Reportagem

Os cavalos são as "armas" dos defensores da ordem

Augusto Fernandes

Jornalista

Manter a ordem e a tranquilidade pública é uma missão que se pode desempenhar com arte. Neste processo surge a cavalaria da Unidade de Polícia Montada. É um serviço de elite dentro da Polícia Nacional que se distingue dos demais órgãos da corporação, por fazer uso de cavalos.A equipa de reportagem do Jornal de Angola foi ao Comando da Polícia Montada, localizado no distrito do Kilamba Kiaxi, Palanca.

28/02/2012  Última atualização 08H07
João Gomes © Fotografia por: Unidade de polícia a cavalo participou na segurança dos Papas João Paulo II e Bento XVI

Manter a ordem e a tranquilidade pública é uma missão que se pode desempenhar com arte. Neste processo surge a cavalaria da Unidade de Polícia Montada. É um serviço de elite dentro da Polícia Nacional que se distingue dos demais órgãos da corporação, por fazer uso de cavalos.
A equipa de reportagem do Jornal de Angola foi ao Comando da Polícia Montada, localizado no distrito do Kilamba Kiaxi, Palanca. No interior da unidade os efectivos estavam na parada. Para alguns membros da Unidade de Cavalaria e Canina era um dia especial, porque iam ser promovidos ou graduados.
O comandante da unidade, o subcomissário Caly Mendonça, explicou à nossa reportagem como funciona o “binómio” agente-cavalo ou agente-cão.
Em Angola, há muito que a cavalaria passou a fazer parte das acções das forças da ordem. No caso da Unidade de Polícia Montada, órgão do Comando Provincial de Luanda, o objectivo da sua criação foi o patrulhamento das áreas suburbanas e urbanas, policiamento em actos políticos, culturais e locais históricos. Além das escoltas presidenciais e os patrulhamentos fronteiriços.

Trabalho combinado

As operações da unidade de cavalaria são feitas de forma combinada e sem uso de armamento. O comandante da Unidade de Policia Montada, Caly Mendonça, diz que existem técnicas que permitem aos agentes em serviço saber a posição a tomar num determinado momento.
“Nós não falamos. Fazemos sinais e com isto os efectivos tomam as suas posições de contenção”, explicou o subcomissário Caly Mendonça.
Diariamente, a Polícia de Cavalaria sai à rua em acções de proximidade ou de reforço às esquadras: “nós saímos quando há ordens do Comando Provincial de Luanda para missões de apoio que visam manter a ordem”.
Caly Mendonça realça que a unidade de cavalaria tem a vertente de formação para homens e animais. Dentro da cavalaria existem duas acções: o “moço”, que é a manutenção da ordem pública, e o “remoço” que é a reposição da ordem pública.
“O moço é a actividade que a polícia de cavalaria desenvolve em patrulhamento e manutenção da ordem pública, patrulhamentos diários de proximidade com os cidadãos. E o remoço é quando há desordem a cavalaria aparece para repor a ordem”, frisou.

Gostar de animais

Para fazer parte da Unidade de Polícia Montada, o agente deve gostar de animais para permitir a sua rápida socialização com o cavalo. A parte deste factor, considerado primordial, deve ainda ter idades compreendidas entre os 18 e os 25 anos, boa capacidade física e um nível académico considerável.
O subcomissário Caly Mendonça esclarece que a exigência de níveis académicos elevados, deve-se ao facto da responsabilidade que a corporação tem: “nós para além de cumprirmos missões no país, temos sido convidados para o exterior e isto obriga que estejamos preparados técnica e academicamente”.
Os candidatos à unidade de cavalaria fazem um teste de avaliação com um técnico e mediante a sua desenvoltura são admitidos. Uma vez enquadrados, os recrutas aprendem a lidar com os cavalos, a linguagem técnica do animal, a sua morfologia e têm aulas sobre os materiais usados na cavalaria. Aprendem também a limpar o animal antes e depois de montar, como se equilibrar no cavalo e os sinais convencionais utilizado nas missões.
Caly Mendonça disse à nossa reportagem que a formação dos “binómios” é feita por quadros nacionais e estrangeiros: “temos um instrutor português e quatro cubanos. Os outros técnicos são angolanos, o que nos leva a crer que nos próximos quatro anos os nossos quadros estão em condições de assumir ­toda a responsabilidade da escola”, disse Caly Mendonça.

Campeã de saltos

Lado a lado com os homens estão as mulheres e a Unidade de Polícia Montada não foge à regra. Lisdalha Angola Ernesto é a campeã de saltos em cavalo. Faz trabalhos de gabinete na unidade, mas também sai em missões de patrulhamento. “Sempre que somos chamados para alguma emergência e se estiver em serviço, automaticamente a­bandono o posto e vou para a rua”, conta a agente.
Há cinco anos na unidade, Lisdalha é mãe de dois filhos. Monta o cavalo 160, dos 250 cavalos operativos que estão disponíveis na unidade. São animais com nomes e inclusive cartão de identidade.
Cada um tem uma cocheira limpa, alimento, água e assistência médica 24 horas por dia.
Como mandam as regras da unidade de cavalaria, os animais têm o mesmo tratamento dos homens.
O intendente chefe Mário Daniel considera importante que o local em que os cavalos se acomodam esteja sempre limpo e organizado: “é a forma de darmos comodidade aos nossos animais e garantir boa disposição nas fileiras”.
O cavalo, 48 dias após o nascimento e concluído o desmame, tem três anos de preparação até estar disponível para as fileiras. Durante este período, o animal começa a conhecer as técnicas e ganha um dono. Neste período, é o cavaleiro que diariamente cuida dele.
Com uma égua sob o seu cuidado, das duas que lhe foram atribuídas, o comandante Sankara informa que o animal tem dois anos e nunca saiu à rua para missões. Os cavalos devem ter uma identidade. A égua do comandante Sankara tem o nome de “Celeste”.
Mas na unidade as atenções vão para o “Kakongo” e o “Rivaldo”, dois machos de nove anos. São eles os responsáveis por parte da procriação que se faz na unidade. Cada um pesa aproximadamente 500 quilos.
“Alimentam-se de ração industrial à base de milho e soja mas o seu principal prato é o feno e capim seco. Por dia, cada cavalo come quatro quilos de alimento”, explica o comandante Sankara.

Equitação desportiva

Para além de desenvolver equitação de fileira, a Unidade da Polícia Montada pretende evoluir para a equitação desportiva. O comandante Caly Mendonça defende a necessidade da massificação do desporto de equitação.
“Numa primeira fase vamos treinar os membros da corporação e seus filhos. Também abrimos as aulas à população civil, para que num futuro breve possamos ter cavaleiros desportivos ou para mais tarde serem polícias”, disse.
Caly Mendonça afirmou também que, apesar da unidade não ter especialistas em saltos, tem participado em actividades do género, o que lhe possibilitou sagrar-se campeã.
“É um orgulho para a unidade por tudo aquilo que temos demonstrado fora das fileiras e podemos orgulhar-nos cada vez mais”, diz o comandante.

Fins terapêuticos

A prática da equitação tem fins terapêuticos. Os beneficiários são sobretudo pessoas com necessidades especiais afectadas por incapacidade severa, desde a paralisia cerebral ao acidente vascular cerebral, o autismo, perturbações de desenvolvimento, distúrbios emocionais e dificuldade de a­prendizagem. A técnica ainda não existe no país, mas pode ser desenvolvida na unidade de Policia Montada.
De acordo com as explicações do comissário Caly Mendonça, a equitação terapêutica visa a recuperação ou reabilitação motora das pessoas necessitadas. Mas lamenta a falta de médicos especialistas para se desenvolver esta técnica em Angola.
“A reabilitação é possível através do movimento do cavalo, consistindo na utilização sistemática do cavalo no processo de reabilitação de um indivíduo, sob direcção de um especialista em educação ou terapeuta”, frisa.
A unidade de polícia a cavalo participou na segurança dos Papas João Paulo II e Bento XVI, e em inúmeras operações.
De acordo com a sua estrutura orgânica, as unidades de cavalaria estão nas províncias de Benguela e Huíla. Em breve abrem as unidades do Namibe, Lunda-Sul, Malange, Bié e Cunene.

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