Opinião

O que custou da liberdade

Carlos Calongo

Jornalista

Pelos acontecimentos dos últimos dias podemos admitir que o ambiente político doméstico está em estágio de efervescência, situação que obriga dos seus agentes activos, o exercício de alguma racionalidade e ponderação na decisão das questões apontadas como razões dos problemas, que marcam a actualidade.

06/02/2021  Última atualização 12H40
Em síntese, os factos que deixam a política nacional em estado de ebulição recaem sobre as ocorrências na localidade de Cafunfo, as manifestações em Luanda, a destituição de André Mendes de Carvalho "Miau” do cargo de presidente da CASA-CE e, coincidência ou não, o futuro político de Abel Chivukuku.

Conferindo razão aos filósofos que desacreditam em coincidências na política, terá algum sentido acreditar que esteja em marcha uma estratégia política concertada, motivada pelo desejo de desvalorizar as datas históricas, sobretudo àquelas em que o protagonismo recai para militantes do MPLA?

Salvaguardando as hipóteses mais reais que as atrás avançadas, não é muito avisado ignorar a possibilidade de existência de uma linha de interpretação que ajuda a compreender as ocorrências a 11 de Novembro e 10 de Dezembro do ano de 2020, dias da Independência Nacional e da Fundação do MPLA, respectivamente, e agora, em vésperas do 60º aniversário do início da luta armada de libertação nacional.

Nada do acima escrito serve como elemento de defesa ou acusação desta ou daquela instituição ou prática porquanto, tão grave como os excessos verificados nas referidas acções, são os comentários expressos sem o mínimo senso de razoabilidade, com pendor de ajudar a pacificar os ânimos. Neste andar das coisas observamos, com preocupação, o emergir de uma classe que alicerça o modo de operação na cristalização da suspeição por quase tudo e mais alguma coisa em torno de um facto social, sobretudo os que envolvem agentes da administração do Estado ou outra instituição pela qual se nutre visível abominação.

É assinalável a existência de grosseira incontinência verbal que, bem analisada, pode ser considerada factor de força contra o propalado Estado Democrático de Direito, evocado quando a sua fartura convém, de modo unilateral, sendo a operação inversa, utópica verdade. Parece-nos estar instituído um novo paradigma de comentários fundado em um módulo pré - concebido, sendo escusado ou até mesmo oco, qualquer exercício de tentar inverter as posições, pois os "algozes”, na eventualidade de terem razão nos seus actos, recebem como conforto, e apenas isso mesmo, o conselho para adoptar como postura, o diálogo.

Para as "vítimas”, apresentadas sempre como coitadinhos, inocentes e indefesos, as respostas são sempre desproporcionais, e só não roçam ao genocídio porque a verdade, por mais omissa e ínfima que seja, dá sempre o ar da sua graça triunfal, ao som do latir dos cães, ante a passagem da caravana.

É bom recordar que arremessos verbais encapuçados em velados sentimentos de ódio desfavorecem os desígnios da construção de uma Nação pacificada, quanto mais não fosse esta, baptizada como uma longa-metragem com bastantes cenas de mágoa, sangue, guerra, mortes e um conjunto de males que atrasaram, em largas dezenas de anos, o crescimento e desenvolvimento de Angola.
O emergente exército de "opinion maker” a que se juntam os pseudo-tarimbados - em quê, não dizem -, exibem-se como ancorados numa frenética expressão da crítica pela crítica, baseada no obscurantismo de vários compatriotas, exemplarmente explorados ao mesmo nível, ritmo e belo prazer, com direito à aplausos.

Não podemos deixar de referir que tais discursos, postos em marcha na mais indesejada perspectiva, podem deitar por terra as conquistas da longa trajectória de lutas e vitórias que, seguramente, orgulham os angolanos que, parafraseando o estrato de uma das mais emblemáticas canções de Rui Mingas sabem "o que custou a liberdade”.

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