A Lunda-Norte celebra, hoje, 44 anos de existência, desde a sua criação, em 1978, por via do Decreto Presidencial nº 86/78 de 4 Julho. Nesse período, a província registou vários progressos, mas, também, recuos, como reconhecem os dirigientes e munícipes.
O município do Tômbwa, o maior em área territorial da província do Namibe, tem 18.019 km². A cidade e comuna-sede é o principal centro urbano do município. Nela vive 60 por cento da população, sendo na sua maioria pescadora. Limitado a norte pelos municípios de Moçâmedes e a leste pelo município do Virei e pela província do Cunene, a sul pela República da Namíbia, e a oeste pelo Oceano Atlântico, Tômbwa, há vários anos, vem enfrentando o avanço das areias do deserto, num desafio ecológico de desfecho imprevisível. Além da comuna-sede, o município possui as comunas do Iona e São Martinho dos Tigres.
Lukunga, Ambuila, Ntoto e Mbembe foram alguns dos palcos dos levantamentos nacionalistas no dia 15 de Março de 1961, enquanto Songo, Damba e Uíge (cidade) conheceram a saga revolucionária nos dias posteriores
Muitas
das concentrações colónias foram atingidas em simultâneo pela sublevação
popular no dia 15 de Março de 1961, em várias regiões da actual província do
Uíge, havendo outros levantamentos nos dias posteriores. As acções que pareciam
ter um carácter espontâneo foram-se transformando em luta de resistência
guerrilheira que culminou 14 depois, em 1974.
Para
além do posto administrativo de Kitexi, que mais se sobressaiu, Kipemba (que
posteriormente foi designado por Kipedro), Lukunga, Ambuila, que era Nova
Kaipemba, Ntoto, Mbembe e outros lugares foram palcos dos levantamentos
nacionalistas no dia 15, enquanto outras como Songo, Damba e Uíge (cidade)
conheceram a saga revolucionária nos dias posteriores à data.
As revoltas têm em comum sinais de planeamento
e organização, que justificavam as baixas coloniais, que iam sendo
surpreendidos nos primeiros ataques, como se soube de fontes ouvidas pelo
Jornal de Angola, que se deslocou a sede municipal do Songo e a comuna de
Lukunga, que dista a 144 quilómetros da cidade do Uíge.
Escritos
anteriores deste jornal sobre o 15 de Março apontam Pedro Vida Garcia, Manuel
Bernardo, Ferraz Bomboko, Rodrigo Ngodia, Pedro dos Santos, como os principais
instigadores da luta nesta região do antigo reino do Congo. Na actual
reportagem podem ser encontrados outras referências da génese da luta como
António Ninginisa, natural da aldeia do Lembua, Kingotolo, natural da Aldeia
Mukamba do Bembe, Keto Pedro, de Kikumbi Ngombe, Pedro Mbunda do Nkusu Mpete,
Ferreira Muanga e outros nacionalistas que mais tarde viriam a ser os
fundadores do campo de treino de Kinkuzu no Congo, ex-Zaíre.
Trabalhar um ano por 100 escudos e um cobertor
Miguel Pedro nasceu em 1944, no povoado do Ki-luangu, em Lukunga. Disse-se ser
um dos autores do ataque ao posto administrativo de Lukunga, quando ainda tinha
17 anos de idade, isso no dia 15 de Março de 1961. Na altura vivia aos cuidados
dos seus tios maternos com os quais trabalhava o café, na fazenda destes, antes
de fazer parte da idade de contratados.
Segundo
ele a dureza da vida do contrato enervava as pessoas. Os brancos viam recrutar
os jovens para o contrato nas fazendas pessoais ou da granja do estado onde
permaneciam por um ano, a produzirem o café. O soba se encarregava de apanhar
os rapazes e depois ia apresentá-los a administração onde eram alistados para
posteriormente serem encaminhados para as fazendas que requeriam a mão-de-obra,
necessária para a capina das fazendas do café assim como para a colheita, que
eram os trabalhos de eleição da época.
Depois
de um ano, o contratado voltava para o repouso. "Eles davam, como pagamento 100
escudos e um cobertor e te diziam, vai embora na vossa sanzala, está
dispensado”. Questionado se não era muito,
o dinheiro e os bens de pagamento, Miguel Pedro categórico respondeu: "Não era
miséria, uma humilhação”, tendo exemplificado que o seu pai tinha 4 mulheres e
se por um ano ganhava um cobertor como dividiria para essas mulheres, para além
dos filhos.
O homem
adulto regressava ao contrato no ano seguinte, depois do repouso de 12 meses. O
Pai de Mi-guel Pedro foi ao contrato 7 vezes, até ao ano de 1961. "A pessoa vai
e quando chegar a data marcada pelo soba volta novamente no contrato. O próprio
nacionalista disse ter começado muito cedo a cumprir o ciclo contratual nas
tongas coloniais. "Eu comecei o contrato com o trabalho da escolha de café. Até
os acontecimentos de 15 de Março cumpri dois contratos. Passei um ano em casa e
no ano seguinte me apanharam mais e fui na fazenda escolher o café”.
De
acordo com o nacionalista a parir dos 10 anos as pessoas começavam já a sofrer
as consequências dos portugueses. "Isso, a dada altura, começou a enervar a
população que dizia que "estes gajos estão a nos explorar demais, vamos matar
os gajos”.
Na
sua opinião esse descontentamento foi aproveitado pelos mensageiros
(activistas) que vinham do Kongo Kinshasa, já influenciados pela revolução de
Patrício Lumumba. Citou António Ninginisa, natural da aldeia do Lembua e o Kingotolo,
natural da Aldeia Mukamba do Bembe e Bomboko do Kitexi como os mensageiros que
julgavam terem vindo de Kinshasa. "O Bomboko depois de ficar aqui durante algum
tempo vai a Kitexi, o Ninginisa fica aqui, o Kingotolo passa para o Ntotó”.
Ordem para atacar
"A concentração, no dia, que fomos juntados e nos deram a ordem de atacarmos os
brancos colonos no Lukunga tinha sido feita próximo da vila do Lukunga do
Bembe, na rota quem vai ao Mbanza Kongo. Vi pessoalmente esses homens no lugar
da concentração”, disse demonstrando felicidade por ter estado diante daqueles
nacionalistas que mobilizavam as populações para a rebelião.
Todos
os jovens dos bairros tinham sido mobilizados a participarem, sendo, então,
orientados no local da concentração para que cortassem as mangas das suas
camisas e ficassem apenas de tronco nus. "Se tem calça tinha de ser cortada.
Era essa a instrução que nos tinham dado. Quem vai combater tinha de ir assim.
Era a ordem”.
Depois
de dois dias de concentração, que se fazia no Povo Vila, foi dada a ordem de
partida, na madrugada do dia 15 de Março. "Com a bravura fomos”. Os homens
válidos dos povoados de Kilonde, Kikuva, kiluangu, kinzambi, até os da área do
Nsumbi, do Lembua, do Povo Mbundu, todos estavam mobilizados e presentes para o
primeiro enfrentamento contra os colonos.
"Saímos
às 6 horas da manhã do local da concentração. Atacamos o Lukunga, onde morre só
um preto, chamado Makaya Mavangazala, natural do povo Kikani”. Na vila havia
apenas dois ou três polícias e o mesmo nú-mero de cabos negros. Não tinha
militares. O chefe do Posto Administrativo chamava-se Carvalho. Quase Todos os
habitantes brancos da vila de Lukunga tinham sido mortos durante o ataque.
Apenas um tinha conseguido safar-se. Alguns que tentaram escapar-se foram alcançados
e abatidos, outros que conseguiram desfazer-se dos atacantes, incluindo o
manuenses, como chamavam o secretário-geral da administração, foram encontrados
mortos fruto dos golpes e dos tiros de kanhangulu.
Lukunga
fora ocupado pelos nativos, em pouco tempo. O chefe do posto foi o único que se
tinha safado, segundo o homem do 14, como chamam os guerrilheiros que
enfrentaram a autoridade colonial de 1961 a 1974. O administrador do posto
tinha sido informado sobre a iminência do ataque por parte dos serviços de
informação colonial, cujos agentes actuavam em Kinshasa, junto da direcção da
UPA, tal como informou. "O regime português acompanhava as movimentações do
movimento a partir de Kinshasa”.
Tinham
sobrevivido também aqueles que antes se tinham deslocado a Luanda. "Foram os
poucos que não tinham sido mortos”, de acordo com as lembranças de Miguel
Pedro.
Acrescentou
ainda que muitos comerciantes ainda tentaram ripostar ao ataque com as suas
caçadeiras. Mas os nacionalistas tinham-se enfurecido com a morte do
companheiro, Makaya Mavangazala. "Conseguimos matar o autor do disparo da
caçadeira que matou o mano Makaya. Esse branco foi o mais cobarde da vila, era
chamado Horismo”.
Confrontado
com a razão de ser do ataque contra os comerciantes coloniais ao invés dos
fazendeiros, o então guerrilheiro foi categórico em justificar que atacaram os
autores do recrutamento dos negros para as roças, que era o pessoal da
administração, sobretudo o chefe do posto. "Você não ia ao contrato sem ser
alistado pelo chefe do posto”. Questionado sobre as razões que afastaram os
sobas da ira popular, ele afirmou que as próprias autoridades tradicionais
apenas cumpriam ordens e que muitos deles também cumpriam os contratos mal
pagos.
Em
resposta houve bombardeamento contra a vila e as sanzalas circunvizinhas de
Lukunga. "Caiu uma bomba na aldeia do Mpaku. Na vila foram três que não mataram
ninguém porque já tínhamos saído”. O ataque contra Lukunga foi chefiado pelo
Tony Gilungua, que era da aldeia do Luangu, que já tinha cumprido a tropa
colonial portuguesa, tendo sido, muito depois, o chefe do quartel de Kikomba
nas matas, quando passaram para a guerrilha.
"Também
tínhamos o Keto Pedro, de Kikumbi Ngombe, Pedro Mbunda do Nkusu Mpete, que era
antigo cabo no posto do Lembua, depois de servir também o exército português.
Os dois fizeram parte da fundação do campo de treinos de Kinkuzu, de acordo com
Miguel Pedro, que foi um dos primeiros instruendos do mesmo.
Informou
que durante o ataque contra Lukunga, animada com as palavras de ordem "UPA,
Maza, UPA, maza” (UPA, água, o mesmo que a água não pode ser atingida) ninguém
saqueou as coisas dos brancos. Tinham sido instruídos a não o fazer.
"Diziam-nos que quem assim tentasse, morreria. Dinheiro, você encontra bwé, mas
não pode tirar, nem copo de açúcar ou sal, você podia tirar”.
Os colonos do posto de Lukunga
Lukunga tinha 12 ou um pouco mais de comerciantes, para além dos agentes do
estado que eram os funcionários do posto administrativo, policias e cabos
negros. Já com alguma dificuldade de memorização, Miguel Pedro ainda se lembra
de muitos dos moradores da vila do Lukunga, como o Da Cruz, o Roberto, o
Leitão, o Carvalho (chefe do posto).
Ainda
tinha o branco que gostava que o chamassem com o nome da expressão dos nativos
"Paxitunazau, mundele a Ndombi (o Sofrimento que temos, branco negro”, na
tradução literal. Este era o único que Miguel Pedro conhece ter conseguiu
escapar, fugindo para o posto administrativo da Damba, para além dos que
estavam em Luanda. Havia ainda o Carvalho, comerciante, que era caçador, o
senhor Morais, que era o chefe da granja, a horta do estado.
Mortes de vingança
Sem remorsos indicou terem morto todos eles conjuntamente com as suas esposas e
filhos. "Ninguém ficou. Eram cortejados com as catanas”. Durante o ataque foram
utilizadas apenas duas armas de tipo mauzer, sendo maioritariamente armas
artesanais. "Porque essa barbaridade”? Quis saber o repórter do Jornal de
Angola, sendo-lhe ripostado com o argumento segundo o
qual os filhos não podiam sobreviver para não darem continuidade a exploração
nos contratos e as matanças que os pais faziam também até contra crianças.
Ainda
o JA procurou saber se foram essas matanças indiscriminadas que levava os
portugueses a acusar-vos de terroristas, uma questão que o entrevistado disse
que eram sim terroristas, assassinos, no entendimento dos colonos. Eles apenas
queriam recuperar a liberdade, a dignidade e a soberania e que não se importa
com o julgamento que os colonos faziam na sua propaganda.
Enquanto
isso, Pinto Luvumbo que acompanhou o JA à comuna de Lukunga acrescentou que o
termo terrorismo ou assassinos surgiu como propaganda dos portugueses que
passava através dos emissores da rádio, com o propósito de manchar a revolução
e esconderem as atrocidades que provocavam contra os colonizados.
"Eles
eram os verdadeiros terroristas. Prendiam pessoas em suas casas. Levavam-nas e
matavam de forma muito cruel. Violavam mulheres na presença de crianças.
Violavam mães e filhas no mesmo lugar. Os grandes terroristas eram os
colonialistas portugueses. Era por causa deste terrorismo que nos revoltamos,
para além dos contratos”.
Desafiou
os historiadores portugueses ou angolanos a terem a coragem "como temos agora”
de assumir o que fizeram, para a nova geração julgar. Para ele o que aconteceu
faz parte da história e deve ser mesmo contada com detalhe e verdade.
"Perdi aqui o irmão mais velho”
Depois do ataque voltaram ao mesmo lugar da concentração, onde foram traçadas
as futuras acções, como os posteriores ataques contra o posto administrativo da
Damba, que aconteceu em Abril de 1961. "Perdi aqui o meu irmão mais velho, o
Mário Francisco que foi o primeiro a cair. Depois foi o Kyaku que morreu quando
teimosamente retirava do mastro a bandeira portuguesa, ao invés de fugir, como
lhe pediam os companheiros. Foi daí que eu fugi, indo-me esconder directamente
na Serra da Kanda, passando por Mpete Nkusu e Sakamu.
"Com
essas mortes do nosso lado, decidi fugir, passando por estrada cujas aldeias
tinham sido abandonadas pelos seus moradores, por causa dos ataques, das mortes
de colonos que motivaram o abandono de quase todos os postos administrativos
coloniais”, disse Miguel Pedro.
Nessa
altura, adiantou, as sanzalas, que ficavam nas estradas, estavam despovoadas
também. Tinham ficado solteiras as estradas que vão para a Damba, Mpete Nkusu,
Kuimba até Congo dya Muanga, e mesmo a via da Serra da Kanda, onde eram
visíveis as cubatas que se encontravam abertas, com os haveres expostos já
desarrumados, o que mostrava a saída precipitada das pessoas.
Todo
o povo tinha fugido para as matas, sobretudo junto da Serra da Kanda onde se
tinham concentrado, um arranjo encontrado pelos mensageiros que vinham do Congo
e que instigavam aos levantamentos.
Quando
ouviram dos ataques contra Mpete Nkusu, Lukunga, Damba os nativos
precipitaram-se em buscar refúgios nas matas. Aqui Miguel Pedro encontrou
populares que também tinham feito confusão em outras localidades. "Foi daqui
que rumei para Kinshasa”, antes de encontrar poiso na base de Muandanji,
próximo do Congo.
PINTO
LUVUMBU
"Eu
participei na luta não vale a pena duvidar”
Pinto Luvumbu, agora com 74 anos de idade, tinha sido enviado, em 1960, a
Luanda para aprender a profissão de mecânico e prosseguir com os estudos, antes
de ter sido ajudante da oficina do Rimaga, na cidade do Uíge, por pouco tempo.
Os pais encontraram no Marçal, próximo de São Paulo, um quarto que arrendaram
conjuntamente com os progenitores do seu primo Jota, o Jorge Mbengu, que também
estava na mesma condição de estudante e trabalhador.
Trabalhava
numa oficina e estudava na escola Don Afonso Henrique, na baixa de Luanda, onde
testemunhava as actuações da polícia colonial contra a população negra como os
casos que se davam na Liga Africana, onde muitos jovens eram presos e depois
mortos. Os colonos atraiam os jovens para irem a liga onde diziam haver festas
nas sextas ou sábado. "Quando fossem lá, muitos já não voltavam. Fomos
despertados que não fossemos lá, mas mesmo assim os jovens eram perseguidos nos
bairros”.
O agora
delegado provincial da FNLA, já não faz ideia dos nomes dos jovens que vira
serem levados presos, na Liga Africana, e nunca mais voltaram, mas sabe que
muitos deles eram de Mbanza Congo, Uíge, Malanje, Cuanza Norte, que já
frequentavam classes acima do ensino primário ou eram jogadores ou músicos.
Depois,
"nós vimos os nossos mais velhos preparados a irem para a casa de reclusão. Não
sabíamos o que iam lá fazer. Só depois do regresso de alguns deles por volta
das 7 ou 8 horas e os tiros dos polícias que se seguiam é que demos conta que
alguma coisa tinha acontecido”. Disse que era tal o secretismo que muitos
jovens abaixo da sua idade desconheciam o que se estava a passar neste dia 4 de
Fevereiro, "isso porque os velhos que estavam ligados a esse acontecimento
tinham guardado segredo aos jovens os meandros da organizada da acção deste
dia.
A fuga para o Uíge
Pinto
Luvumbu ainda se lembra do dia em que o mulato Diogo, motorista do empresário
Ferreira Lima, que se enriquecia com o negócio do café, o abordou num dos
campos do areal do Marçal, onde jogava futebol com os seus companheiros. O
Diogo era um camionista que fazia frete de transportação do café entre Negage e
Luanda.
"Ele
é que foi ter connosco com o carro dele num sábado de manhã. Nos encontra a
jogar futebol perto dos carabineiro do Marçal. Não o conhecia. Mas chegou e nos
perguntou vocês são de onde? E nós lhe respondemos somos do Uíge. Vocês são do
Uíge e ainda estão cá? Interrogou-se o homem muitos surpreendido. Nós lhe
dissemos que estavamos aqui para aprender profissões e a aprender o be a ba,
coisa que não podíamos fazer lá no Uíge, porque senão éramos presos”.
Os
colonos, no Uíge perseguiam os que aprendiam profissões ou a ler e escrever. O
Diogo disse que agora isso não. Os brancos aqui estão a matar todos o pretos do
norte, disse-nos ele, observando "vocês não podem ficar aqui”. Quem quisesse
voltar, ele levaria sem pedir dinheiro de passagem. Quem quiser ir ao encontro
do seu pai, ele ia levar de graça.
"Partimos
do São Paulo. Nesta viagem apenas eu e o ajudante dele rumamos ao Uíge”. Na
cabina do camião também levava algumas miúdas mulatas que não conhecia,
seguindo a antiga estrada da "tecnil” que passava por Kibaxi. Durante a
trajectória enfrentou inúmeras identificações e questionamento sobre as razões
da viagem, se estava a fugir de Luanda.
A prisão do bandido revolucionário
Prenderam-lhe, tão logo desceu da viatura que se imobilizara a frente do actual
grande hotel do Uíge, por causa do genro do António Cordeiro, que tratavam por
doutor, que lhe vira a descer. "Ele me
conhecia bem, porque cresci com o Carlos Cordeiro, ele próprio e outros meninos
brancos. Quando me viu exclamou, óh, este gajo está aqui?”. Foi de seguida a
correr para a administração do Songo, enquanto os polícias que ele chamou o
entrevistavam, com perguntas atrás de perguntas assim como identificavam os
seus documentos.
Ele foi dizer que tinha chegado no Uíge um
bandido, o filho do velho Luvambu, que estava em Luanda a participar nas
confusões terroristas que lá estavam a passar. Conseguiu se desenvencilhar dos
agentes do estado que o estavam a entrevistar quando os viu distraído. "Quando
vi uma folga me desfiz deles e apanhei o autocarro que apareceu logo. Pensei
que se eu ficar aqui vão mesmo me prender. Enquanto isso ainda não aconteceu e
ainda não há boa vigilância vou me retirar. Fugi”.
Seguiu para o seu bairro em Kiriama, aonde
às 4 horas do dia seguinte apareceu a polícia colonial, que o levou para a
prisão da administração do Songo, onde metiam as pessoas que consideravam
perigosas ou que estavam ligadas aos movimentos da luta. Os portugueses estavam
atentos com todos os miúdos que viessem de Luanda, na desconfiança de terem
participado nos levantamentos do 4 de Fevereiro. Na administração foi
apresentado ao administrador. Ficou preso por alguns bons dias, sendo também
castigado com porrada, como era costume, disse.
Entretanto, o seu pai, que era o soba do bairro Kiriama, e o falecido Alberto Dica, um fazendeiro negro de conhecida influência, foram discutir com o então administrador do posto e conseguiram a sua liberdade. "Eles recordaram ao chefe do posto que os negros não prenderam nem mataram os brancos que tinham chegado nas nossas terras, os brancos que chegaram em Mbanza Congo ninguém lhes matou. Vocês não podem matar esse miúdo. Nós não estamos a mandar os nossos filhos a Luanda para vos matarem. Eles apenas vão para lá para aprendeem o a, b, c. Ele, que era eu, não veio de fora, não veio do Congo, se assim fosse talvez.
O cunhado Alberto Dinga, que tinha boa
reputação junto dos brancos da vila, me tira e levá-me para a sua fazenda”.
Os bombardeamentos
Muitos colonos foram abatidos na baixa do Lenge, onde procuravam por refúgios.
Disse, entretanto, que a maioria das mortes, quer de colonos, quer dos nativos
foi provocada pelo bombardeamento dos aviões que foram deslocados de Negage
para o Songo separados por 76 quilómetros. Apareceram nos céus do Songo, logo
ao amanhecer do dia.
Os homens do avião não sabiam quem estava a correr nas ruas da vila, se eram os colonos ou se éramos nós, os atacantes. "Bombardeavam atoa, matando até os próprios brancos coloniais. "Com as mortes recuamos. O que tombó do ataque tombó, o que ficou vivo ficou. Morreu muita gente do nosso lado. Sobretudo quando chegou o avião e a resposta dos colonos que tinham carabinas de tipo 10.70, 9.3, D70, 375”.
Pinto Luvambu julga que
alguém, entre os colonos, que teria feito a comunicação que precipitara a vinda
do avião a partir da vila do Ngaji (Negage) que começou a bombardear sobre a
vila do Songo. Também souberam depois que um branco que trabalhava em Kitexe
que se chamava Reis, tinha alertado o Uíge sobre os acontecimentos que se
estavam a passar no Songo, neste dia.
A resposta dos colonos e a
intensidade dos bombardeamentos obrigou a fuga dos nacionalistas para os
povoados próximos. Atacamos a vila, mas como não tinham materiais suficientes,
sofremos derrota. Houve muitas mortes do nosso lado. Dispunham somente de
"armas de Kimbundu” (artesanais), que eram os kanhangulu, que os velhos
fabricavam e algumas poucas modernas. O resto foi ao combate com paus e mocas.
Chegados às sanzalas
explicavam: "Olha, não conseguimos derrotar os colonos, mas conseguimos atacar,
mesmo assim, a vila”. Com a informação, os mais velhos começaram a pensar como
agora fazer com essa maka que tinham arranjado como os brancos, disse.
Questionado sobre a brutalidade nos ataques contra os colonos, Pinto Luvambu lembrou que "quem adiantava de matar os outros eram os brancos. Levavam as pessoas, na administração onde os matavam, muita destas pessoas sem culpa alguma. As vezes simulavam levá-los para Luanda, quando eram mortos pelo caminho e seus corpos deitados em valas ou rios”.
A resistência nas matas
Depois do recuo aos povoados
foram informados que deveriam abandoná-los e irem criar bases nas matas, de
onde continuariam com os ataques. "Nós fugimos para as matas do Lenge, ao lado
do Kifigia, que fica perto da Cerra do Uíge”. Os outros para a parte do Musungu
e parte do Denga.
Já nas matas criaram uma
força de resistência, chamada "genenses”. Essa força tinha na sua estrutura
elementos "politizados” que informavam sobre a necessidade da luta. Eram
pessoas que se identificavam com a UPA e que diziam ter vindo de Kinshasa com a
orientação de continuar a mobilização da população para a luta.
Outros ensinavam as pessoas
a manejarem as armas para a guerra de guerrilha. Ainda s lembra que em 1962
chegou uma instrução de Kinshasa que mentalizava as pessoas nas matas para que
fossem abandonados os métodos de luta, como os velhos faziam antigamente.
"Começamos a receber
instruções de como desmontar armas, como disparar contra alvos, como se
abrigar, como rastejar e outras técnicas de guerra que eram passadas pelos mais
velhos que já tinham cumprido o serviço militar colonial e que tinham
regressado às suas sanzalas de origens. São muitos destes instrutores que manejaram
as armas no dia do ataque contra a vila do Songo, como o velho Manuel, o velho
Afonso Kangulu, Ferreira Pumba e outros, disse.
Os que mais se destacavam
eram os que tinham participado nas guerras da Índia, "que nos ensinavam muitas
coisas relacionadas com os avanços e recuos durante as acções, protecção. Pouco
a pouco nos tornávamos muito fortes nos ataques, muito mais depois da
construção e entrada em funcionamento do campo de treinamento de Kinkuzu no
Congo, ex-Zaíre.
Os dias posteriores foram
dedicados a ataques contra as fazendas, de onde eram recuperadas armas, como
g3, 375 e outras, que serviam para a continuidade da guerrilha que tinham
instalado. Somente muito depois começaram a receber armas a partir de Kinshasa,
como as metralhadoras, pistolas "estrelings”, com que atacavam as viaturas e a
demais concentrações de colonos, como a vila do Songo, que foi atacada por duas
vezes. A segunda aconteceu no dia 1 de Maio de 1961.
Depois começaram a
seleccionar as pessoas segundo a classe escolar que tinham. Os que tinham
níveis avançados foram enviados a Kinshasa, onde eram também reenviados para
outros países. Quer o treinamento militar, quer a selecção e a mobilização era
dirigidos, de acordo com Luvambu, por Pedro Vida, o Manuel Bernardo, que
estavam abrigados na mata do Inga de onde saiam ou enviavam os seus emissários
que iam também para outras regiões do actual território do Uíge e outras partes
do antigo território do Kwanza Norte, como Kitexi e os Ndembu.
Para o antigo combatente e
veterano da pátria, a intensidade da guerra contra a colonização portuguesa
começou a partir do 15 de Março e desde então, tal como milhares de
nacionalistas, sempre viveu nas matas, de onde regressou para a sua sanzala,
apenas depois da independência nacional.
Interrogado se aquele
movimento popular queria mesmo ocupar a vila do Songo, ficarem lá, nas casas
dos colonos, Luvambu, já trémulo pela idade, acenou que se eles conseguissem
era mesmo ocupar, embora que era difícil isso acontecer, naquele tempo, com o
tipo da organização que tinham.
"Os outros diziam que
tínhamos somente de atacar, assustar os colonos e depois fugirmos para as matas
de onde nos reorganizaríamos para as acções futuras que obrigaria a fuga desses
colonos”, o que viria a acontecer, numa luta que levou 14 anos. Dividido entre
tristeza e alegria disse: "Queríamos libertar o nosso povo, dirigir o nosso
país em paz, mas isso não aconteceu, como pensávamos. Nos desentendemos e a
guerra entre nós se instalou até a pouco tempo”.
O ataque à vila do Songo
Na noite do mesmo dia, chega, na fazenda do Alberto Dinga, um emissário que
avisa que na madrugada do dia seguinte deveria ser atacada a vila do Songo e
que todos os rapazes tinham de ser mobilizados a participar. Para a precisão do
dia da sublevação utilizavam como senha "no dia 15 de Março haveria o casamento
do filho do No-gueira”. Aclarou que Nogueira era um francês, em cujas
propriedades trabalhara o Holden Roberto, como gerente, lá em Mbanza Congo.
Foi o Ferreira Muanga quem mandou atacar o
Songo, que já tinha vindo do Lukunga, onde tinha havido o ataque contra o posto
administrativo. Com ele estavam o António Ninginisa, que era da Damba, os
irmãos Pintos, que eram de aldeias do Bembe. O velho Ferreira Muanga e o João
tinham mobilizado os nativos para esse levantamento, que ele próprio mostrou-se
inseguro quanto o dia certo do acontecimento, embora afirme ser o dia 15 de
Março, entretanto contrariada com a sua própria referência que indica que "a
acção que rebenta em Lukunga motivou o levantamento popular contra a vila
colonial do Songo”.
A vila do Lukunga tinha sido atacada
precisamente no dia 15 de Março, o que pressupõe que a posterioridade referida
por Luvambu indique que a confusão do Songo tenha decorrido mais tarde.
Eles diziam que "Nós já recebemos
(ocupamos) o Lukunga, agora vocês vão também atacar o Songo”. Na própria vila
somente viviam os brancos, porque os negros estavam em poucas aldeias afastadas
desta. "Perto da vila não podia ter casa de negros. Os brancos não deixavam”.
Segundo Pinto Luvambu os velhos já sabiam,
através dos mensageiros, que mais tarde ou mais cedo a revolta contra os
brancos da vila ia acontecer, que o povo não suportaria por muito tempo os
abusos dos colonos, que se intensificavam nestes ultimamente.
Pinto Luvambu precisou que era do
conhecimento dos mais velhos da existência de uma organização em Kinshasa que
instigava a revolta contra os colonos. "Os velhos diziam que se nós deixarmos
esses colonos, vão nos acabar. É melhor mesmo lhes atacar para deixarem a nossa
terra”.
"Ferreira Muanga orientou-nos que, antes
do ataque, cortássemos paus e cavássemos buracos ou valas profundas nas
estradas que dificultassem o trânsito de possíveis geeps de apoio dos militares
portugueses” À meia-noite partimos para o objectivo do ataque. O grupo de
Luvambu partiu da aldeia de Kivita, a Outra agrupação da direcção da estrada
para o Lukunga e um terceiro do Denga.
Já no local, os adultos que tinham armas de canhangulo começaram a disparar, o que precipitou os colonos a saírem das casas. Seguiram depois os que tinham os paus, indo arrombando as portas das casas coloniais, algumas delas com um piso. "Fomos chocando com os brancos colonos que saiam assustados das casas”.
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LoginAntiga vila de Carmona, elavada à categoria de cidade, a 1 de Julho de 1917, registou inúmeros avanços socioeconómicos, mas muitos sectores ainda precisam de grandes intervenções para atingir o desenvolvimento desejado
Reza a história que Cacuaco é uma das comunidades mais antigas da província de Luanda. Ascendeu à categoria de vila no dia 24 de Junho de 1940, período em que foi instalada a Administração, segundo dados fornecidos por algumas entidades tradicionais locais.
Em Junho de 1976, sete meses volvidos sobre a proclamação da Independência Nacional, o Conselho da Revolução põe fim à crise na empresa, promulgando a Lei n.º 51/76, que nacionaliza, em favor do Estado angolano, a antiga empresa privada portuguesa e, em seu lugar, cria a Edições Novembro - EP, proprietária e editora do “Jornal de Angola”
A zona urbana do Negage continua a mesma. Mas a periferia cresceu bastante, embora de forma desorganizada, com o surgimento de novos bairros, como são os casos de Tinguita, Kapopa, Aldeia, Kawa Central, Kawa Missão e Kawa Feira. A maioria das ruas estão degradadas e clamam por reabilitação urgente. Os edifícios estão envelhecidos assim como os dois estádios de futebol, o do Sporting e o do Desportivo do Negage. O emblemático Hotel Tumbuaza anda abandonado à sua sorte.
A Selecção Nacional ocupou a sexta posição da tabela classificativa, da 23ª edição do Campeonato do Mundo júnior feminino de andebol, ao perder , este domingo, 21-23, diante da Dinamarca, em partida disputada, no Arena Zlatorog Celje, Eslovénia.
Em Lusaka, Zâmbia, na década de 60, quando se registava uma acentuada dinâmica de conjugações de esforços políticos virados para as independências das então colónias portuguesas, a chegada de Agostinho Neto alterou a correlação de forças e teve um grande impacto na esfera de influência, por conta da dimensão da sua figura, que estava equipada com ferramentas políticas sofisticadas, desde já o seu pensamento profundo que não era tribal nem racista, suplantando a presença de outros políticos como Savimbi, que se apoiava mais em laços tribais da região dos Ovambo, com afinidades na Namíbia, tentando conseguir a simpatia da SWAPO, mas tal propósito não vingou devido à figura de Neto.
A maioria dos 12. 993 pacientes toxicodependentes está a receber tratamento no Centro de Reabilitação do Bengo, que, de acordo com secretário de Estado da Saúde Pública, Franco Mufinda, “o único centro existente no país”. Este trabalho é desenvolvido pelo Ministério da Saúde através do Instituto Nacional de Luta Anti Droga (INALUD) e Organizações Não-Governamentais.
A transportadora aérea angolana - TAAG, reforçou, este sábado, a rota regional essencial, com destaque para as destinadas às províncias, com a sexta encomenda da aeronave do modelo Dash 8-Q400, produzidas por um consórcio do Canadá.
O embaixador de Angola na Etiópia e representante permanente junto da União Africana (UA), Francisco José da Cruz, prestou uma informação detalhada sobre o processo eleitoral angolano aos homólogos dos Estados-membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), acreditados em Addis Abeba.