Desporto

Felizarda Jorge: “Minha estreia internacional foi nos Jogos de Londres’2012”

Rosa Napoleão

Jornalista

Felizarda Jorge é basquetebolista do Clube Interclube e da Selecção Nacional. Aos 38 anos é uma mulher que dedicou a sua vida desde muito cedo ao basquetebol.

31/03/2023  Última atualização 07H58
© Fotografia por: Edições Novembro

A jogadora já ostentou o título de capitã da equipa por quatro anos, no Interclube, e dois anos na selecção.

Formada em Gestão de Recursos Humanos pela Universidade Lusíadas de Angola, sonhava, quando criança, em ser advogada, para defender as causas justas, mas o destino arrastou-lhe para outro caminho. A jogadora realça que o sucesso na modalidade é fruto dos incentivos que sempre recebeu da família. 

 Felizarda decidiu enveredar pelo basquetebol por incentivo do seu professor do ensino primário, na escola 21 de Janeiro, por causa da sua bravura nas aulas de Educação Física.

 "Tínhamos o hábito de jogar basquetebol nas aulas de Educação Física. Eu costumava ser uma aluna dedicada e muito focada naquilo que fazia. Era boa a jogar, por isso recebia sempre elogios e incentivos do meu professor de Educação Física, para me enquadrar num clube”, contou.

 O ASA foi o primeiro que a recebeu no basquetebol. "Lembro-me de ter sido levada pelo meu pai (já falecido), que também era um amador do desporto em particular do futebol. Ele pertencia a um clube lá nas bandas de Calulo, Libolo, sua terra natal.  Estive no ASA com o treinador Bumba a trabalhar no escalão de iniciados desde os meus 10 anos até aos 14 anos.  No ano seguinte fui para a equipa do Maculusso onde permaneci a trabalhar com o treinador Jesus e o Bigodinho nos escalões de cadetes e mais tarde nos juniores com o treinador Januário.

Depois por causa do meu foco no trabalho fui colocada para fazer dupla júnior e seniores. Isso graças também ao trabalho dedicado dos treinadores Januário e Alex que contribuíram muito para aquilo que me tornei hoje no basquetebol. Tenho por eles um profundo respeito e consideração”.

 A persistência nos trabalhos de treinamento que eram encarados por ela com bastante rigor, levou-a a constar na lista da convocatória da sua equipa, na altura o 1º de Agosto para os Jogos Olímpicos de Verão em Londres, isso em 2012. Era a sua estreia para uma competição de âmbito internacional.

"Foi uma experiência fantástica. Estava ao lado das minhas colegas que já carregavam alguma experiência naquele tipo de competição, como é o caso da Nacissela Maurício, a Astrida Vicente, a Nadir Manuel, Luísa Tomás, Fineza Euzébio, Ngundula Filipe, Ângela Cardoso, a Catarina Camufal e outras. Confesso que havia muita ansiedade em mim.  Disputamos os jogos com muita bravura, porque recebíamos as orientações do nosso treinador na altura o Aníbal Moreira, que era para nós um pai, sempre pronto para ajudar e ensinar.

A equipa chegou à décima segunda posição, na classificação final. O 1º de Agosto é um grande clube, por qual eu tenho muito respeito. Penso que toda aquela geração de jogadoras que passou nas mãos do treinador Aníbal Moreira ficou com um legado. Uma excelente pessoa que fez um trabalho excepcional connosco, e graças a este grande homem, a equipa conseguiu ser, duas vezes consecutivas, vencedora das duas bolas de ouro para a selecção de Angola.

Joga e funciona no SME

Apesar das suas muitas tarefas dentro do basquetebol, Felizarda Jorge decidiu dedicar parte do seu tempo ao trabalho administrativo fora das quadras. Formada em Gestão de Recursos Humanos, a jogadora está neste momento colocada no departamento da DEP, numa área que também faz parte do desporto.

 Questionada sobre como consegue conciliar as duas coisas, ela respondeu: "Trabalhar em outra coisa fora do campo tem sido uma boa experiência. Estou muito bem a trabalhar na DEP. Como todos sabemos a nossa vida desportiva é bastante curta e nós atletas temos que começar a trabalhar no sentido de garantirmos a nossa vida, após o encerramento da carreira desportiva. Hoje temos assistido a muitos casos de atletas que após encerrar a carreira desportiva começam a enfrentar dificuldades, porque muitos deles dedicaram todo o tempo ao desporto e não conseguiram terminar os estudos”, disse.

"As dificuldades sempre existiram”

A jogadora sénior do Interclube e da Selecção Nacional descreve que as dificuldades sempre se fizeram sentir ao longo da sua carreira desportiva. Felizarda defende que os clubes devem apostar nos patrocínios se quiserem atingir um desenvolvimento sadio.

 "Penso que aquilo que os clubes recebem dos órgãos soberanos do desporto ou o que produzem é muito pouco para a sua sobrevivência. A melhor aposta deve ser conseguida com a ajuda dos patrocinadores. Infelizmente nesta altura tem sido uma grande dor de cabeça conseguir manter os patrocinadores, porque existe carência e dificuldades para quase todos nós.

Esta é uma situação que se arrasta desde os nossos velhos tempos até hoje na nova geração. É preciso encontrar as soluções se quisermos ter no futuro uma selecção forte que continue a manter as conquistas já registadas”.

 A jogadora realçou os problemas que temos estado a observar em alguns clubes de Angola. "Tudo isso está  a acontecer porque faltam os patrocínios. As empresas bem sucedidas devem se aliar ao desporto e alavancar os clubes para o bem do desporto nacional”, disse.

"Quando cheguei  ao Interclube já estava mais madura”

Foi há aproximadamente 12 anos que o Clube Interclube comprou o passe da atleta.  A jogadora descreve que nesta altura já estava mais rodada em termos de competitividade, com tudo o que havia aprendido nos clubes em que passou (ASA, Maculusso e 1º de Agosto).

"Costumava jogar com a Selecção Nacional de cadetes enquanto estive no Maculusso. Quando cheguei ao Interclube já estava mais madura. Lembro-me de termos ganho a Taça dos Clubes Campeões, a seguir ganhamos o campeonato africano. Depois disso continuamos na senda das conquistas até então.

Durante esse período retirei-me por dois anos para o 1º de Agosto, clube que respeito muito, e novamente regressei ao Interclube. Sempre tive o hábito de levar muito a sério as coisas que faço, e era assim com o basquetebol. Sempre soube honrar o nome da minha família enquanto jogadora. O Interclube tem sido muito mais que uma escola para mim, até atingir a categoria de seniores sempre defendi as cores da nação com muito orgulho”, contou.

 Com o Interclube, Felizarda admite guardar muitas memórias que custa contar. Foi neste clube que a atleta conquistou os títulos de campeã em provas nacionais, Supertaças, Taça de Angola, Taça dos Clubes Campeões, entre outros.

 "Lembro-me de ter aprendido bastante com o falecido Camuloge, que Deus o tenha, foi brilhante, sendo um dirigente com elevado valor moral, muito amigo das atletas,  um verdadeiro pai que sempre soube dar a mão e superar dificuldades. Soube desempenhar bem o seu papel, como dirigente e conseguiu nos levar várias vezes para a final da Taça do clube em que vencemos”, recordou.

"Prometo jogar mais uma época”

Felizarda Jorge está já a pensar em pôr fim à sua carreira desportiva.  A jogadora revelou que pensa permanecer por mais uma época nas quadras. 

"O Interclube tem sido para mim uma escola. Penso que só me resta mais uma época para jogar. Ressalto aqui e com bastante mérito o trabalho do treinador Apolinário Paquete, uma pessoa que eu carrego no coração com muita consideração, por ser tudo nas nossas vidas, (nós jogadoras). Acho que sem estas pessoas eu não seria a jogadora que sou hoje, devo muito aos treinadores”.

 Admitiu não ter mais muito tempo na modalidade. Pensa em se manter por mais uma época. "Penso que muitas pessoas estão ansiosas em saber quanto tempo ainda estarei nas quadras. Eu tenho a intenção de jogar por mais uma época, depois vou anunciar a minha retirada, porque será tempo de me dedicar nas outras coisas”, disse.

A vida nunca é fácil para um desportista, segundo Felizarda Jorge, "tem muitas nuances e inúmeras dificuldades, principalmente para conciliar os treinos com outras tarefas. Quando estamos nesta condição é importante contarmos com o apoio da família. Se não acontecer fica difícil tocar o barco para frente”.

Felizarda conta que a sua mãe, Dona Mimi, como é carinhosamente tratada,  sempre ficou com um pé atrás, no que concerne a ela jogar basquetebol, mas depois acabou por aceitar a minha vida de desportista. "Ela passou a ser o meu braço forte, e esteve sempre aí quando eu passava pelos pequenos acidentes de lesões, sempre a cuidar dos meus ferimentos, principalmente quando sofri a operação no joelho. Agradeço a Deus pela vida dela, porque sempre me incentivou a terminar os meus estudos. Já não temos pai, perdemo-lo, mas a minha mãe continua a me apoiar. Quanto aos meus irmãos, com eles sempre tivemos boa relação e vêm me apoiando desde então, dando-me força e torcendo sempre para as vitórias nas competições importantes”.

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