Cultura

Escritor Arnaldo Santos homenageado em Luanda

A forma técnica da escrita de Arnaldo Santos foi destacada, segunda-feira, em Luanda, por João Fernando André, Luís Kandjimbo, Edmira Cariango e Cíntia Gonçalves, durante uma mesa-redonda em homenagem ao escritor, realizada. No auditório Amélia Mingas da Faculdade de Humanidades, em Luanda, em véspera de mais um aniversário.

14/03/2023  Última atualização 08H53
Arnaldo Santos (primeiro a direita) foi distinguido, na capital do país, por ser um dos percursores da literatura angolana © Fotografia por: Luís Damião | Edições Novembro

O evento realizado no âmbito da comemoração de mais um aniversário do escritor, que se assinala hoje, foi uma iniciativa da União dos Escritores Angolanos (UEA) e da Faculdade de Humanidades (FH), de modo a reconhecer os feitos de Arnaldo Santos por intermédio dos seus escritos.

Cíntia Gonçalves realça que no romance "A Casa Velha das Margem”, o homenageado fez menção que nos aniversários das pessoas se costuma celebrar o tempo por mais um ano de vida, mas no caso dos escritores, celebra-se mais do que um ano, devido as suas obras.

A ensaísta destacou que a obra "A Casa Velha das Margens” necessita de uma leitura atenta e cuidada, porque é inesgotável a nível extra e intratextual, acrescentando que as obras de Arnaldo Santos trazem uma escrita clara e se consegue ter uma evolução a nível da língua portuguesa e da língua estético literário.

O livro, disse a ensaísta, pode ser considerado e-book de resistência e manutenção da memória, porque tem várias citações de importantes movimentos de oposição ao colonialismo português e traz ainda referências de acontecimentos e figuras históricas relacionadas ao jornalismo e a literatura na transição do século XIX e XX.

Sobre "Sabina e os Manuscritos do Kuito”, uma obra pouco mencionada nas notas biográficas do autor, editada no ano de 2012, Edmira Cariango disse que nos traz referências de uma comunidade historicamente relevante para reflexão menos recorrente.

A escritora e ensaísta referiu que "Sabina e os Manuscritos do Kuito” tem poucas referências nos dias actuais e trata de uma temática sobre o Cuito, na província do Bié, que aconteceu depois das eleições multipartidárias de 1992. "Depois de se ler uma obra literária é necessário fazer uma pesquisa profunda da obra para compreender melhor a temática e a história que o autor vai nos contar no seu livro”.

"Sabina e os Manuscritos do Cuíto”, acrescentou, é um romance realista e que não seria uma classificação finalista, trazendo outras temáticas ligada à compreensão metafisica da realidade. A história dita na obra faz referência a época de 1993 e 1994 na comunidade do Kuito. "Falando da prosa de Arnaldo Santos apresenta uma técnica interessante e traz um narrador que deixa o leitor imbelicado entre sim e o não da história conduzindo a não ter um posicionamento sem que antes de ler de forma integral".

O membro da União dos Escritores Angolanos (UEA), João André levou como proposta à mesa-redonda "Xico Macaco” e "Na Banza do Mi-randa”, contos que demonstram a "nossa angolanidade e a actualização da angolanidade prossuposta que foram propagadas pelo fundador africano e nacionalista Mário Pinto de Andrade nas palavras de Laranjeira e as ideias de narrativa de espera cuidadas no depuramento de Martinho".

O escritor reforçou que a literatura pretende traduzir as ansiedades de um povo através de um discurso próprio.

Luís Kandjimbo, que apresentou "O Velho Pedro”, disse ser um excelente conto, "lido entenderemos os dramas vivido no período colonial, tinha expressão em texto escrito e imaginário por autores angolanos numa literatura que se circulava naquele tempo, salientou ainda que é um conto belíssimo".

Acrescentou, os leitores devem distinguir a qualidade das obras de Arnaldo Santos, que não são difíceis de ler, mas que tem uma particularidade e as palavras no texto são transformadas dos léxicos das línguas nacionais kimbundo e umbundo e tornando as palavras como sintaxe e semântica da língua portuguesa.

Para a escritora Kanguimbu Ananaz, a homenagem é merecida, por ser um dos percursores da literatura angolana e, enquanto nacionalista, contribuiu na luta anticolonial através da escrita. "É uma boa iniciativa da União dos Escritores e da Faculdade de Humanidades e é importante que os estudantes, quer a nível de licenciatura quer de mestrado, saibam de todos os escritores que deram a sua contribuição através das suas inquietações, dos amores e desamores e os dessabores da vida e debateram-se através da literatura para que se alcançasse a independência do país”.

A escritora defendeu uma forte aposta na abertura de oficinas de letras e reconheceu o trabalho da Brigada Jovem de Literatura que continua a fazer um esforço na realização de várias actividades literárias.

Arnaldo Santos, escritor de vários contos e romances, sentiu-se satisfeito pelo reconhecimento feito e agradeceu à União dos Escritores Angolanos (UEA) e à Faculdade de Humanidades (FH)pelo gesto. "É através da leitura e de vocês mesmo que nós os escritores fazemos alguma coisa para o país, vivemos numa certeza que o país avança, por isso como todos os presentes gostam da literatura, devemos pensar mais além no nosso dia a dia”, disse o escritor.

Nascido em Luanda a 14 de Março de 1935, Arnaldo Santos é essencialmente contista, novelista, poeta e romancista. Membro fundador da União dos Escritores Angolanos.

 

Secretário geral da UEA

Para o secretário-geral da União dos Escritores Angolanos (UEA), David Capelenguela, o homenageado é um homem muito importante para literatura angolana, cujas obras têm sido estudadas dentro e fora do país. "A sua contribuição vem desde muito antes da Independência .O nosso país teve várias formas de combate e uma delas foi através da literatura e Arnaldo Santos com grande rigor introduz elementos de algumas línguas nacionais, nomeadamente o kimbundo e umbundo dentro da escrita como forma de resistência ao colonialismo português”, disse.

David Capelenguela salientou que a classe literária tem vindo a aumentar, assistindo-se de algum tempo para cá ao surgimento de vários jovens que, cada um ao seu estilo, vão fazendo o que podem, para contribuir no desenvolvimento da literatura angolana, que "tem vindo a evoluir, embora precisemos de alguma forma estruturar, organizar e melhor tudo que tem estado fora daquilo que deve ser feito”.

É importante, acrescentou, primar pela qualidade, pois muitos escritores não têm tido em conta este aspecto, são várias as obras, que não têm tido o acabamento esperado e que ao encontrar um leitor com rigor na leitura eventualmente vai desclassificar a obra e estaremos perante a uma regressão.

 

Momento Cultural

A cerimónia de homenagem contou com momento cultural animado pelo poeta Lopito Feijóo que recitou um poema em homenagem a Arnaldo Santos intitulado "Como no tempo dos tambarinos”.

Lopito Feijóo explicou que o poema retrata a viagem de Arnaldo Santos e toda a sua obra até aos dias actuais. "Neste poema retrato as obras do escritor, até aquelas que são desconhecidas, porque nem se quer foram publicadas. Ele é uma verdadeira figura na literatura a nível dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)", afirmou.

Outro momento cultural foi proporcionado pelo Duo Canhoto, formado por Antero Ekuikui e Guilherme Maurício, que levaram o público presente, ontem, no auditório Amélia Mingas, a uma viagem musical.

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