Economia

Angola pode pagar dívida sem financiamento externo até 2027

A consultora Oxford Economics considerou, segunda-feira, que a manutenção do ‘rating’ de Angola pela agência de notação financeira Standard & Poor’s sublinha a capacidade de Angola servir a dívida até 2027 sem financiamento externo.

05/03/2024  Última atualização 08H20
Aposta na diversificação económica visa reduzir importações © Fotografia por: DR

"Os comentários dos peritos da S&P sobre o facto de o governo estar activamente a gerir os pagamentos de dívida nos próximos anos mostra que pensam que o país tem recursos suficientes para pagar as elevadas prestações e maturidades nos próximos três anos, desde que não existam choques adversos”, lê-se num comentário à manutenção do ‘rating’ de Angola no nível B-.

No comentário enviado aos clientes, citado pela Lusa, ontem, o departamento africano desta consultora britânica escreve que "a S&P diz que baixaria o ‘rating’ de Angola se um choque externo, como uma descida acentuada do preço global do petróleo ou outra quebra da taxa de câmbio, ou problemas internos limitassem a capacidade do governo para pagar o serviço da sua dívida comercial externa”.

O documento aponta, também, que o país poderia "melhorar a classificação de crédito se as reformas económicas sustentarem uma recuperação económica de base ampla, juntamente com uma redução melhor do que a esperada dos custos do serviço da dívida e maiores reservas de moeda estrangeira”.

Para os analistas da Oxford Economics, "há suficientes desenvolvimentos positivos para sugerir que a produção petrolífera vai conseguir uma recuperação ligeira em 2024, num contexto em que o robusto crescimento do sector não petrolífero deve ser mantido”, o que, concluem, torna provável que Angola consiga servir a sua dívida sem ter de recorrer a financiamento externo adicional.

Na análise que acompanha o anúncio da manutenção do ‘rating’, a 19 de Fevereiro, a S&P diz que "apesar das vulnerabilidades continuarem prementes, a dívida do Governo vai descer de quase 90 por cento, no ano passado, para 76 no final de 2027, devido à consolidação orçamental e ao facto de o aumento da inflação resultar num crescimento do PIB que ultrapassa a acumulação de dívida”.

Sobre esta notícia, o Jornal de Angola ouviu quatro economistas: José Quindai, Wilson Chimoco, Daniel Sapateiro e Augusto Fernandes. Cada um traz a sua visão sobre os factos.

José Quindai Economista: "Essa previsão é fundamental...”

A dívida pública tem tido uma atenção relevante por parte do Governo angolano, através da política orçamental no âmbito das despesas públicas, isto é, pelo menos 57,8% do total será alocado ao serviço da dívida pública. As agências de Rating desempenham um papel importante por se dedicarem ao quesito avaliação e classificação de títulos e outros activos financeiros, em função do risco, ela apresenta indicadores positivos, o que aponta a capacidade de solver a dívida até ao ano de 2027. 

Essa previsão é fundamental, devido às luzes de melhoria da nossa economia no médio e longo prazo, por sua vez, a redução da dívida poderá devolver a pujança económica outrora verificada em tempos do "boom” económico. Uma nota ao Executivo, é importante reduzirmos o rácio Dívida Pública/PIB, porém as situações pontuais de curto prazo devem estar salvaguardadas. No seio dos economistas, entendemos que a redução da dívida vai significar produzirmos para satisfazer as nossas necessidades e não dos financiadores, o que acaba influenciando a oferta de bens e serviços, estimulando outros sectores, inclusive o sector não petrolífero, influenciando os preços e melhorando o ambiente de negócios.

Acredito que a descoberta de poços novos de petróleo, também está na base e um outro ponto bastante significativo é a retirada de Angola da OPEP, que está a demonstrar as vantagens e de bom grado que estejamos diante deste acontecimento, sempre fui apologista porque perspectivei estas melhorias.

Portanto, esta gestão, podemos encará-la como positiva, mas o governo não pode deixar de lado as questões estruturais, de modo a não observar choques adversos.

Wilson Chimoco Economista "Exportações petrolíferas não têm capacidade...

É pouco provável! O Estado angolano não consegue gerir o serviço da dívida externa sem contratar dívida externa adicional. Hoje, as exportações petrolíferas não têm capacidade para suportar o peso do serviço da dívida pública externa e, ao mesmo tempo, financiar as necessidades do Tesouro em Moeda Nacional. Para se ter uma ideia, entre 2024 e 2027, o país deverá pagar cerca de 36,17 mil milhões de dólares em serviço da dívida externa (Amortização + Juros). E, neste mesmo período, as receitas fiscais petrolíferas deverão ascender aos 35,66 mil milhões de dólares. Ora, no mínimo estamos a dizer que o Estado vai colocar todas as receitas fiscais petrolíferas para pagar dívida externa. E, mesmo com essa hipótese, o Estado vai precisar, anualmente, de um financiamento líquido adicional em moeda estrangeira de 500 milhões de dólares. O cenário torna-se mais desafiante, quando se analisa a dimensão das receitas fiscais não petrolíferas que ainda não são suficientes, sequer, para pagar as despesas correntes do Estado – Salários, subsídios e manutenção do aparelho do Estado – e o serviço da dívida interna, sendo que o Tesouro Nacional, recorrentemente, tem de se desfazer das receitas em dólar para pagar despesas em kwanzas. Assim, apenas um programa de austeridade profunda nas despesas públicas não financeiras em kwanzas, poderá dar suporte às previsões dos analistas da Oxford Economics, o que, pelo actual contexto, não consigo ver da parte do Executivo disponibilidade para tal.

Daniel Sapateiro Economista: "Rácio da dívida pública sobre o PIB...”

Temos dez anos no máximo para manter a dívida pública abaixo do limite que, quase, é universalmente aceite como um patamar sustentável, entre o valor em dívida e a riqueza criada, medida em Produto Interno Bruto, que é 60 por cento do PIB.

A dívida em 2023 foi mensurada de 49 644 mil milhões de dólares norte-americanos (USD), sendo que a China tinha um stock credor de 17 921 mil milhões de USD, Reino Unido 13 513 mil milhões, Organizações Internacionais: bancos internacionais, entidades multilaterais e outros (pode considerar-se como "Resto do Mundo") no montante de 5 236 mil milhões, Estados Unidos da América com 4 066 mil milhões, Israel com 2 490 mil milhões.

O rácio da Dívida Pública sobre o PIB tem tido e manterá as devidas oscilações por conta que somos um país mono-exportador: 95 por cento das exportações, 60 por cento da receita fiscal, e o grande importador de máquinas e equipamentos para a indústria petrolífera. O preço do petróleo e as quantidades vendidas é que ditarão a capacidade de honrar com mais ou pequena dificuldade o serviço da dívida. No momento, a dívida com a China tem um custo médio de 11 por cento (com garantia de petróleo), enquanto com o FMI é de 3,5 por cento. Nos próximos 10 anos, teremos pago 50 a 60 por cento da dívida contratada e nessa altura teremos uma saturação do mercado com petróleo, pois as economias avançadas já estarão numa fase

pré-maturidade de transição energética e os preços do petróleo tenderão a baixar (drasticamente) pelo excesso de oferta. Mas, actualmente temos um serviço da Dívida com 59 por cento, sendo que 30 por cento da receita é para liquidar juros. A nota da consultora Oxford Economics faz menção de que Angola não necessitará de contrair um financiamento externo para fazer a rolagem da Dívida, mas na prática, o Estado tem feito este exercício quando é sustentável ao nível dos juros e das garantias solicitadas.

Augusto Fernandes Economista: "A dívida pública é a maior rubrica de despesas do país nos últimos seis anos”

Um factor fundamental para a estabilidade financeira e uma política fiscal sustentável prende-se com a capacidade de o governo gerir bem a sua Dívida Pública. Em Angola, nos últimos 10 anos, com maior incidência nos últimos seis anos, a despesa com a Dívida Pública é a maior rubrica de despesas do país. Suscitando deste modo, um elevado risco para a balança de pagamento nacional e com o potencial para pôr em causa os objectivos do Plano de Desenvolvimento Nacional. Face a estes riscos, impõe-se a necessidade da Unidade de Gestão da Dívida Pública, desenvolver a capacidade de traçar políticas e estratégias destinadas a equilibrar apropriadamente os custos, os riscos e executar operações de rolagem da Dívida Pública de forma eficiente.

Angola precisa de infra-estruturas produtivas e reprodutivas que gerem externalidades positivas para a economia. As variações positivas do Stock da Dívida Pública devem servir para financiar a construção das referidas infra-estruturas. Para o efeito, é preciso criar um sistema de triagem de Investimento Público, baseado em dois vectores: primeiro, a taxa de rentabilidade da infra-estrutura deve ser superior à Taxa de Juros da Dívida Pública; segundo, devem ser seleccionadas pessoas honestas para gerir o processo da triagem.

Tal como sempre recomenda aos leitores, o também mentor da Academia PoupaInvest, "Faça Poupança e Investimento” ...

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