Cultura

Colectivo de Artes Ombaka apresenta a peça em Benguela

Arão Martins / Benguela

Jornalista

O Colectivo de Artes Ombaka de Benguela apresentou, no fim-de-semana , no auditório da emissora provincial do Grupo Rádio Nacional de Angola, a peça de teatro “Como um raio de sol”, na presença de espectadores oriundos de vários municípios da província, com destaque para Baía Farta, Lobito, Catumbela e Benguela.

13/09/2023  Última atualização 12H30
© Fotografia por: Arão Martins | Edições Novembro

Durante a estreia da peça houve um casamento perfeito entre a música, poesia e teatro. Pela música, marcou presença Sirimus que interpretou a canção com o título "Benguela”, enquanto a poesia esteve a cargo de Maria Celeste, da cidade do Lobito.

A peça de teatro "Como um raio de sol” foi levada à cena por um trio de novos integrantes do Colectivo de Artes Ombaka, retratando a história de um jovem professor de matemática, que se apaixonou por uma jovem deficiente visual e criada pelo pai, que a protegia a todo custo. A luta é titânica. O desacordo entre o pai e o apaixonado era acesso. A insistência do professor em bater à porta incomodava o pai, que o autorizou a entrar e manifestar as suas reais intenções para com a filha.

Super protector, o pai negava a todo custo as intenções do pretendente. Os choros da filha que mostrava alguma sensibilidade, para com o pretendente, mas negado insistentemente pelo pai, comoveu os presentes, muitos dos quais, derramaram lágrimas. A história termina com a pergunta do professor: "até quando”, respondido pela jovem: "até quando também não sei”.

Lícia Kwomboka, que representou a filha, explicou que com esta peça, o Colectivo de Artes Ombaka, particularmente o trio que estava em palco, quis mostrar o preconceito que ainda paira no seio da sociedade e que ainda persiste em determinadas famílias, quanto o assunto é sobre uma deficiência, quer seja jovem, criança ou adulto.

"Com a exibição da peça apelamos que é preciso ser mais aberto e que o deficiente não é imune a paixões. É preciso dar mais abertura aos jovens apaixonados e a viverem os seus grandes amores”, disse Lícia Kwomboka, lamentando o facto de "infelizmente, a peça ficou no até quando, porque a filha de 24 anos, tem de convencer o pai a mostrar que ela também pode, por ser uma menina já madura e pronta para amar”.

O colectivo de artes integra um vasto número de membros, porém a peça foi apresentada apenas por um trio, tendo a actriz justificado que a história exigia poucas figuras.

Superar as adversidades

A actriz Lícia Kwomboka defendeu que os deficientes devem superar todas as adversidades, por forma a conquistarem o seu lugar na sociedade. "Já estamos numa sociedade onde devemos encarar as coisas com normalidade. Devemos ensinar aquilo que queremos ver. O resto a vida ensina, porque a sociedade é uma escola”, disse.

Felisberto Baptista, um dos personagens principais que desempenhou o papel de pai, disse que qualquer progenitor espera ver a sua filha feliz, ainda mais na condição de deficiente visual.

"Como todo pai protector quis afastar a filha de péssimas intenções, embora sem conhecer os objectivos do jovem que estava a ser impedido de se aproximar  da filha”, explicou Felisberto Baptista, acrescentando que a intenção da peça é de quebrar tabus que ainda possam existir.

Toda pessoa deve ser feliz, defendeu, não importa a cor, raça ou condição física. "Qualquer um é livre de se apaixonar e viver uma grande paixão, desde que haja sinceridade, responsabilidade e realidade”, afirmou o actor, tendo frisado que a intenção ficou no "até quando” por ser um amor impossível. "Infelizmente, não ficam juntos. A intenção fica apenas nos pensamentos”, aclarou.

O outro integrante do trio do Colectivo Artes de Ombaka que levou à cena a peça é Mileto Chiambo. O actor começou a fazer teatro na igreja e escola, tendo enveredado para o teatro convencional em 2021.

Mileto Chiambo disse que da peça pode se depreender o amor, na medida em que traz vários elementos que abordam tal realidade.

O actor reconheceu que muitas vezes o sentimento de amor que resulta de uma paixão não é correspondido por vários factores. No caso, referiu, é uma história comum, onde qualquer menina que tem uma deficiência,  o pai, com quem, vive, protege-a de tudo.

Uma história comum

Mileto Chiambo  afirmou existirem histórias comuns que surgem, mas infelizmente a família (pai) é a grande dificuldade para alcançar o amor à primeira vista.

Pelo amor, salientou, na verdade existe sempre barreira. "Nós é que temos que ter a capacidade de ultrapassar tais barreiras, porque o amor não é uma coisa que aparece com facilidade”, disse.

O actor disse que existem barreiras que podem ser a família ou a sociedade. "Temos que ter a capacidade de romper tais adversidades que a sociedade ou família e outras pessoas criam”, defendeu, considerando "Como um raio de sol” uma peça linda de se ver.

Peça resultante de textos de livros

O director do colectivo de Artes Ombaka, Esteves Domingos Quina "Dr. Steve”, disse que o espectáculo "Como um raio de sol” é baseada num texto do "Outros horizontes”, da 10ª classe. Dr. Steve explicou que é um livro que o currículo angolano usava, diferente dos actuais que estão a ser melhorados em função dos programas.

"Pegamos naquele livro e olhamos nos textos dramáticos e vimos essa história que retrata a estória de um homem, por sinal professor de matemática, triste que se apaixonou por uma mulher cega que só vivia com o pai, mas que o progenitor não queria o pretendente.

Inicialmente, explicou, em função do texto pequeno era impossível criar uma peça convencional, tendo acrescentado que se procurou fazer uma adaptação com textos poéticos que fossem ao encontro com a história.

Dr. Steve referiu que se pegou na obra de Luís de Camões, Manuel Bandeira, Paula Russa (escritora benguelense) e fez-se a junção e o casamento foi perfeito.

Pessoalmente, esclareceu, fez se a outra adaptação ao introduzir outros textos de sua autoria, para dar mais vida à peça. Esclareceu que para que a peça tivesse perfeição trabalhou-se na selecção dos actores, principalmente, de novos integrantes para apresentarem o espectáculo de teatro.

"Os actores tinham de ter perfis e características dos personagens. Foi o que a gente fez e achamos nós uma peça não com muito conflito ou barulho, mas sim que leva o público a reflectir e a mudar de comportamento que tende a discriminar qualquer deficiente”.

É um texto dramático com muita boa mensagem, reconheceu, uma delas é saber como é que as famílias agem e reagem diante de uma deficiência física, sobretudo a cegueira.

"Nem tudo que a gente quer, tal realidade é completa. Há romances frustrados, há realidades em que alguém se apaixona, mas, os pais não deixam, conforme várias histórias. Não vamos chamar, propriamente, de um drama, mas sim, tratar da peça de um texto trágico porque o final é infeliz, já que o homem triste queria, mas havia barreira do pai que não queria”, contou.

A peça, referiu, foi apresentada por um trio novo. O responsável do grupo explicou que a ideia é trabalhar com esses novos actores, tendo explicado que há outros três novos actores a trabalharem no mesmo texto.

"A peça não é nova. Já tem 17 anos, porque já foi estreada em 2006. Ela foi estreada no Cinema Monumental, em Benguela, e já passou em vários festivais, como no Fest-Africa do Huambo e no Festival Internacional de Teatro do Cazenga”.

A peça valeu a Dr. Steve a distinção de Melhor Actor do Festival Internacional de Teatro do Cazenga e já foi um dos melhores espectáculos vindos das outras províncias, para além de Luanda.

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