Sociedade

Especial/ 1º de Maio: Funcionários públicos estão com muitas dificuldades de sobrevivência

António Cristóvão

Jornalista

A propósito do Dia do Trabalhador, que hoje se comemora, o Jornal de Angola foi conhecer a história de um antigo funcionário público já reformado, que vive com a esposa no Bairro Operário, Distrito Urbano do Sambizanga.

01/05/2021  Última atualização 11H25
© Fotografia por: DR
Antes da Independência, em 11 de Novembro de 1975, trabalhou no Instituto de Crédito de Angola ( banco onde estavam sedeadas todas as contas do Estado e dos Tribunais). Em Setembro de 1977, tornou-se funcionário da Sonangol e passou à reforma em Dezembro de 2009.
Cruz Lima começou a carreira profissional nos Caminhos de Ferro de Moçâmedes (CFM), na antiga cidade de Sá da Bandeira  (actual Lubango, capital da Huíla), em 2 de Fevereiro de 1966, com a categoria de encarregado de apeadeiro. Na altura, Angola era uma província ultramarina de Portugal, considerada a mais rica  das então colónias portuguesas em África.Em 1968, Cruz Lima viu interrompida a trajectória na função pública para integrar as fileiras do exército colonial até 1971, onde atingiu o posto de furriel  miliciano de infantaria (classe de sargentos). Depois do cumprimento do serviço militar obrigatório, foi autorizado a participar de um concurso público para a função de auxiliar no CFM.   
"Nos Caminhos de Ferro, as perguntas do concurso público eram feitas em Moçambique, aparecia um júri de Lisboa, com os papéis todos numerados, e assinávamos no post ticket, que depois era corrigido por uma pessoa desconhecida de todos”, recorda.O antigo presidente do Sporting de Cabinda conta que para a ascensão de categoria profissional participou de um concurso público para praticante de estação. "Como é que vais ficar à frente de uma secretaria, quando não tens noção do que é uma carta, nota ou um ofício? Há muitos trabalhadores que hoje não sabem nada disso. Estão lá a fazer o verbo encher", lembra com um sorriso nos lábios."Os funcionários eram promovidos com base num concurso público, em que só passavam os que sabiam. Actualmente, notámos que muitos que estão na função pública não têm competências mínimas para ocupar determinados lugares”, explicou, preocupado com a falta de qualidade no trabalho prestado pela administração pública.Segundo  Cruz Lima, antigamente era um privilégio ser funcionário público. Além do salário base, os funcionários públicos beneficiavam, ainda, de subsídios de deslocação e de isolamento, quando fossem trabalhar em zonas recônditas no interior.

"O dinheiro nunca chegava para tudo, é claro, mas havia um equilíbrio. O salário era pago na contabilidade e dava para pagar consultas, renda de casa e outras despesas. Tínhamos crédito bancário. Comprávamos tudo a prestações”, realça  o antigo dirigente desportivo.Convidado a comparar as condições dos actuais funcionários públicos com  os do seu tempo, Cruz Lima disse, claramente, que não há comparação possível.    "Os salários actuais são baixíssimos. Aliás, verificámos que os preços dos produtos sobem constantemente e os ordenados continuam estáticos, lá em baixo. Não pode ser. Acho que o Executivo tem de rever esta situação, porque não há acompanhamento com a vida galopante que estamos a ter. Os preços subiram na ordem dos 170 por cento e os vencimentos zero”, sublinhou.

Questionado se consegue sobreviver do salário da pensão de reformado, o  antigo funcionário ferroviário disse que, no seu caso, ainda dá para resistir às intempéries.  "Neste aspecto sou um privilegiado. Vivo da minha pensão do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) e da reforma da Sonangol. Os meus filhos estão formados e a vida continua”, conta descontraído. Cruz Lima mostra-se, no entanto, preocupado com o actual quadro salarial dos  funcionários públicos."Há reformas que foram feitas há 30/40 anos. Não sei quando é que isso será revisto, porque é um atentado à dignidade das pessoas que deram o melhor de si pelo país”, lamentou o também antigo atleta do Clube Atlético de Luanda (CAL).

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