Cultura

Crónica de um efusivo 8 de Março no Palanca

Analtino Santos

Jornalista

A ideia da reportagem no Palanca surgiu, há três anos, mas ficou condicionada pelas restrições da pandemia de Covid-19. Este ano, aproveitamos o Dia Internacional da Mulher para trabalhar, curtir e constatar a realidade da comunidade, a começar pela sua alegria de viver apesar das dificuldades.

31/03/2024  Última atualização 10H42
© Fotografia por: Edições Novembro

Germano, o volante, e Raimundo Mbya, o puto dos clicks, aceitaram o desafio e foram "arrastados” para esta aventura em que o Jornal de Angola contou com o apoio do Pascoal Massaka, conhecido técnico de som da Rádio Nacional de Angola, que,  vezes sem contas, nos dá pinceladas para pautas.  

A nossa equipa chegou ao Palanca por volta das 16h00. A rua Olímpio Macuéria, também conhecida por Estrada Nova, foi a nossa primeira escala. Nela testemunhamos o frenesim do feriado, as mulheres que saíam das igrejas e as que começavam a caminhar para os famosos "ambiences”.

Na paragem do candongueiro, algo chamou-nos a atenção: as mulheres vestidas com elegância e os passageiros que subiam por ordem de chegada. Encontramos as destemidas e simpáticas Natália da Silva e Shantal Diwa Matondo, que gentilmente se tornaram para nós as porta-vozes  das mulheres do Palanca.

 

Natália da Silva: "A mulher é uma flor”

"Mulher é uma pessoa especial no mundo, um ser de valor. A mulher é uma flor e sem ela não pode existir o homem. Sem mulher nada pode existir no mundo, por isso o mundo tem que nos dar valor e reconhecer que nós somos especiais. Somos especiais desde o princípio que Deus criou o mundo. Vivo no 11 de Novembro e sou comerciante aqui no Palanca. Antes de estar aqui saí da Igreja, porque para termos vida é graças a Deus e o 8 de Março também é um dia de agradecimento ao Senhor. Lamento que existam mulheres que estão a fazer coisas que não estão certas e o que peço é muita coragem e força, para celebrarmos este e outros dias. Nós somos muitas e podemos contribuir para a mudança”.

 

Shantal Matondo: "Que as mamãs sigam os bons caminhos"

"Eu vivo no Progresso e estou aqui no Palanca porque passei na Igreja. Hoje é o nosso dia e sei que algumas mamãs não sabem, mas olha como as outras estão a celebrar pela forma como vestiram. Vejo mulheres que não vivem no Palanca, tiraram do seu tempo para celebrar e é bonito, isto não é pouca coisa. Agora estou na paragem do táxi e quero agradecer e aconselhar as mamãs para que sigam os bons caminhos, porque a mulher é importante para sociedade”.

 

Rua da Maria

Apeamos pela então "famosa” rua da Maria. Quando lá chegámos descobrimos ser uma das mais famosas do bairro e preferidas para a diversão. Era difícil caminhar por entre as poças de água, mas isto não impedia o frenético movimento de mulheres vestidas a rigor com os panos e roupas africanas.

O pincho, maboque  kikwanga, galetes, makayabu, cabrité e outras iguarias, assim como as bebidas espirituosas convidavam-nos  a pausa na rua para apreciarmos o ambiente. Momentos depois, encontramos a primeira grande "arena”, o Maracaná do Palanca, onde o cenário era de festa grande ao som das novas estrelas do Congo Democrático.             A animação estava a cargo de um DJ que exaltava as mulheres mais vistosas e os homens com posses ou "bosses”, tudo isto a troco de dinheiro. É a famosa "libangá” presente nas músicas populares, quando os cantores citam determinadas personalidades.

A rua da Marria, que vem de Maria, nome de uma das primeiras empreendedoras do Palanca, tem espaços para pessoas de diferentes estratos sociais, bolsos e faixas etárias e que, no dia 8 de Março, tinham algo em comum: a manifestação da elegância e da beleza da mulher, que o demonstravam através de uma altivez positiva.

Na tour pela Marria foram interessantes as conversas com as muassi kitoko (mulheres bonitas) e as       mamãs  leque (mulheres de respeito). O kikongo e o lingala eram as línguas predominantes. Também fomos surpreendidos por senhoras que, aparentemente, não curtiriam normalmente no Palanca mas têm esta zona como de eleição para a diversão.

 
Barrados nas principais arenas

O ambience estava bom e na positividade até que fomos barrados no Barcelona e Real Madrid, outra arena bem concorrida. Nós não fomos os únicos, porque um youtuber que fez uma reportagem semelhante teve o mesmo destino, mas isto não impediu a interacção com as beldades, as verdadeiras "Palancas” que param o Palanca.

No final da tarde decidimos sair da Estrada Nova com destino à zona do Simão Kimbangu e pudemos ver que a festa do feriado só estava a começar. O Palanca é a paragem de cidadãos nacionais e estrangeiros de vários pontos da capital e do país. A expressão "o mambo vai pipocar” é a adequada para descrevermos o cenário com música alta e uma animação convidativa.

"Kota, obrigado pelo momento, no Palanca não tem igual”, saiu-se assim o fotógrafo Raimundo Mbya depois de um cabrité no espaço do Júnior Amorim, a nossa última paragem. A intenção era assistirmos a um momento cultural, mas segundo o anfitrião não é comum as actividades começarem antes das 21h00, o que ficou comprovado com a passagem de Sam Mangwana, que fez uma pequena actuação mais tarde, no final da noite, depois da nossa retirada.

Até o período em que ficamos, aproveitamos o momento para apreciarmos a entrada exuberante das mulheres enquanto o espaço ia ficando composto.

À medida que o sábado, 9 de Março, se aproximava, as nossas forças   chegavam ao fim e assim fizemos a retirada com a promessa de voltarmos noutros momentos. Para os nossos leitores sugerimos vivamente, para 2025, a celebração do 8 de Março no Palanca.

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