Política

“Estamos interessados em ver maior investimento privado angolano no Japão e igualmente investimento privado japonês em Angola”

O Presidente da República, João Lourenço, abordou, em entrevista ao The Asahi Shimbun, as áreas preferenciais para o investimento privado no país, tendo aproveitado a presença, no Japão, para convidar todos os interessados, além de ter esclarecido a questão da actuação dos chineses em Angola.

16/03/2023  Última atualização 08H55
© Fotografia por: DR

Eis a entrevista concedida pelo Chefe de Estado angolano ao periódico nipónico, na última terça-feira, um dia depois do Fórum de Negócios Angola – Japão, em Tóquio:

 

Presidente, poderia falar sobre o  principal objectivo da visita oficial ao Japão?

O principal objectivo desta minha visita oficial ao Japão é procurar estreitar, cada vez mais, os laços de amizade e de cooperação existentes entre os nossos dois países - Angola e o Japão. A única vez que cá estive, na condição de Chefe de Estado, foi em 2019, para participar do TICAD.

 

Quais seriam os sectores de cooperação que Angola está a priorizar dentro desses laços de cooperação? Nós, vimos no Fórum de Negócios que se trataram muito os sectores da Economia e Investimento. É assim mesmo?

Sim, sim, confirmo. Portanto, nós estamos interessados em ver maior investimento privado angolano no Japão e, igualmente, investimento privado japonês em Angola. Tem havido, até aqui, algum investimento privado japonês em Angola. Mas gostaríamos de ver numa dimensão bem maior e acreditamos que isso vai acontecer tão logo nós consigamos assinar, e está para breve, o Acordo de Protecção Recíproca de Investimentos. Portanto, gostaría- mos de ver o investimento privado japonês em Angola nos sectores Energético, incluindo Energias Renováveis, no Agro-Negócio, nas Pescas, no Turismo, na Indústria Extractiva, na Indústria Farmacêutica. Em princípio, são estes os domínios em que nós gostaríamos de ver, sem prejuízos dos investidores, eles próprios poderem escolher onde pretendem investir.

 

Como avalia o encontro com o Primeiro-Ministro japonês, Fumio Kishida?

Foi um encontro de trabalho bastante produtivo que acabou por se prolongar, também com esse  carácter de trabalho, durante o jantar que tivemos a honra de participar. Portanto, oferecido pelo Primeiro-Ministro, onde aproveitamos a oportunidade para abordar, não apenas de questões das nossas relações bilaterais, como também em alguns dos assuntos mais quentes da actualidade internacional.

 

E esses assuntos mais quentes incluem, por exemplo, o conflito Ucrânia-Rússia?

Sim, sim. Com certeza. Hoje, falar-se de política internacional sem se falar deste conflito é quase impossível. Portanto, embora tenhamos abordado, também, outras questões de outros pontos do Mundo, mas, sem sombra de dúvidas, a nossa atenção centrou-se no conflito russo-ucraniano que, como todos nós sabemos, prejudica não apenas a Ucrânia e os ucranianos, mas acaba por atingir todo o planeta. É um conflito que criou a maior crise humanitária que se conhece, depois da Segunda Guerra Mundial, uma grande crise alimentar, uma grande crise energética. Portanto, um só conflito criou todas essas crises que o mundo está a viver. Obviamente, quem mais sente são os ucranianos e os europeus.

 

Quais são os impactos que o conflito na Ucrânia estão a causar a Angola?

Bom, sobretudo, do ponto de vista do custo dos alimentos importados. Angola, embora seja produtora de alimentos - mas importa uma boa parte -, principalmente as commodities o trigo e outros cereais que são importados por Angola vêm a preços bem acima daqueles que eram praticados antes do início deste conflito.

 

Por falar da situação de importação de artigos, Angola está a desenvolver uma série de importantes actividades diplomáticas. Por exemplo, recebeu o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, e também o Presidente João Lourenço visitou os EUA. Vemos as actividades muito intensas que Angola está a desenvolver e como vai se posicionar perante essas crises e o conflito na Ucrânia?

A posição de Angola em relação à guerra na Ucrânia...a nossa posição é muito clara: nós condenamos a guerra! Trabalhamos com outros países parceiros internacionais, no sentido de se conseguir rapidamente um cessar-fogo e dar início a negociações para se alcançar uma paz, que seja duradoura, não apenas para a Europa, mas para o resto do mundo. Portanto, que se consiga uma solução que não ameace a paz e a segurança internacional. Esta é a posição de Angola. Quanto ao facto de termos estado com uma diferença de poucos dias, em Washington, DC, e logo a seguir em Luanda termos recebido o ministro Sergey Lavrov, da Rússia, isto só demonstra que Angola está com uma diplomacia bastante dinâmica. Isso é bom, na medida em que nós utilizamos este importante instrumento que os Estados têm, que é a diplomacia, colocando-a ao serviço da construção da paz e da segurança mundial.

 

O senhor está na posição neutra em relação ao conflito Rússia-Ucrânia?

Bom, neutralidade como? O conflito neste momento é entre a Rússia e a Ucrânia... portanto, não entendo a razão de ser da sua pergunta...

 

Gostaria de fazer esta pergunta em relação aos conflitos da Ucrânia e também a situação geral da política internacional...

Bom, com relação à situação geral da política internacional, em princípio, Angola mantém relações com ambos os países que acabou de citar. Nós temos relações com a Rússia, da forma que temos com os Estados Unidos da América. Isso é do domínio público. Na política não vale a regra da exclusão, se você é amigo de alguém tem de ser inimigo do outro. Isto não funciona assim.

 

Outra pergunta: o povo japonês ultimamente está preocupado com a grande presença de chineses no continente africano. Como vê a presença massiva chinesa?

Bom, eu agradecia que me explicasse primeiro as razões da vossa preocupação. Diz que o Japão está muito preocupado com a presença chinesa em África. Tem que me explicar, primeiro, a razão por que estão preocupados, para que eu possa responder com propriedade.

  "Nas relações internacionais deve haver

Os japoneses pensam que, com a presença chinesa, estão a perder o poder de influência para os países africanos...

 Nas relações internacionais deve haver espaço para todos. Eu há bocado dizia isso e repito: a lei da exclusão aqui não funciona. Se alguém está presente não significa dizer que os outros devem ser afastados ou corridos. Não é assim.  Todos são bem-vindos e no mundo globalizado, como o nosso, a concorrência acabará por ditar quem ficará na posição mais forte. Ou na posição mais fraca.  Os grandes investimentos chineses estão na Europa e nos Estados Unidos da América. De forma que nós não entendemos quando se pretende alertar os governantes africanos para terem cuidado com a presença chinesa. Os chineses estão na América em peso, compram empresas na América, compram empresas na Europa. Os americanos e os europeus não têm medo da presença chinesa e alertam-nos para que nós, os africanos, tenhamos medo da presença chinesa. Fica difícil de entender, salvo se estiver com uma explicação mais convincente.

 Como vai ser o engajamento de Angola na política internacional?

 A pergunta não está muito clara, mas nós queremos sempre jogar um papel que seja considerado positivo. E é o que estamos a fazer até à presente data, sobretudo, na nossa região ou nas nossas regiões, uma vez que Angola está inserida em mais do que uma: na região dos Grandes Lagos, na região da África Central. Portanto, queremos jogar um papel que seja positivo para a união dos povos, para o desenvolvimento económico, não apenas do nosso próprio país, mas de uma forma geral de todo o continente africano.

 

A China é um país que já investiu mais em Angola que noutros países do mundo todo. Fez um financiamento maior até ao momento...como Angola vai se relacionar com a China daqui em diante?

Nós temos que ser muito precisos em certos conceitos. Uma coisa é investir, outra coisa é financiar. Financiar é emprestar dinheiro. O que a China fez durante esses últimos anos em Angola foi, sobretudo, atribuir linhas de financiamento ao Governo angolano para a construção ou manutenção de infra-estruturas públicas. Portanto, são dinheiros que constituem a dívida que Angola tem para com a China e Angola já tem vindo a reembolsar ao longo dos últimos anos. Isso é completamente diferente do investimento privado chinês. O investimento privado chinês em Angola é reduzidíssimo. É mínimo. É muito pequeno em comparação com o financiamento que prestaram ao Governo angolano. Como é que vamos nos relacionar com a China daqui para frente? Da mesma forma que o temos feito até aqui e, portanto, procurar manter boas relações de amizade e de cooperação. Mas, sobretudo, procurar honrar com o compromisso que o país tem de pagar a dívida que tem para com a China como fizemos com outros países que também concederam créditos ou financiamentos a Angola. Portanto, se o financiamento é favorável ou não é favorável, uma vez assumido, quem tomou o empréstimo tem o dever e o compromisso de reembolsar nas condições que foram negociadas.

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