na actualidade.
Nuno dos Anjos Caldas Albino defendeu, sexta-feira, no Arquivo Nacional, em Luanda, na abertura da palestra "A Luta de Libertação Nacional e o Papel Central de Cónego Manuel das Neves”, organizada pelo Jornal Angolano de Artes e Letras "CULTURA”, título da Edições Novembro.
"Esta iniciativa reporta acontecimentos de grande simbolismo na História de Angola, constituindo um espaço privilegiado de reflexão em torno do grande projecto da nação, independência, unidade nacional, paz e progresso social e que tem a juventude no centro da sua aspiração e concretização”, sublinhou.
Num discurso virado para a juventude, Nuno dos Anjos Caldas Albino apontou que esta franja da sociedade espelha, por natureza própria, um manancial de oportunidades e habilidades, razão pela qual, e não raras vezes, é comum afirmar-se que a juventude representa para qualquer país a sua força motriz, constituindo a principal mola impulsionadora das transformações políticas, socio-económicas e culturais.
"É fundamental contribuir para a divulgação da história e enaltecer os valores patrióticos através da comunidade académica, investigadores e sobretudo aos jovens, que são os continuadores das grandes conquistas e vitórias do povo angolano. Nos orgulhamos pelo facto de, quando palmilhamos os cantos desta bela Angola, encontramos jovens, no campo e na cidade, arduamente engajados na edificação da nação”, destacou.
Sobre o simbolismo da data histórica que hoje se assinala, o secretário de Estado recordou que no dia 4 de Fevereiro de 1961, um grupo de angolanos, imbuídos dos ideais de liberdade, marchou contra as prisões do poder colonial, dando início à luta armada de libertação, que culminou com a proclamação da independência nacional, a 11 de Novembro de 1975.
"Por isso, hoje desfrutamos de um país livre e soberano. Debates sobre a história são importantes, uma ferramenta que sem a qual corremos o risco de andar à deriva e repetirmos os mesmos erros das gerações que nos antecederam”, concluiu.
Durante mais de duas horas, o historiador português José Manuel da Silveira Lopes abordou o grande papel de Cónego Manuel das Neves nas acções que culminaram com a revolta no dia 4 de Fevereiro de 1961. O palestrante sublinhou haver muito sobre os factos históricos dessa época que devem merecer a atenção de investigadores angolanos desta área.
"Tem muitos arquivos autênticos em Portugal, que permitem fazer leituras muito próximas daquilo que foi a realidade da época. É muito provável que Cónego Manuel das Neves tivesse consciência das dificuldades dos êxitos destas acções heroicas”, apontou. Das suas pesquisas aos arquivos da então Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE), resultou em dois livros que foram vendidos e autografados pela primeira vez em Angola na tarde de ontem, respectivamente”O Cónego Manuel das Neves – Um Nacionalista Angolano (Ensaio de Biografia Política)”, lançado em 2017, e "Lutem Até Alcançarem a Liberdade”, de 2021.
Com uma assistência constituída por individualidades das várias áreas do saber, da religião à política, bem como figuras de destaque das ciências sociais, o debate à volta do tema foi caloroso.
A historiadora Rosa Cruz e Silva lamentou que infelizmente se pensa que os historiadores angolanos ainda não estão a trabalhar e reconheceu ser justo que sejam muito cobrados pela sociedade para que surjam mais trabalhos de pesquisa. Por outro lado, no que toca à sua percepção sobre as fontes históricas usadas pelo palestrante, referiu haver outras que permitiriam outras leituras dos acontecimentos.
"Mas já há algum conhecimento das fontes escritas da PIDE e outros arquivos. Me parece que há mais propensão para a credibilidade das fontes da PIDE do que daqueles documentos que são originários dos protagonistas. Alguns são documentos que a PIDE levou dos nacionalistas. Me parece que há passagens que deveriam ser cruzadas com outras informações que não sejam apenas da posse da PIDE mas de outros participantes do processo, teríamos tido outras leituras”, sugeriu.
Rosa Cruz e Silva apelou a todos os historiadores angolano para que se dê importância não apenas aos documentos produzidos ou tomados pela PIDE, mas também aos documentos que foram produzidos pelos protagonistas dos movimentos de libertação.
Já o antropólogo Virgílio Coelho definiu que Conégo Manuel das Neves foi um grande homem, com uma perspectiva própria. Quanto ao evento, referiu que a iniciativa deve continuar, visto que proporciona momentos ímpares e permite dar voz a testemunhas oculares deste processo.
"Infelizmente as fontes consultadas são apenas da PIDE, quando temos aqui gente ainda viva que participou neste processo, como o nacionalista Salvador Sebastião. Eu acredito que aquelas pessoas que se dedicam à história do período contemporâneo, devem ouvir estas fontes vivas”, disse.
Familiares de Cónego Manuel das Neves presentes na conferência
Membros da família do Cónego Manuel das Neves também se fizeram presentes, manifestando a necessidade de entender sobre os feitos do seu parente na luta de libertação dos angolanos contra o sistema colonial.
António das Neves, disse, em declarações ao Jornal de Angola, que o nacionalista Cónego Manuel das Neves foi tio de seu pai. Contava apenas seis anos de idade quando o seu avô, a pessoa que melhor domina a história da família e os acontecimentos que envolviam o cónego. Segundo afirmou, a família tem esperado por encontros que visem esclarecer com pesquisa académica quem foi o cónego e o seu papel na história de Angola.
"Queremos agradecer o gesto da Edições de Novembro, que apesar de fazermos algumas investigações, hoje estivemos ao lado de pessoas que estiveram directamente com o nosso parente e fizeram um contra verso da realidade da luta da libertação armada, na qual o cónego Manuel das Neves foi um batalhador incansável para a libertação do povo angolano”, disse.
Professor de História da Escola Superior Pedagógica do Bengo, Pedro Capumba enalteceu a conferência, por ser um retratar o percurso do patrono da luta para a emancipação dos angolanos e o seu encaminhamento para a luta armada. Segundo defende, Cónego Manuel das Neves é parte fundamental deste processo, quer da consciencialização e da organização, quer da luta para a libertação nacional.
"Esta data se reveste de extrema importância, principalmente para conhecimento dos estudantes, para os níveis de base, secundário e ensino superior, para que se dignifiquem efetivamente a dimensão das pessoas que fizeram parte da história sobre a luta da libertação de Angola moderna”, realçou.
Durante o encontro, o professor do Instituto Superior de Ciências da Educação (ISCED), João Baptista Lukombo, disse que a célebre figura de Cónego Manuel das Neves, ao desempenhar um papel preponderante no dia 4 de Fevereiro de 1961, merece ser sempre prestigiada e reconhecida pelos feitos realizados em prol da Nação. Pois, a seu ver, o 4 de Fevereiro representa um dos momentos mais importantes no combate pela Independência do país.
"Os heróis nacionais marcaram-nos, doaram um pouco de si pelos outros, por isso recebem este título, e devem inspirar-nos na nossa forma de ser e agir como filhos da Nação angolana”, ressaltou.
Alguns alunos de História do ISCED de Luanda também deixaram, por via de testemunhos, algumas palavras de apreço em honra a Cónego Manuel das Neves, e, igualmente, aos outros heróis nacionais que nos legaram como herança "as boas lembranças” do 4 de Fevereiro, que é, desde então, um dia especial e de várias comemorações para o Estado angolano.
João Andrade Mutumbua, estudante do 4º ano, destacou que Cónego Manuel das Neves é a alta figura na luta de libertação de Angola "pois, sua mente guerreira, serviu de exemplo para todos os outros que se seguiram”.
"Manuel das Neves não foi um guerrilheiro, mas sua determinação e incentivo aos jovens da época, sobretudo aos ligados à União das Populações de Angola (UPA), foram imprescindíveis para esse grande passo”, reconheceu.
Por outro lado, o estudante Gabriel Alfredo Martins decidiu adjectivar Manuel das Neves como um "verdadeiro líder”, que soube andar e influenciar as pessoas certas na busca pela Independência, e o primeiro indício dessa liderança, disse, foi o ataque à cadeia da sétima esquadra da polícia, a sede dos Correios de Luanda, na intenção de libertar vários angolanos presos injustamente.
O evento enquadrou-se num amplo programa organizado pela administração da Edições Novembro, proprietária do Jornal de Angola, Cultura, Economia & Finanças, Desportos, entre outros, que visa à realização de conferências nas áreas de especialidade dos jornais, de modo a ampliar os espaços de debate.
Alunos do segundo ciclo aprendem sobre História
O professor de História do Colégio Pitruca, Vasco Afonso, manifestou um enorme respeito pela emblemática figura do nacionalista Cónego Manuel das Neves, que, para ele, é dos maiores patriotas que Angola já teve e cujo protagonismo na História do país deve ser sempre inquestionável.
"Todo o percurso tem um início, e, no nosso, Manuel das Neves foi fundamental. Tal como outros nacionalistas, ele nunca deve ser esquecido”, afirmou.
O professor declarou, ainda, que essa actividade foi uma oportunidade para expandir o conhecimento dos seus alunos relativamente à História de Angola.
"Quando eu, junto da direcção do colégio Pitruca vimos a publicidade do evento, decidimos logo participar, porque soubemos que seria memorável para os alunos deste ciclo”, reconheceu.
Satisfeitas, algumas alunas do segundo ciclo no colégio Pitruca, como foi o caso de Carla Garcia e de Deultícia Abrão declararam ter sido a primeira vez a ter contacto com a história do dia 4 de Fevereiro neste formato, e agradeceram a organização pela iniciativa, pois, para elas, é uma forma de passar as ferramentas chaves da História de Angola, para que realmente se sintam integradas como parte da Nação angolana.
"Aprendi muito. Já sabia que o 4 de Fevereiro marca o início da Luta Armada, mas nesta palestra pude aprender mais coisas, como a revolta da Baixa de Cassanji e algumas figuras que participaram neste processo e que ainda estão vivas. Acho que deveríamos estudar mais a História do nosso continente e não nos basearmos na história dos outros”, disse a estudante Carla Garcia.
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