Opinião

A misteriosa força do poder

Manuel Rui

Escritor

Está escondido por quem escreve a história. Os europeus é que escreveram a história de África porque África lhes pertencia. Omitiram o seu contributo civilizacional para o desenvolvimento da humanidade.

20/05/2021  Última atualização 08H59
 Durante muitos e muitos anos, mitos e preconceitos decidiram esconder ao mundo a verdade histórica sobre África, fundamentavam isto por as sociedades africanas não apresentarem dados escritos não era uma parte da história do mundo. Vejam só, Hegel, em 1830, afirmava que a África não era parte da história do mundo, o Ocidente era o pensamento, a África, os índios e descendentes de escravos das Américas eram o objecto.

Após a 2ª guerra mundial começam a aparecer pensadores africanos e sul-americanos que intentam desmontar a conceitualidade. O colonialismo havia sido o período histórico derivado das navegações, invasões e esclavagismo. O domínio das chamadas metrópoles sobre as colónias dogmatizando-se a superioridade dos povos colonizadores, tudo resultando na acumulação de capital dos países europeus. É isso que vai marcar a chamada "modernidade” , novas invenções, avanço social, económico, cultural, científico, tecnológico, etc. No entanto, há o outro lado da moeda. Segundo Dussel, 2000, a modernidade é um conceito eurocêntrico e envolve várias formas de desigualdade.

A Europa passou a referência mundial de Estado Moderno, de civilização e desenvolvimento o que acabou numa lógica de sistema de poder alicerçado no capitalismo para introduzir a globalização que dividiu o mundo em centro e periferia ou terceiro mundo ou subdesenvolvido. Eu sou o objeto. Ele é a pessoa, o saber, o poder, a dominação.
E surge a colonialidade, (Ballestrin, 2013) que consiste na forma dominante do controlo de recursos, trabalho, capital e conhecimentos limitados a uma relação de poder articulado pelo mercado capitalista. A colonialidade é a continuidade da propagação do pensamento colonial, sendo uma matriz que se expressa em dominação do poder, saber e ser.
Quijano (2005): "A ideia de Colonialidade do Poder está directamente relacionada à globalização. Este fenómeno emergiu, essencialmente, do processo de constituição da América e da propagação do capitalismo eurocentrado, tendo como padrão de poder a classificação por raça. Isto porque na América Latina, a ideia de raça foi uma forma de legitimar as relações de dominação europeia, visto que o padrão do homem europeu era tido como superior e dotado de uma estrutura biológico/natural diferenciada”ou, (Carvalho, 2001)”consiste na identificação dos povos conforme certos fenótipos estabelecidos e impostos pelo pensamento Ocidental.”

Em 2014 há este pensamento de Lugones, "A colonialidade do poder é a base do pensamento colonial, sendo essa o pilar central tanto da colonialidade do saber como da colonalidade do ser.
A colonialidade do Saber (Lander, 2005) se expressa pela negação ou invisibilidade do conhecimento produzido pelos países marginalizados.

Segundo Maldonato-Torres, 2017) a colonialidade do Ser aponta para "a experiência vivida da colonização e o seu impacto na linguagem.” Assim ocorre a desumanização, a perda da existência. Recordo aqui a obra do sábio português Boaventura de Sousa Santos em sua recolha "Epistemologias do Sul”, obra que já foi lançada em Angola com apresentação minha. Aí trata-se do mundo dividido entre os que são e sabem e os que não são e não sabem. Há uma linha abissal a dividir-nos e nossas epistemologias, nossos conhecimentos não existem. É o epistemícidio. Daí a proposta de uma ecoligização epistemológica para trocarmos ideias sem superiores nem inferiores. Que eu saiba, esta obra não é estudada em nossas universidades, quiçá nem se conhece.
Hoje, cientistas deste lado, já fazem propostas para a descolonialidade para a desconstrução de padrões, conceitos e crítica directa à modernidade e ao capitalismo.

Tudo o que escrevi e citei pressupõe qualquer coisa aparentemente invisível mas que ao longo da existência humana definiu guerra matou e encarcerou ou escravizou milhares de pessoas: o poder. Poder é mandar. Para mandar é preciso receber o poder por "direito divino (Maquiavel), do Príncipe  e da fórmula "os fins justificam os meios,”se assim for necessário, legitimando a astúcia e a crueldade. Só há uma realidade: a do Estado; b) só há um facto: o Poder, c) só há um problema: o da conquista e conservação do poder. Ainda, Boétie com a "servidão voluntária” tentando revelar as fontes humanas do poder, situando-se do ponto de vista do povo, não do chefe. Reivindica o direito de se revoltar contra a tirania, etc., e os filósofos dos séculos XVII e XVIII vão chegar ao estado de natureza e c-social…

Na África pré-colonial, o matriarcado era um valor cultural e rainhas como Cleópatra, Rainha de Sabá ou Nzinga Mbandi, circulam no nosso orgulho como mulheres poderosas que o outro se rendeu a colocá-las na história universal, não obstante, o cinema pintou Cleópatra de pele rosada (como caucasiana que não há gente branca folha de A quatro ou cor de neve). O matriarcado em África, segundo Diop consiste na " colaboração e desenvolvimento pleno e harmonioso entre os dois sexos apresentando uma certa preponderância da mulher na sociedade, que de todas as maneiras, é aceitada e inclusive defendida pelos homens. O matriarcado não seria uma imposição das mulheres sobre os homens e sim um harmonioso dualismo.” E acrescenta: "A África, como representante do matriarcado do Sul, valorizava a família matriarcal, estado territorial, a emancipação das mulheres na vida doméstica, o ideal da paz e justiça, divindade e optimismo, em que a ética moral era baseada no colectivismo social.

Se eu perguntar a um homem do povo que descobre nos contentores a comida que outros deitaram fora ele vai-me falar que poder é força e dinheiro se falar com um caloiro de direito vai-me falar que a constituição garante os direitos fundamentais e nem me fala do genocídio na Palestina, é só os acontecimentos da vitória do Sporting em Portugal que as televisões já falam vai para uma semana. Se for ao mato, onde tem leão vão dizer que poder é força e lombongo. É verdade é força e dinheiro essa misteriosa abstração. Porque isto é uma crónica literária acabo com esta, um servidor de um padrinho da máfia infiltrado no poder, veio confidenciar que iam pôr cartazes nas paredes gratificando com cem mil dólares quem entregasse vivo ou morto o capo de la máfia. O padrinho recostou-se na cadeira e  falou que pusessem um anúncio que pagaria um milhão de dólares a quem decepasse a cabeça do governador.
Trouxeram-lhe a cabeça para embalsamar…

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