Sociedade

Angélica Suzana dos Santos: “Aconselho as mulheres a fazerem cursos técnicos”

Rui Ramos

Jornalista

Angélica Suzana dos Santos nasceu em 24 de Maio de 1998, no Cazenga, província de Luanda. É filha de Erick Lumbu Mbala dos Santos e de Madalena dos Santos e vive na Mabor, desde o nascimento.

26/03/2023  Última atualização 09H30
© Fotografia por: Raimundo Mbiya | Edições Novembro

"Sou uma jovem cristã e dedicada em espalhar as boas novas do Reino”, começa por dizer, com ênfase.

Angélica Suzana dos Santos estudou, no Colégio Ando, o ensino primário até à 9ª Classe. "Era uma escola com muito rigor e exigência, ajudou-me bastante a obter conhecimentos e a estudar no Makarenko (IMIL)”. Apesar de ter o sonho de cursar Construção Civil, teve o nome no curso de Mecânica e não estudou todo o primeiro trimestre. Mas depois convenceu-se de que ousaria fazer algo diferente, Máquinas e Motores. Foi boa em desenho técnico, notável nas disciplinas de EVP e Educação Laboral e via-se inspirada na Construção Civil para Projectistas.

"Tive várias dificuldades, uma delas foi a discriminação por parte dos colegas, diziam que eu teria de fazer o curso de Informática ou um mais leve e que não conseguiria e tão-logo desistiria, isto deixava-me ainda mais triste. Será que eu vou conseguir avançar neste curso? Mas, finalmente consegui", diz, para continuar: "O que me motivou a prosseguir foi que no nosso país existem mais mulheres nos cursos administrativos, eu sempre quis fazer algo diferente e continuei no curso".

Houve dificuldades financeiras, principalmente na época da chuva. Ela tinha de sair de casa até ao Imbondeiro a pé, se a chuva a encontrasse na escola, tinha de andar do Makarenko até à Cuca; apanhava Mabor-Imbondeiro e de lá para casa também a pé. E vice-versa. Às vezes as aulas eram alternadas, em turnos, manhã e tarde, e mais uma vez pensou em desistir.

"Muitas vezes passava mal, com a fome. Numa das aulas de prática de mecânica, na oficina, cheguei a desmaiar por causa do cheiro da gasolina. Até o professor pensou que eu estivesse grávida, daí ter questionado se eu podia permanecer no curso. Disse-lhe que iria conseguir".

Angélica Suzana dos Santos teve a certeza de que devia terminar o ensino médio, mas, como não teria condições para ingressar na Universidade, poderia trabalhar e fazer um curso Técnico-Profissional, no Cinfotec, ao terminar o Makarenko.

"Na altura tinha 17 anos, o que mais me motivou foi a curiosidade das empresas em saber quem era esta menina”.

A família sempre apoiou incondicionalmente Angélica Suzana dos Santos que manteve o "glamour” apesar de ser mecânica. Já passou pelas oficinas do Senhor Mecânico, 1 ano e 6 meses fazendo mecânica multimarca, revisões de Audi Hyundai, Kia e outras marcas. Passou pela Cevorman, empresa alemã durante 6 meses (2019).

Depois passou pela Robert Hudson de Talatona e hoje sonha ter uma oficina própria. "Gostaria de motivar outras mulheres que queiram fazer cursos técnicos, o nosso país precisa dessas mulheres, dinâmicas e com determinação e força de vontade para desfazer os preconceitos e estigmas estabelecidos na sociedade. Pediu mais aposta nos desafios e olhar-se menos nas dificuldades, que são passageiras, e o sucesso virá depois".

Angélica Suzana dos Santos diz sentir-se realizada quanto à formação como mecânica. "Faltam alguns projectos para alcançar, mas pretendo ser Directora Técnica de uma empresa virada para a mecânica e gostava de ver outras mulheres abraçarem também a mecânica”.

Os péssimos momentos na fase da formação e emprego, reconhece, foram a distância e as lutas nas paragens de táxis. "As pessoas perguntavam como é que uma mecânica não tinha carro, tinha de ter pelo menos um i10. Foram os momentos mais tristes da carreira”.

O momento mais marcante, recorda, "foi a presença do deputado Raul Danda (em memória) na oficina, ele olhou para mim e ficou admirado: -Esta menina é mecânica? Ninguém mexe no meu carro, é ela quem mexe”.

"Fiquei estupefacta por mexer no BMW de uma personalidade angolana e daí peguei e fiz a revisão”, diz. Neste momento, prossegue, não adiaria os planos futuros para abraçar um novo emprego numa oficina. "Apenas estaria aberta para ingressar em gestão de oficinas ou dar aulas em Centros Profissionais, como do MAPTSS, na área da mecânica, como forma de motivar mais mulheres”.

E conclui: "Amo ser mecânica, amo ser diferente. As pessoas dizem sempre ela quer ser o centro das atenções, mas não é assim. Pois o trabalho por si já torna a pessoa admirável, devem-me olhar como um diamante entre pedras”.

As três palavras positivas da trajectória de Angélica Suzana dos Santos, sintetiza, foram: "Humildade, dinâmica e autodomínio”.

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