Opinião

Cobras e belzebus

Luciano Rocha

Jornalista

O Mundo, como soe dizer-se, “anda às avessas”, pois uma maioria crescente de nós, os que o habitamos, por inconsciência, ignorância ou egoísmo, faz por isso, alguns deles em discursos da boca para fora.

16/03/2023  Última atualização 06H45

As palavras, sabe-se, com frequência, são "levadas pelo vento”, propagam-se, mormente nestes tempos modernos, onde, cada vez mais, andam de braço dado com retrocessos que de indesejáveis há poucas décadas passaram a acções correntes.

As novas tecnologias de comunicação tornaram-se nos maiores e mais rápidos veículos de propagação dos desvarios, em catadupa, de exércitos disparadores de palavras ocas "levadas por ventos”. Mas, sejamos justos, não são as únicas culpadas. Há outras formas de os propagar, inclusivamente em meios menos actualizados com o progresso. Nestes casos chegam a ter reflexos perniciosos maiores, pois o desconhecimento está frequentemente ligado à ingenuidade. Um discurso vazio de conteúdo feito por palavras desconhecidas de quem ouve pode impressionar e levar à criação de falsos sonhos tornados, a prazo, pesadelos.

Logros daqueles são atribuídos por várias sabedorias expressas em diversas  línguas, o que comprova que ignorâncias e superstições há muitas e hão-de continuar a existir, de uma ponta a outra do Globo. Pelo menos, enquanto houver um vigarista disposto a ludibriar alguém sedento de ouvir "notícias boas” de lhe abrir horizontes nunca imaginados.  Há quem diga que foi com base naquela crença que surgiram os "vendedores de banha da cobra” capazes de curar males do corpo e da alma a troco de um frasquinho com viscoso liquido extraído da desgraçada da serpente de "costas largas” sobre as quais recaem tantas culpas alheias.

Relatos sobre os primórdios do Mundo apontam-na como enviada espacial do demo à Terra para acabar com o paraíso que foi. Até esse dia era espaço aberto a todos sem excepção. O clima, sempre temperado pelas cascatas e riachos de "alegres serpentear, sombras frondosas de toda a espécie de árvores carregadas de frutos de mil de cores e tons desiguais. Era só preciso abaná-las, sem grande esforço, que eles caíam. Havia um senão: no fruto da macieira  ninguém podia tocar. Invejoso, o diabo - demónio, belzebus, mafarrico, demo, entre outros nomes que lhe deram -, a viver entre brasas incandescentes e constantes, entendeu acabar com a boa vida dos terrenos.

O que fez o mafarrico? Chamou a serpente, bicho rastejante,  e mandou-a "lá acima” desafiar a esbelta Eva, levando-a tentar o pacato Adão a comer o fruto proibido. Ela caiu na armadilha. Como diz a canção do nosso cancioneiro popular "comeram a fruta, caroço dela ficou no chão”...

O que prometeram à Eva ficou no segredo dos demónios. A única coisa certa é que acabaram com o paraíso terreno do qual podíamos todos usufruir. Em vez disso, temos o inferno em que se transformou a vida da maioria dos habitantes deste planeta em brasas. Com cada vez mais inocentes a pagarem pelo caos que não quiseram, mas no qual são obrigados a viver.

Os novos diabos - demónios, belzebus,  mafarricos, demos, chamem-lhes os nomes que quiserem - continuam a multiplicar-se nos vários géneros que compõem a humanidade, travestidos em tudo o que a imaginação permite. Enganam todos os que vêem como Eva e Adão, servem-se de todas as cobras e demais animais rastejantes que abundam o Universo. Cucos, raposas e hienas também lhes dão jeito e nem se dão ao trabalho de os procurar. São eles que lhes vêm bater à porta.

O mafarrico ao pé deles é "menino de coro”. Eva e Adão são inocentes anjos comparados com aqueles de quem  se servem para atingirem os hediondos crimes que lhes enchem cofres e paraísos fiscais.

 Sonhar é próprio do ser humano e mal de quem o não faça, mas há limites que a honra não permite serem ultrapassados. Cuidado com os novos cantos... das cobras.          

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