Como olha hoje para a mulher angolana, de forma geral, tendo em conta o cenário internacional?

Vejo uma mulher resiliente, competente e dotada de capacidade inquestionável. Uma figura que me representa autenticamente e que, se provida de oportunidades adequadas, desempenhará um papel cada vez mais significativo no desenvolvimento da comunidade onde estiver inserida.

É essencial estarmos atentos à degradação dos valores por parte de algumas mulheres, cujas atitudes podem acabar por influenciar negativamente jovens e adolescentes. A degradação moral, o imediatismo e a exposição inadequada de algumas mulheres são questões preocupantes que requerem reflexão e acção consciente para preservar a integridade e promover modelos de comportamento positivos na sociedade.

Actualmente, Angola reconhece e valoriza o potencial da mulher angolana, investindo cada vez mais na sua capacitação. Consequentemente, torna-se mais evidente a presença e representação de mulheres angolanas em instituições internacionais, demonstrando o compromisso do país em promover a igualdade de oportunidades e o empoderamento feminino no cenário global.

E em Angola, como encara a inserção da mulher nas diversas áreas da sociedade?

Actualmente é perceptível o aumento significativo de oportunidades para as mulheres, que estão presentes em praticamente todas as esferas da sociedade. De forma inédita na história do nosso país, uma mulher ocupa o cargo de Vice-Presidente da República, outra preside à Assembleia Nacional, e ainda temos a primeira mulher na presidência do Tribunal Constitucional. Estes marcos são testemunhos eloquentes de como Angola valoriza e reconhece a competência feminina.

Almejo ver, no futuro, mulheres angolanas assumindo posições de liderança nas Forças Armadas, um sector onde sei que existem muitas profissionais competentes que, eventualmente, alcançarão altos cargos. Para que este cenário se concretize, é necessário o apoio de homens corajosos que compreendam que a colaboração com as mulheres é um sinal de força, não de fraqueza. Os homens devem apoiar as mulheres, reconhecendo que, juntos, somos mais fortes e capazes de construir uma sociedade mais equitativa e próspera.

Alguma vez se sentiu impedida, de alguma forma, por ser mulher?

Não! Nem em Angola, nem nos Estados Unidos.

Vamos falar agora do seu trabalho. De onde veio a paixão pelo jornalismo?

Da família?

A minha paixão pelo jornalismo não veio da família. Actualmente, sou a única profissional no jornalismo na minha família, contudo antecipo que futuras gerações seguirão este caminho, a exemplo da minha filha mais velha, que já iniciou a sua jornada na carreira jornalística.

O meu interesse pelo jornalismo emergiu de maneira espontânea. A admissão no curso de jornalismo no Instituto Médio de Economia de Luanda (IMEL) aconteceu por mero acaso, o meu nome foi seleccionado para este curso, e não tive alternativa: era fazer o curso de jornalismo ou adiar a minha formação académica para o ano seguinte, com a esperança de ingressar no curso de Economia. No entanto, já no primeiro ano, desenvolvi uma profunda paixão pelo jornalismo, atraída pelo dinamismo e pela profundidade da profissão. Esse interesse inicial motivou-me a buscar oportunidades de estágio desde cedo, marcando o início da minha carreira.

Como concilia o jornalismo com a família, sabendo que, além de muito exigente, esta profissão ocupa muito tempo?

Embora o percurso seja desafiador, o suporte incondicional da minha família tem sido um factor crucial para superar as dificuldades. A carreira jornalística é, por natureza, extremamente exigente e demanda uma dedicação intensa, tornando a conciliação com a vida familiar uma tarefa complexa. Entretanto, com o apoio não apenas dos familiares, mas sobretudo das minhas filhas, tem sido possível conciliar e manejar esses desafios de maneira eficaz.

Um dos obstáculos mais significativos reside no sacrifício do tempo que poderia ser dedicado às minhas filhas, em função das responsabilidades profissionais. No entanto, actualmente, elas compreendem a importância da minha profissão e se tornaram um suporte adicional nesse processo. Esta compreensão mútua entre a minha carreira e a vida familiar tem sido essencial para equilibrar ambos os aspectos da minha vida.

O que lhe fez despertar o sentimento de promover as boas acções de Angola e de África, apesar de viver no exterior há quase 20 anos?

Residindo nos Estados Unidos, diante da vastidão de escolhas disponíveis, optei por dedicar-me à promoção dos aspectos positivos de Angola e do continente africano como um todo. Esta decisão foi motivada pela observação de que poucos africanos se engajam activamente na disseminação das qualidades e potenciais positivos de África. O contacto directo com informações sobre Angola e o continente, frequentemente desalinhadas com a realidade, aliado à percepção de que alguns africanos contribuem, inadvertidamente, para a propagação de narrativas negativas nos Estados Unidos, reforçou a minha determinação em adoptar uma abordagem distinta. Assim, comprometi-me a empreender esforços, mesmo que modestos, para alterar essa percepção e destacar a riqueza e a diversidade positiva da nossa terra, contrariando a postura predominante.

Que imagem tem de Angola, a comparar com a altura em que partiu para os Estados Unidos?

Mantenho uma visão optimista sobre o progresso de Angola, apesar dos diversos desafios que ainda enfrentamos. É evidente para mim o quanto avançamos e estamos a trilhar um caminho em direcção a um futuro promissor. Notavelmente, não sou a única a perceber essa transformação; até mesmo cidadãos americanos reconhecem a evolução de Angola, observando que o país de hoje se distingue significativamente da Angola do passado.

Actualmente, Angola é reconhecida e respeitada internacionalmente, sendo considerada um parceiro sério e confiável. Comparando a reputação de Angola agora com a percepção que prevalecia quando deixei o país, em 2007, é inegável que a imagem internacional de Angola melhorou substancialmente, e sinto-me feliz por ter dado o meu contributo, ainda que pequeno, para melhorar a imagem do nosso país a nível internacional. Esse progresso enche-me de orgulho.

Explique um pouco a relação das duas actividades. Faz jornalismo e coloca nesse exercício a promoção das valências de Angola, ou são mesmo coisas separadas, como se estivesse a desempenhar, por exemplo, o papel de publicitária?

Na minha prática jornalística, adopto uma abordagem profissional alinhada aos princípios fundamentais da profissão, que inclui rigor, ética e um comprometimento inabalável com a veracidade das informações. Ao colectar e analisar dados, o meu objectivo é enriquecer o conteúdo que produzo, mantendo sempre a integridade e a precisão das informações apresentadas. Como profissional da comunicação, direcciono a minha atenção especialmente para a promoção de aspectos positivos do continente africano, com ênfase particular em Angola. Esta escolha decorre da observação de uma narrativa predominantemente negativa em relação aos países africanos na media dos Estados Unidos, onde parece haver uma tendência de enfatizar desproporcionalmente notícias adversas, enquanto realizações e desenvolvimentos positivos recebem pouca visibilidade.

Diante deste cenário, vejo que seguiu uma perspectiva... mais justa.  

Diante deste cenário, percebi a necessidade de estabelecer um contraponto que ofereça uma perspectiva mais equilibrada e justa, sem, contudo, comprometer os pilares éticos do jornalismo. Assim, o meu trabalho visa destacar notícias positivas verificáveis sobre os países africanos, fundamentadas em factos concretos, estatísticas confiáveis e análises objectivas. Esforço-me para apresentar ao público americano, frequentemente exposto a uma visão unilateralmente negativa, uma dimensão alternativa da realidade africana, repleta de potencial e progresso. Ao fazê-lo, pretendo desmistificar preconceitos e ampliar o entendimento sobre a diversidade e riqueza cultural, social e económica do continente africano, contribuindo, assim, para uma narrativa mais equilibrada e informativa.

Neste momento, já é possível medir, em termos de resultado, o trabalho "heróico” que está a realizar pela sua pátria, e não só?

Certamente. Aliás, a percepção dos resultados tangíveis do meu trabalho fortalece a minha motivação para persistir nesta jornada. O impacto é especialmente evidente entre os profissionais da comunicação nas instituições onde estou acreditada, que, frequentemente, recorrem a mim em busca de informações confiáveis sobre os países africanos com os quais me envolvo. Adicionalmente, é gratificante observar a mudança na narrativa sobre Angola nos Estados Unidos. Esta transformação não se deve apenas aos progressos substanciais alcançados pelo nosso país, mas também ao esforço dedicado por muitos angolanos que se têm empenhado em ressaltar as conquistas e aspectos positivos de Angola em diversas áreas.

Essa evolução na percepção e no diálogo sobre Angola reflecte não apenas a importância do trabalho jornalístico focado e ético, mas também destaca o papel crucial dos cidadãos angolanos na modelagem de uma imagem internacional mais positiva e equilibrada do país. A mudança narrativa contribui significativamente para uma compreensão mais ampla e apreciativa de Angola, que incentiva uma visão mais inclusiva e diversificada dos contributos africanos para o cenário global.

Já conseguiu envolver pessoas na sua causa? Refiro-me ao apoio de pessoas e instituições, como, por exemplo, para chegar a fontes ou lugares…

Já há muitas pessoas, especialmente em Washington DC, que reconhecem e valorizam a importância do meu trabalho. Este público aprecia a perspectiva única que ofereço, proporcionando aos americanos uma alternativa de informação distinta daquela à qual estão habitualmente expostos. Este reconhecimento não apenas valida o esforço e a dedicação investidos, mas também sublinha a relevância de disponibilizar recursos informativos que ampliem o espectro de entendimento e percepção sobre temas globais, enriquecendo, assim, o diálogo intercultural e promovendo uma visão mais abrangente e matizada das realidades africanas.

Nos Estados Unidos, o conceito que está a desenvolver já foi assimilado pelas comunidades, ou ainda há muito trabalho a fazer?

Embora reste um caminho longo a percorrer, o adágio "quem corre por gosto não se cansa” ressoa fortemente no nosso compromisso. Tanto eu quanto a minha equipa, permanecemos dedicados a prosseguir com a nossa missão, confiantes de que, eventualmente, não apenas a comunidade angolana, mas também as comunidades de outros países africanos reconhecerão a importância e os benefícios de destacar os pontos positivos dos seus países. Esta perspectiva visa substituir a tendência actual de enfatizar predominantemente os aspectos negativos dos países africanos, uma abordagem que muitos acreditam, erroneamente, que poderia beneficiar as suas nações. Estamos dedicados a promover uma visão mais equilibrada e enriquecedora, que realce o potencial e a riqueza cultural, social e económica dos nossos países, contribuindo para uma imagem global mais positiva e integrada do continente africano.

Hoje os norte-americanos, incluindo povos de outras origens lá radicados, já sabem mais que Angola (e a África) tem qualidades extraordinárias, desde um povo acolhedor, sítios e paisagens deslumbrantes, mas sobretudo que estão a ser implementadas políticas no sentido de transformar o país num lugar melhor?

De facto, a percepção de Angola, especialmente, tem sofrido uma transformação significativa nos Estados Unidos, onde resido há 17 anos. Notavelmente, foi apenas nos últimos cinco anos que comecei a observar uma mudança na narrativa sobre Angola por parte dos americanos, que anteriormente associavam o país predominantemente à corrupção e a diversos problemas. Actualmente, a imagem de Angola junto dos americanos, e, em particular, entre os políticos dos Estados Unidos, é substancialmente mais positiva. Angola é agora reconhecida como um país sério, confiável e um parceiro respeitável e importante para os EUA.

Esta evolução reflecte os avanços internos de Angola. A nova imagem do país como uma nação credível e um aliado valioso destaca o potencial para uma colaboração frutífera entre os dois países, abrindo caminhos para oportunidades de desenvolvimento mútuo e fortalecimento de laços políticos, económicos e culturais.

Tem sido contactada por pessoas, ou mesmo empresários, interessados em saber mais sobre Angola?

Algumas vezes sim. Tive o privilégio de participar e ser convidada para diversos eventos, nos quais representei Angola e falei sobre a sua rica cultura e potencial global. Frequentemente, não aguardo por um convite formal para promover a imagem de Angola; como cidadã angolana que reside nos Estados Unidos, considero ser minha responsabilidade contribuir activamente para a representação positiva do meu país sempre que possível. Creio firmemente que todos os angolanos que vivem no exterior são embaixadores de Angola, tendo o dever de defender e promover os interesses do nosso país onde quer que estejam, demonstrando o seu compromisso e orgulho nacional.

Como foi o seu processo de acreditação como correspondente na Casa Branca?

A obtenção da acreditação na Casa Branca constituiu um processo complexo, no qual foi essencial demonstrar a minha competência e profissionalismo ao nível de outros jornalistas previamente acreditados. Naturalmente, esse procedimento incluiu uma minuciosa avaliação por parte dos Serviços Secretos. Após confirmarem que tudo estava conforme os requisitos, tanto eu como a minha equipa, fomos acreditados. Alguns meses mais tarde, tivemos a honra de nos tornarmos membros da Associação dos Correspondentes da Casa Branca, uma das mais renomadas organizações de jornalistas nos Estados Unidos, marcando um momento significativo na minha trajectória profissional.

Continua a ser a única jornalista africana acreditada na Casa Branca?

Com o Hard Pass, acredito que permaneço como a única mulher africana com essa credencial. Existia um outro africano que possuía o Hard Pass, porém, devido a comportamentos inadequados, teve a sua credencial revogada.

Quais são os seus projectos para este ano?

Para o presente ano, estou empenhada no desenvolvimento e lançamento da nova temporada do meu programa "HARIANA”, previsto para ser transmitido pela TPA e STV, inicialmente a partir do mês de Junho. Este ciclo de episódios será dedicado a cobrir os eventos de maior relevância ocorridos nos Estados Unidos, com ênfase especial nas eleições presidenciais americanas de 2024, oferecendo perspectivas detalhadas e análises aprofundadas sobre os desenvolvimentos que impactam os países africanos.

E o facto de ser angolana tem causado algum constrangimento ou algo que se assemelhe?

Não.

Fale um pouquinho do seu passado. Sei que é de Malanje, mas como chegou a Luanda e, depois, aos Estados Unidos?

Nasci na província de Malanje, onde residi até 1992. Devido ao conflito armado, a minha família viu-se obrigada a mudar-se para Luanda, cidade onde passei a minha juventude. Em 2007, surgiu uma oportunidade profissional que transformou o meu trajecto: fui convidada para integrar a equipa de imprensa da Embaixada de Angola em Washington, D.C., nos Estados Unidos. Esta proposta marcou o início de uma nova fase da minha vida e carreira no exterior.