Opinião

A limpeza de Luanda

Luciano Rocha

Jornalista

O estado progressivo de imundice pública em Luanda é tão grave para a saúde pública que deve merecer a atenção de especialistas de vários sectores, o que não dispensa acções imediatas de limpeza, com meios apropriados.

15/02/2021  Última atualização 10H20
A opinião foi manifestada, sexta-feira, neste mesmo espaço, no qual se alertava, igualmente, para a inconsequência do recurso a "brigadas de voluntários”, por o assunto ser demasiado sério, muito mais do que alguns pensam, para ser encarado com ligeireza do amadorismo.

Na altura em que  escrevíamos, o Governo Provincial não tinha anunciado, para hoje, a "operação de limpeza” com a participação de moradores das várias zonas de Luanda. Infelizmente, concretizou-se o receio de ver anunciadas, em pleno século XXI, iniciativas em voga nos anos de 1970, quando Luanda e os tempos eram outros. Muitos de nós, viveram, então, momentos irrepetíveis das nossa vidas, de fulgor revolucionário soprado por ventos de exemplos internos e externos. Era a liberdade, na autêntica acepção da palavra,  que não tardou a esmorecer esfrangalhada por conceitos, sobre os quais não éramos ouvidos.

Uns quantos faziam-no por todos, com base em modelos decalcados de outras bandas. Ainda não tínhamos Bandeira, nem Hino e já  nos eram impostos organismos e processos, contra os quais se tinham lutado. Tudo, em nome do "bem nacional”. Assim, num ápice, surgiu a polícia política. Um clima de suspeição, vivido no tempo da ocupação, ressurgiu. Com todos a desconfiar de todos. Nos empregos, bairros, bares, em casa. Com prisões por vinganças de toda a ordem, apropriação de bens e tudo o mais que mentes perversas concebem. Mais tarde, os "sábados vermelhos”, com resultados que se sabem.

Luanda era, nos anos de 1970, cidade provinciana, com meia dúzia de habitantes. Os jovens levados pelo fulgor revolucionário agora já não o são. Os sobreviventes trabalham, descansam, finalmente, o corpo de uma vida a "vergar a mola” ou aburguesaram-se, enriqueceram; os jovens de agora têm outros interesses - estudam os que podem, procuram emprego. Quem resta? Os desocupados por opção, as contrabandistas do nosso dinheiro e quem as fornece? Os "militantes disciplinados”, mais os que aparecem sempre para ficar na fotografia? E quantos são precisos para limparem a província de uma ponta a outra? E quando chegarem ao fim voltam ao início, entretanto, já sujo? Que meios vão usar : vassouras, pás e baldes caseiros? E no dia seguinte que rendimento têm nas empresa que lhes pagam os salários?  E os que aceitarem o desafio não são transgressores do recolhimento domiciliário  decretado pelo Presidente da Republica? Ou, afinal, o lixo não é nada amigo da Covid-19, pelo contrário, protege quem se junta a ele?   
A limpeza de Luanda pode ser perigosa.

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